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Reinaldo Polito

Por que será que Bolsonaro fala palavrão e bate boca com jornalistas?

Gabriela Biló/Estadão Conteúdo
Imagem: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo

20/08/2019 04h00

"A única coisa que temos de respeitar, porque ela nos une, é a língua" (Franz Kafka)

Há um fenômeno curioso: na falta de uma oposição articulada, alguns bolsonaristas deixaram de criticar os políticos de esquerda e passaram a descer a ripa no próprio Bolsonaro. Não é difícil ouvir o seguinte comentário: "Votei no Bolsonaro, mas não estou gostando nada da forma como ele tem se expressado".

E quando se questiona o que há de errado com a comunicação do presidente, a resposta é direta: usa muito palavrão, faz brincadeiras inconvenientes e vive arrumando encrenca sem necessidade com alguns países, como, por exemplo, a Argentina, a Alemanha, a França e a Noruega.

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Sem contar que, depois de sete meses no governo, ainda não conseguiu descer do palanque. Dia sim, outro também, o presidente encontra um jeito de criticar algum político da oposição, sendo seus alvos prediletos os ex-presidentes Lula, que está "quietinho" lá no seu canto em Curitiba, e Dilma Rousseff, de quem nem mesmo os petistas se lembram mais da existência. Também não fica de fora o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz.

Se o questionamento for: quando você votou nele não sabia que ele era assim? A resposta é quase sempre a mesma: "Ah, uma coisa é falar como candidato, em cima de um palanque, outra, diferente, é se comunicar como presidente, que precisa respeitar a liturgia do cargo".

Bolsonaro não tem nada de bobo. Alguns até o tratam de Bozo, mas não é ingênuo, nem despreparado politicamente.

Temos de lembrar que perambulou por longos 28 anos na Câmara dos Deputados digladiando com os mais ferrenhos e poderosos adversários. Para se manter nesse vespeiro por tanto tempo, algum mérito deve ter tido. E mais: elegeu-se presidente da República, sonho de consumo de quase todo político.

Bolsonaro não pretende mudar

Ao responder a uma pergunta de um jornalista sobre esse seu jeito de falar, Bolsonaro reforçou sua disposição de continuar sendo exatamente como é. O jornalista perguntou: "Quando o senhor faz declarações e, até mesmo, reforça com tom irônico, não acredita que pode polarizar ainda mais o país?"

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De forma veemente, o presidente respondeu: "Você quer que eu seja um vaselina, um politicamente correto? Ou um isentão [que responda] ah, salvo maior juízo? Não, eu dou resposta direta. Fui eleito assim, não vou fugir a minha característica, com todo respeito que eu tenho a todo mundo. Quando eu falei sobre a questão do cocô, foi uma resposta que dei a um jornalista que fez uma pergunta idiota lá em Brasília. O idiota perguntou para mim [sobre preservação ambiental], depois de eu ter explicado que o mundo cresce 70 milhões de habitantes por ano, que o Brasil cresce pouco mais de 2 milhões de habitantes por ano, não dá para plantar na Lua e nem em Marte, assim como não dá pra ensacar vento [ironia contra a ex-presidente Dilma]. Eu respondi o seguinte: é só você cagar menos que a questão ambiental vai ser resolvida. Agora, não é compatível com o presidente? Vote em outro em 2022. Muito simples."

Não há unanimidade sobre seu comportamento

Se, por um lado, cresce o número de pessoas descontentes com essa maneira de Bolsonaro se comunicar, há aqueles também que estão vibrando com essa atitude.

Não são poucos os que dizem que esse é o presidente que escolheram, que ele não se preocupa em fazer média, nem em se esconder atrás de mensagens politicamente corretas, só para agradar quem fica com mimimi.

Na verdade, quem poderia dizer quais serão as consequências desse comportamento? Durante a campanha, também havia especialistas que criticavam o palavreado do candidato Bolsonaro e afirmavam com todas as letras que, agindo assim, ele jamais conseguiria vencer as eleições. Um grande equívoco.

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Conheci profissionais que fizeram extraordinário sucesso nas empresas em que atuaram, mesmo falando palavrões e batendo boca com chefes, pares e subordinados. Cumpriam metas, davam resultados, garantiam o lucro desejado pelos acionistas, e esse desempenho justificava a permanência deles na empresa, ainda que não se comportassem bem.

Talvez hoje, com a consciência mais amadurecida das pessoas, essa conduta seria rechaçada com energia, e esses "bocudos" não teriam êxito. Provavelmente, agora precisariam se enquadrar. Acumulam-se os exemplos de profissionais demitidos em virtude do seu comportamento. Hoje não se tolera mais quem não respeita a diversidade, assedia colegas de trabalho, ofende pares ou maltrata subordinados.

Alguns dizem uma coisa, mas pensam outra

O jeito de ser de Bolsonaro incomoda muita gente. Os seus adversários se valem de sua maneira de se comportar para aumentar o tom das críticas. E, quando debatem com os adeptos do presidente, em determinadas circunstâncias, conseguem até neutralizar os argumentos contrários e fazem prevalecer seu ponto de vista.

Como vimos, o presidente aposta no sucesso de suas atitudes beligerantes. Acredita no mantra, que repete à exaustão, de que assim está sendo verdadeiro e honesto com os eleitores que o elegeram, sem os filtros que agora querem colocar nele.

Julga que, assim, investirá ainda mais na polarização ideológica e que essa posição preservará os votos de que precisa para se reeleger.

Temos de pensar, entretanto, que as urnas traduzem o que as pessoas efetivamente sentem, e não apenas o que elas dizem sentir. Ali, no momento de escolher o candidato que irá representá-las, fala, às vezes, mais a emoção que a razão. Se essa será ou não a história do futuro de Bolsonaro, só o tempo dirá.

Superdicas da semana:

  • Alguns profissionais são contratados pela competência e demitidos pelo comportamento
  • Hoje se exige respeito e consideração com os semelhantes, especialmente no local de trabalho
  • Quem não seguir essa regra poderá comprometer sua carreira
  • Cada um deve agir como julgar melhor e arcar com as consequências de seus atos

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante; "As Melhores Decisões não Seguem a Maioria", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva; e "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.

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