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Reinaldo Polito

Quem ganhou o debate de ontem, Biden ou Trump?

Saul Loeb e Ronda Churchill/AFP
Imagem: Saul Loeb e Ronda Churchill/AFP

Colunista do UOL

23/10/2020 12h10

Rara é a pessoa capaz de pesar os defeitos dos outros, sem botar o dedinho na balança para acrescentar um pouco mais de peso.
Carlos Lacerda

Ontem (22), foi realizado o último debate na disputa eleitoral pela Casa Branca. Do lado dos republicanos, estava o presidente Donald Trump, do outro, representando os democratas, o ex-vice-presidente no governo Barack Obama, Joe Biden. Esse debate era visto como decisivo para as eleições presidenciais.

As pesquisas apontam uma boa vantagem de Biden, mas, provavelmente, em vista dos escândalos que vieram à tona na última semana, essa diferença comece a despencar. Se forem confirmadas em tempo as acusações feitas contra o candidato democrata, Trump deve se reeleger.

O debate foi civilizado

Ao contrário do que ocorreu no debate anterior, os candidatos, especialmente Trump, se defrontaram de maneira mais civilizada. Desde o tom da voz, passando pelas interrupções, até mesmo pelos ataques pessoais. Houve sim uns petardos aqui e ali, mas se compararmos os dois momentos, desta vez "os meninos" se comportaram de forma exemplar.

Quem acompanhou com atenção esse confronto de pouco mais de uma hora observou que os dois debatedores estavam bem afiados para responder aos ataques do adversário. Especialmente quando a disputa ocorria mais no campo da argumentação que na base da gritaria, um importante conceito deve ser levado em conta.

Do choque da tese com a antítese, o que não for destruído servirá para a síntese, ou seja, para o julgamento. Por isso, todos os argumentos contrários precisam ser combatidos, pois se continuarem preservados, poderão ser considerados como ponto positivo para quem os defendeu. Exatamente a atitude adotada pelos dois competidores. Ninguém deixou um argumento contrário sem resposta.

O melhor no debate

Afinal, quem ganhou essa briga? É impressionante como as opiniões dos analistas divergem. Alguns cravam vitória contundente de Biden, enquanto outros não têm dúvidas de que Trump levou o troféu. Talvez até tenha havido uma pequena vantagem de um candidato em determinadas questões, e do seu adversário em outras matérias. Nada, entretanto, que pudesse mostrar a vitória retumbante de um lado ou de outro.

Como explicar, à luz dos conceitos da comunicação, essa diferença de opiniões? Há um estudo bastante curioso que mostra como as pessoas tomam posição num debate a partir de sua "audição seletiva". Só consideram o que beneficia o candidato de sua preferência, e o que prejudica o adversário.

Estudos realizados por Hans Sebald em 1962 sobre o tema "Mecanismos de retenção da imagem sob forma de percepção, memória e distorção seletivas" comprovam a existência dessa "audição seletiva". Sua pesquisa foi realizada com 152 alunos da Universidade Estadual de Ohio. Eles assistiram aos debates entre os candidatos à presidência dos Estados Unidos, Kennedy e Nixon, no ano de 1960.

Temos audição seletiva

O estudo desejava descobrir a opinião deles com relação aos dois candidatos antes e depois da realização dos debates. O resultado demonstrou que as pessoas demonstram percepção e memória seletivas, ao mesmo tempo que apresentam distorção seletiva. Ou seja, ouvem o que desejam, apoiadas em suas opiniões e atitudes pretéritas.

Por isso que mudar a opinião de um eleitor é extremamente difícil. Apenas se envolverão com os argumentos dos candidatos aqueles que ainda não possuem opinião formada, os chamados indecisos. A não ser que um fato muito relevante, com provas contundentes, possa obrigá-los a rever suas posições.

Por esse e outros motivos, não é possível ainda dizer quem será o vencedor nessas eleições. Mesmo estando à frente nas pesquisas, Biden ainda não pode cantar vitória. Se nos lembrarmos das últimas eleições, teremos nítido na memória o que aconteceu. Na última hora, Hillary ainda era considerada a vencedora do pleito.

Todas as pesquisas, sem exceção, davam esse resultado. Até hoje, meu amigo César Souza, com quem apostei uma boa garrafa de vinho, diz: dormi com a Hillary eleita e uma garrafa de vinho nos braços. Acordei com o Trump na presidência e sem a minha garrafa de vinho.

As opiniões parecem ser muito emocionais, baseadas apenas na "audição seletiva". Por isso, nada como uma boa dose de paciência até sabermos o resultado das urnas. Sem contar que não vale apenas o voto dos eleitores, mas sim dos delegados de cada estado. Assim como Hillary ganhou nos votos da população norte-americana, mas perdeu na escolha dos delegados, nada impede que o mesmo volte a ocorrer. Que vença o melhor.

Superdicas da semana

  • As pessoas possuem audição seletiva
  • Só ouvem o que desejam ouvir, já apoiadas em suas opiniões anteriores
  • Apenas um fato muito relevante e irrefutável pode mudar opiniões já formadas
  • As análises ficam comprometidas por causa de ideias preconcebidas

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Superdicas para escrever uma redação nota 1.000 no ENEM", "Como falar de improviso e outras técnicas de apresentação", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.

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