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Reinaldo Polito

Fala de Trump era risco de guerra sem precedente, mas ele soube acalmar tom

08/01/2020 16h27

Diplomacia é fazer e dizer as coisas mais imundas da maneira mais gentil
Sir Henry Wotton

A declaração do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, hoje, sobre os ataques feitos às bases norte-americanas no Iraque, era aguardada com muita apreensão. O teor de suas palavras poderia ser o estopim para conflitos sem precedentes na história mundial. Conhecendo o perfil beligerante de Trump, essa preocupação se justificava. O mundo ficou grudado na transmissão pelas emissoras de televisão e portais da internet.

Trump surpreendeu a maioria. Sua situação era delicada, pois se recuasse, poderia dar demonstração de fraqueza e impotência. Se fosse agressivo, com atitudes raivosas, poderia ser obrigado a abrir os conflitos bélicos com os iranianos, e sabe-se lá quem mais poderia se envolver na contenda. Dentro da melhor política diplomática, o presidente norte-americano agiu de maneira correta.

O presidente americano falou de maneira pausada, tom de voz ameno, quase aveludado e praticamente sem gesticulação. Usou, como sempre, com perfeição o teleprompter. Mesmo nos momentos mais agudos sua fala foi tranquila, sem contundência ou agressividade. Era o comportamento que se exigia de um orador para momento tão delicado.

A atitude diplomática de Trump

Para agradar a gregos e troianos, o presidente republicano se aproveitou daquela que talvez fosse a única brecha em toda a situação. Os ataques contra as bases norte-americanas não tiraram a vida de nenhum americano. Seria até possível supor que não matar cidadãos americanos tenha sido proposital para permitir reação mais amena dos Estados Unidos. Com os dois ataques sem matar norte-americanos, os iranianos deram a impressão de que estavam partindo para a retaliação, porém deixando uma porta aberta para a resposta dos americanos.

Disse Trump: "Nenhum americano foi ameaçado pelos bombardeios na noite passada". Dessa forma, ele sustentava o tom menos agressivo da sua fala.

Era preciso, entretanto, que se manifestasse para não dar a impressão de que os ataques nada significaram. Por isso, em tom mais enérgico, ressaltou logo no início: "O Irã não será autorizado a ter armas nucleares". Tendo dado essa satisfação, estava com o caminho livre para seu discurso mais diplomático.

O Brasil tem ótima história diplomática

O Brasil não precisa ter inveja desse jogo de cintura diplomático de Trump. Ali mesmo, nos Estados Unidos, nosso país já deu demonstrações exemplares de diplomacia, com a atuação de nomes como Joaquim Nabuco, Oswaldo Aranha e Roberto Campos. Nabuco, por exemplo, além de culto, inteligente e excelente negociador, foi também orador extraordinário, provavelmente o melhor orador brasileiro de todos os tempos.

Nabuco foi fundador da Academia Brasileira de Letras. Autor de obras importantes, como "Um Estadista do Império" e "Minha Formação". Antes mesmo de ser embaixador, chefiou a delegação brasileira em Londres para defender a causa dos limites da Guiana Inglesa. Oswaldo Aranha também é até hoje reverenciado pelos judeus por ter defendido a criação do Estado de Israel. Estamos, sim, bem representados na história diplomática.

Esta é a função de um diplomata: defender os interesses de seu país, sem, contudo, estabelecer conflitos ou antagonismos que poderiam ser evitados. Cada palavra, cada pausa e cada gesto poderão incitar a interpretação que levará ou não aos objetivos pretendidos.

Esse foi o primeiro passo de Trump. É quase certo que outros desdobramentos virão. Tomara que ele consiga manter a serenidade, o comedimento e a inteligência diplomática desse seu pronunciamento de hoje. O mundo agradece.

Superdicas da semana

- É preciso sempre procurar uma saída para evitar os conflitos
- Cada palavra e cada gesto podem representar, em si, toda a intenção do orador
- Quanto mais grave a situação, maior deve ser o cuidado diplomático
- As palavras podem agredir tanto ou mais que algumas ações

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Como falar de improviso e outras técnicas de apresentação", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.

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