IPCA
0,83 Abr.2024
Topo

Patrimônio histórico-cultural pode movimentar negócios nas pequenas cidades

Primeiras missas brasileiras teriam sido celebradas em Santa Cruz de Cabrália, na Bahia  - Divulgação/Secretaria de Turismo da Bahia
Primeiras missas brasileiras teriam sido celebradas em Santa Cruz de Cabrália, na Bahia Imagem: Divulgação/Secretaria de Turismo da Bahia

Rose Mary Lopes

Colunista do UOL

24/04/2015 06h00

Um dos fatos que mais me marcaram no período em que vivi nos EUA, em Cambridge, no Estado de Massachusetts, foi a valorização que os americanos dão ao seu patrimônio histórico-cultural. Foi realmente uma descoberta saber da existência de museus vivos, como os que existem na cidade de Plymouth: a Plimoth Plantation, Mayflower 2 e Wampanoag Homesite.

Especialmente Plimoth Plantation e Mayflower 2 fazem o visitante se transportar na história. Literalmente.

O Mayflower 2 é uma réplica em tamanho real da embarcação original em que aproximadamente 100 pessoas viajaram para o Novo Mundo, em busca de liberdade religiosa.  Partindo em 1620, da Inglaterra, cruzaram mares revoltos do Atlântico para aportar em Cape Cod, nas costas do Estado de Massachusetts.

Tudo a bordo é como na primeira embarcação, incluindo os Pilgrims (denominação destes primeiros colonizadores). Os passageiros daquela época são representados por pessoas que replicam totalmente como eles eram, suas falas e sotaques. Além das vestimentas, o visitante vê as acomodações, o tipo de comida, mobiliário, ferramentas e os itens que tinham a bordo.

No caso da Plimoth Plantation, pequena vila inglesa que recria a vida comunitária dos pilgrims do século 17, poder ver como viviam, quem eram, o que vestiam, como eram suas pequenas casas, o objetos, móveis e instrumentos daquele tempo. Uma experiência única. Ainda mais que os “moradores” incorporam a vida da época das pessoas reais que ali viveram.

E, se você fizer qualquer pergunta que transcenda aquela época, eles não poderão responder, pois nem sequer conseguem imaginar como seria o mundo décadas depois, quanto mais alguns séculos à frente!

No Brasil, há lugares tão importantes quanto ou com patrimônios históricos que merecem e podem ser melhor explorados. E que atrairiam visitantes, gerando fluxo e possibilidades de receita para os empreendedores e moradores. Por exemplo, Santa Cruz de Cabrália, na Bahia.

As primeiras missas na costa brasileira foram lá celebradas pelo Frei Henrique de Coimbra, que pertencia à armada de nosso “descobridor” (sim, pois há dúvidas se somos realmente descobertos) Pedro Álvares de Cabral.

É fato que os visitantes de Porto Seguro são atraídos a visitá-la, bem como o Centro Histórico, o Ilhéu de Coroa Vermelha, e a entrar em contato com os descendentes dos índios da região. Atualmente, já são feitas representações teatrais e exposições sobre a história do nosso descobrimento. Da chegada e descoberta da terra de Vera Cruz.

Até uma missa é feita para relembrar as duas originais. Mas fico imaginando se não poderíamos fazer mais. Algo que não se restringisse a apenas um feriado, próximo à data do descobrimento. Já pensou se fizéssemos um projeto que procurasse resgatar a chegada dos portugueses aqui? Se tivéssemos alguma réplica das naus e caravelas?

Poderíamos concretizar o que era, de fato, cruzar os mares nas condições em que eles o fizeram. Ver os instrumentos que possuíam, como era o espaço interno, como acondicionavam os alimentos, as condições insalubres. Tudo isso encarnado em pessoas reais representando as da época.

Saindo do cenário do descobrimento, vejamos o caso do Distrito de Santo André: Paranapiacaba. Em 1874 foi inaugurada a Estação do Alto da Serra da São Paulo Railway Company (primeira estrada férrea de São Paulo, que teve como defensor e investidor o Barão de Mauá). Esta ferrovia (inaugurada em 1867) escoou o café produzido pelos paulistas para o Porto de Santos.

A cidade guarda muito da memória desta antiga estrada de ferro. Há muito a ver: desde a estação (que devido a um incêndio com suspeitas de criminoso, em 1981, não é o original do final dos 1800), o relógio britânico que lembra o Big Ben, trens, locomotivas, trilhos, pátios. Além das construções inglesas de casas de moradia dos que lá trabalharam.

A preservação deste patrimônio anda a passos lentos, com diversos órgãos e atores envolvidos. Mas parece que recursos foram recentemente garantidos para preservar mais estas trilhas do nosso passado. E, com isto, acelerar e aumentar o fluxo de visitantes.

O fato é que, com mais foco empreendedor, ousadia e iniciativas podem ser criadas condições de preservação e de melhoria que levem a maior valorização de nosso patrimônio histórico e cultural. E que se tornem chamarizes para visitantes e turistas. Certamente os habitantes destas cidades ganharão mais oportunidades, incluindo a de se orgulhar de suas raízes.