IPCA
0,83 Mar.2024
Topo

Reinaldo Polito

Bolsonaro está por um fio, a ponto de explodir

Pedro Ladeira/Folhapress
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Ainda os poderosos devem saber que em sua sombra, mais perigoso que a inveja, o ressentimento daqueles mesmos que vivem de seu favor.
Gregorio Marañón

Desde que Bolsonaro se candidatou à Presidência escrevi aqui nesta coluna 37 textos analisando a comunicação dele. 38 com este. Em alguns desses artigos, as críticas foram pesadas, como, por exemplo, quando fez um pronunciamento oficial em agosto de 2019 - "No teleprompter, Bolsonaro se parece com uma criança aprendendo a falar". O título já indica a tragédia daquela apresentação.

Em outras oportunidades elogiei seus discursos, como, por exemplo, um mês depois, quando falou na abertura da Assembleia Geral da ONU - "Bolsonaro fez seu melhor discurso, tanto pelo conteúdo quanto pela forma". Também neste caso o próprio título indica a qualidade do seu desempenho.

Daria um livro

Se juntasse todos esses textos, daria um bom livro de análise de discurso e de comportamento. Observei todos os detalhes da sua comunicação. Avaliei as virtudes e defeitos da postura, gesticulação, expressividade do semblante, comunicação visual, linguagem, ritmo da fala e estrutura do raciocínio. Não deixei passar também os erros e acertos de suas brincadeiras.

Nem preciso dizer que levei bordoada dos dois lados. Nos momentos em que a sua comunicação mereceu ser enaltecida pelas qualidades, me acusaram de bolsominion. Já quando sua maneira de se expressar precisou ser censurada pelos equívocos cometidos, fui tachado de mortadela.

O estudo da comunicação

Nem uma coisa nem outra. Só me preocupo mesmo é com o estudo da comunicação dele. Dessa forma, apontando erros e acertos, procuro dar aos leitores a oportunidade de refletir sobre os mais diferentes aspectos da comunicação e, quem sabe, usar as sugestões para o seu próprio aprendizado.

Com todo esse trabalho de pesquisa que empreendi, assistindo aos vídeos com os seus discursos, e até pessoalmente em algumas oportunidades, aprendi muito a respeito do comportamento de Bolsonaro.

Consigo notar até com facilidade os momentos em que ele está apenas repetindo quase mecanicamente algumas mensagens que costuma levar "na manga" para se defender nas falas de "imprevisto". Assim como sei também quais são os instantes em que ele planejou cuidadosamente o que pretendia dizer.

Quando está confiante ou fragilizado

Percebo de longe quando ele está seguro, confiante para externar os seus pensamentos de maneira lógica e concatenada; e farejo a distância as situações em que ele se apresenta de maneira titubeante, meio perdido com as palavras e a sequência do raciocínio.

A forma como interage com os ouvintes, como cita naturalmente as características da localidade onde se encontra e como brinca com aqueles que são mais próximos é o sinal de que está tranquilo naquele ambiente, e com total domínio da mensagem que pretende transmitir.

Se, entretanto, começa a contar a história da facada que levou em Juiz de Fora e de como Deus lhe deu uma segunda vida; do que Israel não tem e o que eles são, para depois comparar com o que temos e o que não somos; é quase certo que levará essa conversa até próximo do encerramento, quando, então, dá duas ou três pinceladas no tema do evento e parte para a conclusão.

O couro não é tão duro

Os 28 anos de experiência na Câmara, somados a esses quase três na Presidência fizeram com que fortalecesse uma couraça praticamente intransponível. Quem já viu seu desempenho em um debate com a imprensa ou com outros políticos sentiu que ele não se abate diante dos ataques que recebe. Ao contrário, a impressão é a de que quanto mais agressivos são os oponentes, mais enérgico e disposto ele se mostra para as adversidades.

Posso afirmar, entretanto, que atualmente Bolsonaro não está bem. Diria ainda que, diante de tantas pressões, pelo jeito como tem se comportado, está por um fio, a um passo de explodir.

Demonstra insegurança

Da última semana para cá, Bolsonaro deu demonstrações claras de estar passando por um dos piores momentos do seu governo. Basta observar suas ações nas circunstâncias em que costuma se sentir muito à vontade. Dá a impressão de ser um principiante que não sabe bem como agir.

Fala esfregando as mãos nervosamente, trunca frases, não encontra palavras, gagueja, foge com os olhos. É a indicação clara de que o corpo está presente, mas o "espírito" vaga por outras dimensões. Na última live, por exemplo, precisou contar com a ajuda do ministro Marcos Pontes para concluir a frase. Sua voz está fraca e ofegante. Ele não via a hora de encerrar.

Outro exemplo que demonstra a sua instabilidade emocional, foi no pronunciamento que fez na 58ª Cúpula do Mercosul, na última quinta-feira, dia 8. Falou sem vida, sem energia, sem nenhuma emoção. Parecia que se apresentava ali por obrigação. Tanto que em determinado momento, em vez de dizer "durante a presidência brasileira do Mercosul", disse "durante a pandemia brasileira do Mercosul".

Por mais que esteja pronto para as pressões que o cargo impõe, chega uma hora em que fica difícil contar até dez. E o risco é o de dizer o que não deve, e tomar atitudes das quais tenha de se arrepender mais tarde.

Vamos acompanhar o que irá ocorrer nos próximos dias. Será que ele encontrará o equilíbrio para suportar esse turbilhão que o tem atormentado?

Superdicas da semana

  • Aprendemos com os erros e acertos dos outros
  • De vez em quando é bom deixar a refrega
  • Todas as pessoas têm um limite
  • Sob forte emoção, o melhor é ficar quieto

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Como Falar Corretamente e sem Inibições", "Comunicação a distância", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo", "Saiba dizer não sem magoar os outros" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela editora Planeta.

PUBLICIDADE
Errata: este conteúdo foi atualizado
O presidente Jair Bolsonaro está há quase três anos na presidência, e não dois, como informado anteriormente. A matéria foi corrigida.