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Reinaldo Polito

Ou você comparece à sua homenagem e segue a cartilha do evento ou nem vai

Getty Images
Imagem: Getty Images

13/06/2017 04h00

Neste dia 13 de junho comemora-se o nascimento de uma das figuras mais importantes da história brasileira, José Bonifácio de Andrada e Silva. O Patriarca da Independência nasceu em Santos, em 1763 e faleceu em 1838, em Niterói. Embora tenha sido orador, ficou marcado também por não falar.

Dificilmente alguém se recusaria a receber uma homenagem. A não ser que, por trás daquele reconhecimento, esteja alguma intenção oculta. Como, por exemplo, ocorre com algumas organizações que se especializaram em premiar empresas ou empresários, mas que, para receber a homenagem, devem pagar as despesas do evento.

Ou como em situações em que instituições querem homenagear algum palestrante. Só que, durante a homenagem, ele faria uma palestra àquela plateia. Ora, trata-se apenas de um artifício de conseguir a palestra sem remuneração.

Afora essas situações que são excepcionais, as homenagens são o reconhecimento pelas realizações e conquistas de uma pessoa. Seria estranho, portanto, se aquele que deveria receber a homenagem não comparecesse ao evento. Por outro lado, se comparecer, precisa se comportar como esperam que se comporte.

Agradecendo a homenagem

Ao agradecer, a pessoa deve falar da sua alegria e emoção ao receber aquela homenagem, pois é esse tipo de sentimento que esperam dele. Em seguida, deve agradecer às palavras da pessoa que o homenageou.

Na sequência agradecer à presença das pessoas àquele momento tão importante em sua vida e assim como ao estímulo e à ajuda daqueles que tanto colaboraram para obter os resultados que conseguiu alcançar.

Associando a atividade a uma causa nobre

Finalmente, deve-se associar a atividade que motivou a homenagem a uma causa nobre. Por exemplo, ter construído um hospital para dar saúde aos que hoje precisam tanto. Ter construído uma escola para dar educação. Ter montado uma empresa para ajudar no desenvolvimento econômico e social.

Vamos imaginar, entretanto, que você não se sinta bem em receber a homenagem por um motivo qualquer. A melhor atitude é não comparecer ao evento. Não há como ser diferente. Ou comparece e segue a cartilha dizendo tudo o que as pessoas esperam. Ou não comparece.

O jogo de cintura de Brasílio Machado

José Bonifácio, a quem se prestam homenagens pelo nascimento neste 13 de junho, protagonizou uma situação desconcertante, que exigiu do orador que o homenageou jogo de cintura e muita habilidade oratória. Talvez esse seja um dos momentos mais extraordinários da oratória brasileira em todos os tempos.

Posso afirmar que ao longo da minha carreira como professor de oratória, pesquisando e experimentando as mais diversas técnicas da comunicação, jamais encontrei um discurso mais representativo que esse de Brasílio Machado homenageando José Bonifácio. Exigiu dele muita presença de espírito, sensibilidade e capacidade de adaptação à circunstância.

Os abolicionistas de São Paulo haviam preparado uma homenagem a José Bonifácio de Andrada e Silva. Brasílio Machado foi o orador convidado para fazer o discurso e falar em nome de todos. Entretanto, depois de tudo acertado ocorreu um fato constrangedor: o homenageado não compareceu ao evento.

As pessoas estavam indignadas com aquela desconsideração e passaram a criticar a ausência. Imagine a situação em que se encontrava o orador, precisando fazer a homenagem, enaltecendo as qualidades do homenageado e, ao mesmo tempo, considerar a revolta que se apossara da plateia.

Brasílio Machado começa falando de como a ausência do homenageado instigava revolta, surpresa e constrangimento, ao mesmo tempo em que procura acalmar os ânimos dos ouvintes dizendo que a reflexão moderava suas palavras. Na sequência vai traçando um perfil da modéstia de José Bonifácio.

Ao final Brasílio Machado afirma que a ausência de José Bonifácio não prejudicava a homenagem que faziam a ele. E, na comparação com a luz, desenvolve um dos exemplos mais extraordinários da oratória:

Senhores:
Se não me fora consentido dominar as revoltas do pesar, que uma circunstância do momento instiga, mas que a reflexão modera, e eu pudesse, numa síntese enérgica, condensar as interrogações que mal se calam na boca de quantos me escutam, sob cada palavra minha eu deveria sentir as palpitações de uma surpresa amarga, e em cada gesto deveria adivinhar o constrangimento.

Por que nos reunimos? Para afirmar...
E o que afirmamos? Uma homenagem. Mas, quem pressuroso acode recebê-la? Ninguém!

Pois que! O iminente cidadão, em cuja honra se organiza esta homenagem, não pode vencer as travadas linhas da solidão e da modéstia em que se isolou, e destarte se esquiva às exclamações que o esperavam. (...)

(...) Não! Senhores, o que afirmamos não é um homem, é um princípio; não é a estátua, é a significação; não é o foco, mas a irradiação; não é a pessoa, mas a propaganda.

Ausente, José Bonifácio se distancia, mas pela elevação: a luz quanto mais sobe, mais se aproxima; a ideia quanto mais domina, mais se eleva. Senti-lo ausente é mais significativo que o saudar de perto. Deixemos, pois, o grande solitário da liberdade: não perturbemos em seu retiro o evangelista dos escravos.

Mesmo sem falar, José Bonifácio, graças à competência oratória de Brasílio Machado, deixou para a história um exemplo incomparável de modéstia e ícone da liberdade.

Superdicas da semana

  • Se comparecer a um evento como homenageado, diga o que as pessoas desejam ouvir.
  • Se julgar que não deve dizer, não compareça.
  • Se o orador exagerou ao falar de suas qualidades, procure amenizar, dizendo que se trata, por exemplo, de palavras de uma pessoa amiga.
  • Ao agradecer a uma homenagem, associe sempre o motivo a uma causa nobre

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas", "As Melhores Decisões não Seguem a Maioria" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva. “Oratória para líderes religiosos”, publicado pela Editora Planeta.

Para outras dicas de comunicação, entre no meu site.
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