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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por que devemos preservar a imagem de nossas crianças?

A bebê Alice, de dois anos, é estrela de campanha do Itaú - Reprodução
A bebê Alice, de dois anos, é estrela de campanha do Itaú Imagem: Reprodução

03/08/2021 04h01

Para quem ainda não conhece, a bebê Alice vem ganhando cada vez mais visibilidade nas redes sociais de sua mãe @morganasecco. No Instagram, são 2,2 milhões de fãs. No TikTok, nada menos do que 2,9 milhões de seguidores. No YouTube, já são mais de 100 mil inscritos em seu canal.

A visibilidade cresceu ainda mais depois de uma campanha recém-veiculada pelo Banco Itaú, em rede nacional, ampliar sua popularidade. O vídeo já foi exibido mais de 6 milhões (6 milhões!) de vezes no YouTube.

A desenvoltura de uma bebê de dois anos, a sua oralidade e a sua dicção vem chamando a atenção do público que acompanha Alice nas mídias digitais e, agora, na televisão aberta. O vídeo #IssoMudaOMundo, feito em conjunto com a mãe da bebê está totalmente alinhado aos pilares de comunicação do banco e foi uma sacada muito oportuna —mas, sim, quero trazer alguns questionamentos sobre tudo isso.

Alice não consome telas --mas está presente em quase todas

Há aspectos muito positivos na persona do bebê Alice, embora ela esteja em uma fase de desenvolvimento que repete tudo e, não necessariamente, entende o que fala. Inclusive, o fato relatado por sua mãe de que Alice não consome telas pode ser um dos motivos que evidenciam o desenvolvimento da bebê.

Acho sempre importante reforçar as orientações da Sociedade Brasileira de Pediatria para evitar a exposição de crianças menores de dois anos às telas, mesmo que passivamente.

Crianças um pouco maiores, até cinco anos, não devem ultrapassar uma hora por dia, sempre com supervisão dos responsáveis. Quando a criança passa para a fase de seis a dez anos, o tempo pula para duas horas por dia, no máximo. Os adolescentes, de 11 a 18 anos, não devem passar de três horas por dia em frente ao videogame, por exemplo.

Alice não consome telas, mas está presente em quase todas. Se por um lado o aspecto positivo do desenvolvimento da bebê tem ganhado tanta notoriedade, por outro, desperta novamente a discussão sobre a preservação de imagem da criança ou exposição de seus filhos (explícito no artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA).

A pequena não teve a chance de escolher não ser famosa. Ela não faz a menor ideia do que está acontecendo com a sua privacidade.

Estudo sobre "sharenting"

Em sua pesquisa sobre "sharenting", que é a junção dos termos das palavras share (compartilhar) e parenting (parentalidade), a acadêmica americana Stacey Steinberg achou que concluiria sua investigação convencida a nunca mais compartilhar nada sobre seus três filhos, mas não foi o que aconteceu e mudou de ideia.

Ela sabe que há muito mais perguntas do que respostas quando a discussão são os usos e apropriações de crianças na internet. A grande questão é que as crianças de até cinco anos são as que mais possuem imagens públicas na História da humanidade.

Todo trabalho de incentivo à leitura, as artes, as brincadeiras, aos esportes, a cozinhar e brincar com os alimentos ou qualquer outra atividade afastada das telas são de longe a melhor estratégia para saúde mental de um bebê e gostaria que, como sociedade colocássemos em pauta e avaliássemos os direitos das crianças na rede.

O encanto pela bebê Alice nos inebria e acabamos nos esquecendo de avaliar: qual seria o limite do uso de sua imagem?