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Reinaldo Polito

OPINIÃO

Você acredita em pesquisas eleitorais?

Eleições - Antonio Augusto/Ascom/TSE
Eleições Imagem: Antonio Augusto/Ascom/TSE

Colunista do UOL

29/05/2022 23h41

Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas.
Machado de Assis

Se você disser que acredita nas pesquisas eleitorais, estará bem acompanhado, pois muita gente pensa assim. Se, entretanto, afirmar que não confia nelas, terá ao seu lado também um número expressivo de pessoas que comungam dessa mesma opinião.

De maneira geral, quando o resultado do levantamento beneficia o candidato da preferência do eleitor, a tendência é a de que ele concorde com os dados. Ao contrário, se os indicadores não favorecerem àquele que defende, poderá interpretar o resultado como equivocado.

Bases científicas

Os levantamentos são baseados em critérios científicos. Aprendi como fazer essas estimativas há décadas, no início dos anos 1970, quando ainda trabalhava no departamento de Análise Estatística e Econométrica do Instituto de Economia Agrícola.

Fazíamos com frequência análises de intenção de plantio e colheita para o Estado de São Paulo. Medíamos a satisfação dos agricultores. Os acertos eram impressionantes. Comecei, assim, naquele ambiente, ao lado de competentes economistas e engenheiros agrônomos, a confiar nas pesquisas criteriosamente formuladas.

Os equívocos

Quem não tem conhecimento desses meandros matemáticos/estatísticos costuma duvidar equivocadamente dos números divulgados. Diz, por exemplo: ah, não acredito porque nunca fui entrevistado. Ou: como pode esse resultado estar certo se foram pesquisadas apenas duas ou três mil pessoas?

São números! E por mais que sejam "torturados", no final "confessarão" que o resultado é o mesmo.

A pesquisa é a fotografia do momento. Se os fatores observados no instante do levantamento dos dados fossem imutáveis, a apuração das eleições seria coincidente. Ocorre que essa fotografia se transforma em filme logo após a catalogação das respostas dos pesquisados.

O pronunciamento empolgante ou infeliz de um candidato, um indicador econômico que satisfaça ou desagrade a população, uma notícia relevante a respeito de questões sociais, que mexa com o humor dos eleitores. Enfim, qualquer fato novo pode ser suficiente para tornar desatualizado o estudo já no momento da sua divulgação.

Paixão volúvel

O pensador francês Jean Baudrillard afirma que a população não é comprometida com as suas demonstrações de apoio. Pode se mostrar favorável a uma causa em determinado momento e, aparentemente sem motivo, mudar de opinião em outro.

Por isso, essas "fotografias" precisam se suceder periodicamente para que possam captar as transformações e estejam próximas do filme que se desenrola. É lógico que, por mais precisas que sejam, a possibilidade de surgir equívocos nas análises de intenção de votos sempre existirá.

Equívocos existem

As diferenças nos resultados entre distintos institutos são a prova dessa inconsistência. Somente o acompanhamento diligente das mudanças ocorridas nos aspectos considerados em cada pesquisa é que poderá evitar distorções.

Não se trata, portanto, de confiar ou não nas pesquisas por questões ideológicas ou paixões políticas, mas sim porque essas incorreções podem participar dos estudos empreendidos. O sociólogo francês Pierre Bourdieu diz de forma apropriada:

Alguns autores preferem colocar em xeque a ideia de opinião e questionar a metodologia para que se chegue ao seu reconhecimento, por conta de se entender que a opinião não possa ser fruto das pesquisas e que essas, seja por aspetos técnicos, seja por vieses intencionais podem gerar desvios informativos e interpretativos.

Tudo pode mudar

A campanha ainda nem teve início. Já nessa pré-campanha muitos candidatos que chegaram esperançosos para participar da terceira via desistiram. Não sabemos o que poderá rolar nos próximos meses. A tendência é a de que os dois candidatos líderes hoje nas pesquisas continuem polarizando as intenções de votos.

Os bolsonaristas não devem se desesperar com esses 27%, nem os lulistas poderão subir no salto alto por causa dos 48%. Se existe um prognóstico aceitável é o de que esses números podem mudar muito. O evento esvaziado promovido por Lula para comemorar os resultados da pesquisa já pode ser um indicador dessas mudanças destacadas na tese de Baudrillard.

Luiz Alberto Farias, em sua obra "Opiniões Voláteis", cita o sociólogo alemão Norbert Elias:

A opinião pública não é simplesmente a sintonia da opinião de muitos seres humanos sobre uma questão do dia, particular e determinada, mas algo compreendido em contínua formação.

A competência oratória de cada um poderá ter influência decisiva na conquista dos eleitores. Quem souber traduzir em linguagem simples seu programa de governo, e indicar de maneira clara as soluções para os problemas que hoje nos afligem, ampliará suas chances de sucesso.

Vamos acompanhar. Lula e Bolsonaro vão fazendo campanha e os institutos de pesquisa continuarão a fotografar as opiniões dos eleitores. Quem se sair melhor na foto ao longo desse percurso vence.

Superdicas da semana

  • As pesquisas são feitas com bases científicas
  • Normalmente, as pessoas confiam nas pesquisas que as favoreçam
  • Uma pesquisa pode ficar desatualizada no instante da divulgação
  • Pesquisa é a fotografia de um momento
  • Enquanto a pesquisa é a foto, a evolução dos fatos é o filme

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: Como falar corretamente e sem inibições", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.