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Reinaldo Polito

Passaporte sanitário: Vacina obrigatória agride os direitos individuais?

Vacinação - iStock
Vacinação Imagem: iStock

Colunista do UOL

10/08/2021 04h00

A liberdade consiste em poder fazer o que não prejudica a outrem.
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão

A prefeitura de São Paulo usou a mão pesada para punir os funcionários que se recusarem a tomar vacina contra a Covid-19. A medida tem amparo na decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que determinou ter as autoridades municipais o poder de adotar a vacinação compulsória.

O texto assinado pelo prefeito Ricardo Nunes é claro: "Os direitos à vida e à saúde contemplados nos artigos 5º, 6º e 196 da Constituição Federal devem prevalecer em relação à liberdade de consciência e de convicção filosófica individual".

Nem todo mundo concorda

Boa parte da população se revoltou contra essa obrigatoriedade. Uma dessas pessoas foi a deputada Janaina Paschoal:

Punir os funcionários que não desejam se vacinar? Como assim? Estamos em uma ditadura? Uma pessoa adulta não pode ser submetida a nenhum procedimento contra sua vontade.

Essa discussão não é privilégio dos brasileiros. No mundo todo há manifestações contrárias à adoção do "Passaporte Sanitário", especialmente nos países europeus, mais especificamente na França.

Os franceses estão indo às ruas em grande número para protestar. Já são quatro semanas consecutivas em que se manifestam, sendo que os números aumentam a cada evento. No último sábado, dia 7, 237 mil pessoas mostraram seu descontentamento nas mais diferentes regiões do país.

Privação das liberdades

Os manifestantes vociferam que não se submeterão à privação das liberdades. Afirmam que a decisão do Conselho Constitucional baixada na quinta-feira, dia 5, constitui verdadeira ditadura sanitária. Dizem com todas as letras que preferem sofrer as sanções impostas a quem contrariar as determinações do Passaporte Sanitário a se submeter a essa arbitrariedade.

Há argumentos bem fundamentados de todos os lados. E essa discussão de a pessoa obedecer às regras que contrariem sua vontade em benefício do bem-estar da coletividade não é novidade. Estudiosos das mais diferentes épocas já se manifestaram a respeito desse tema.

O pensamento filosófico

Entre os pensadores que discutem a questão dos direitos e das obrigações, podemos destacar o filósofo britânico John Stuart Mill, que viveu de 1806 a 1873. Ele discutiu essa matéria em suas obras, particularmente em "Sobre a liberdade". Pela sua maneira de pensar "Os indivíduos devem ser livres para fazer o que lhes proporcione prazer, ainda que isso possa prejudicá-los".

Os defensores das liberdades individuais, que se recusam a se submeter à vacinação obrigatória, poderiam fazer uma citação seletiva do pensamento de Mill e parar por aí. Mas sua teoria tem um complemento que faz toda a diferença:

Mas eles não estão autorizados a fazer coisas que prejudiquem os outros.

Este é o seu pensamento completo:

Sobre seu próprio corpo e mente, o indivíduo é soberano, entretanto, embora possa escolher fazer coisas que afetam seu próprio corpo, não pode prejudicar o de outra pessoa.

Ainda em experiência?

O argumento utilizado por muitos que se recusam a tomar a vacina é que, embora todas tenham recebido o aval da ANVISA, a experiência é muito recente.

Ainda que as autoridades afirmem que com a autorização o processo deixou de ser experimental, julgam esses reticentes que todas as vacinas usadas para o combate das mais diferentes doenças tiveram um período de experimentação muito mais longo, e que ainda não se sabe quais as consequências que poderão surgir com essas elaboradas para neutralizar a Covid-19.

Parece que essa discussão ainda terá muitos rounds. À medida que os especialistas, mas especialistas mesmo, não alguns palpiteiros de plantão, ou aqueles que ajeitam teorias por motivos ideológicos, trouxerem à luz constatações mais seguras, é provável que as resistências de hoje serão arrefecidas.

Pelo sim, pelo não, já tomei as minhas duas doses.

Superdicas da semana

  • O homem tem o direito de fazer o que bem entender com o próprio corpo
  • Desde que esse direito não agrida o direito dos outros
  • As determinações governamentais devem ser seguidas
  • Será que todas as determinações merecem respeito?

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Como Falar Corretamente e sem Inibições", "Comunicação a distância", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo", "Saiba dizer não sem magoar os outros" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela editora Planeta.