Você também acha que brasileiro não sabe votar?
A eleição indireta tem por base o pressuposto de que o povo é incapaz de escolher acertadamente os deputados.
Rui Barbosa
Temos ouvido esta afirmação de forma recorrente: o brasileiro não sabe votar. Será? Bem, se a pessoa votar no candidato que você apoia, provavelmente dirá que ele é um eleitor consciente. Se, por outro lado, ele escolher um político que não goza de sua simpatia, talvez o considere um "sem noção".
Faça o teste
Fazer essa constatação é simples. Pergunte a um eleitor petista o que ele acha daquele que vota em Bolsonaro. Depois, pergunte a um bolsonarista qual a opinião dele a respeito de quem deseja eleger Lula. Nem será preciso esperar a resposta.
Com relação a essas preferências políticas há um conceito da comunicação que precisa ser considerado: a "audição seletiva". Somos levados a enxergar apenas qualidades nos candidatos de nossa preferência, e a ver só defeitos naqueles aos quais fazemos oposição.
Além desse fator, há outros que precisam ser levados em conta, como, por exemplo, a formação intelectual, a crença nos argumentos de campanha, a falta de experiência e a alienação. Sendo esta uma das mais relevantes.
A alienação
Como a alienação é uma das causas mais importantes, vamos começar por ela. Mais de 70% dos eleitores não se lembram em quem votaram para deputado federal nas últimas eleições. E aqui já emendamos outro motivo mencionado, a falta de escolaridade. Nesse levantamento foi evidenciado que o esquecimento é ainda maior quando o nível de formação escolar é inferior. Por esses dois motivos poderíamos afirmar que os brasileiros não sabem mesmo votar.
Essa conclusão pode ser precipitada, pois o fato de a pessoa não se lembrar em quem votou ou ter baixa escolaridade não significa que não saiba votar. No primeiro caso, talvez até tenha optado por um bom candidato, apenas não acompanhou o desempenho dele na Câmara.
Da mesma forma, ter baixa escolaridade não significa necessariamente que alguém não tenha condições de escolher um bom representante. Quantos adotam um político com base em sua sensibilidade e intuição, sabendo identificar nele as qualidades e defeitos.
A crença
Vamos caminhar com outra razão apontada: a crença nos argumentos de campanha. Algumas pessoas tendem a acreditar que os candidatos estejam realmente dizendo a verdade em seus discursos. Esse motivo também não pode ser suficiente para determinar que o eleitor não saiba votar.
Se formos sinceros, todos nós podemos dizer que vez ou outra já nos equivocamos na escolha por nos iludirmos com discursos eleitoreiros. Alguns candidatos mentem com tanta competência que até eles chegam a acreditar nas próprias mentiras.
A inexperiência
Finalmente, a falta de experiência. Depois da saída dos militares do poder, a população teve de reaprender a votar. Em alguns casos, os mais jovens, a aprender, já que nunca haviam votado na vida. Esse aprendizado leva tempo. Erramos uma vez e aprendemos um pouquinho. Erramos de novo e crescemos mais alguns níveis com a nossa percepção. Quando pensamos que já somos "catedráticos", lá vem outra decepção. E assim, eleição por eleição vamos adquirindo a experiência de que precisamos para escolher os nossos bons representantes.
Pelé
Sempre me lembro da injustiça que cometeram com Pelé. Nos anos 1970 ele disse que o brasileiro não sabia votar. Até hoje tentam crucificar o rei do futebol por causa dessa afirmação. Só que se esqueceram de avaliar que ele não disse que o brasileiro "não deveria" votar, mas sim que "não sabia" votar.
Estava implícito em sua mensagem que, embora não soubesse, o eleitor poderia aprender. Ou não é o que vem ocorrendo ao longo dessas décadas? Entre eleições e plebiscitos alguns já votaram mais de 40 vezes. É bastante, mas não é suficiente. Ainda vamos nos enganar muito e dar o nosso voto a gente incompetente, que rouba dinheiro da saúde, da educação e dos trabalhadores.
A democracia
Não vamos desistir da democracia. A frase de Winston Churchill sobre o sistema democrático já está surrada, mas se mostra cada vez mais atual: "A democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor que ela".
Os discursos dos candidatos já começaram com a pré-campanha para as eleições de 22. Parecia tão longe, mas já chegou. Talvez alguns errem o voto no candidato, mas poderão consertar na próxima. Essa é a vantagem da democracia.
Superdicas da semana
- Nossa opinião sobre um político também se apoia em nossa "audição seletiva"
- Demoramos para desconfiar que um político pode estar mentindo
- Mais de 70% dos eleitores não se lembram em quem votaram nas últimas eleições
- Dizer que os brasileiros não sabem votar pode ser um equívoco
Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Como falar corretamente e sem inibições", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo", "Saiba dizer não sem magoar as pessoas" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.
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