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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Navios mudam rotas e deixam produtos brasileiros parados em portos

No Brasil, um dos problemas mais recorrentes é o atraso dos navios cargueiros na coleta dos produtos armazenados nos portos - Amanda Perobelli
No Brasil, um dos problemas mais recorrentes é o atraso dos navios cargueiros na coleta dos produtos armazenados nos portos Imagem: Amanda Perobelli
Flavia Takafashi

05/05/2022 04h00

Recentes estudos realizados pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) detectam um novo gargalo para as exportações brasileiras. Com a pandemia e a imposição de novas barreiras sanitárias em diferentes países, o tráfego internacional de carga marítima tem sido afetado. No Brasil, um dos problemas mais recorrentes já identificados pela Antaq é o atraso dos navios cargueiros na coleta dos produtos brasileiros armazenados nos portos, e prontos para exportação.

Embora pouco conhecida do consumidor final, a Antaq tem entre suas missões criar as normas e fiscalizar a prestação de serviços de todos os setores que utilizam a navegação marítima ou fluvial em território brasileiro. Por extensão, é a agência reguladora incumbida de buscar soluções para otimizar o transporte aquaviário de cargas e passageiros em todo o país.

O grupo de estudos que montamos na Antaq identificou que muitas rotas de navios têm sido alteradas pelas empresas de transportadores marítimos de cargas, os armadores. Muitas vezes, essas alterações de escala são comunicadas aos portos brasileiros sem muita antecedência, e os respectivos clientes não recebem nenhuma compensação para eventuais prejuízos causados.

Esses clientes são produtores brasileiros de insumos destinados ao mercado internacional. Os segmentos mais atingidos pelas mudanças intempestivas nas rotas são o agro (madeira, café, algodão, carnes e frangos congelados), a indústria química e os exportadores de minério.

Na prática, o que está acontecendo nos portos brasileiros equivale à seguinte situação: você e sua bagagem aguardam o transporte pré-agendado, mas o motorista se desvia da rota e deixa você para trás. Não há compensação nem alternativa para a solução do seu problema.

Denominada omissão de escala, a decisão unilateral dos transportadores internacionais de pular portos brasileiros tem causado impactos danosos tanto na origem quanto no destino das exportações.

No Brasil, podemos elencar entre os problemas mais frequentes o potencial de perda de cargas perecíveis, o aumento nos custos dos exportadores com aluguéis de contêineres e armazenamento nos portos, congestionamentos nos terminais portuários, atrasos na entrega de vendas já realizadas e a imprevisibilidade na efetiva entrega das cargas já vendidas.

No destino, para o cliente final, também há consequências: atrasos no recebimento de matérias-primas destinadas ao mercado global, desabastecimento nos outros países, desgastes no relacionamento de produtores brasileiros com seus clientes internacionais. Sem entregar a mercadoria no prazo previsto, há também o impacto na reputação, credibilidade e na confiança internacional no Brasil.

A detecção dessa fragilidade na logística brasileira remonta a 2021. Desde então, o número de omissões de escala aumentou, e a Antaq vem apurando esse impacto. Os atrasos também se tornaram mais frequentes. Em média, 60 a 70% dos embarques de cargas nos terminais de contêineres brasileiros rumo ao exterior acontecem fora do prazo previamente pactuado.

Sabe-se que o combinado não sai caro, mas quando a programação pactuada pelos armadores com os exportadores brasileiros foge do cronograma, os prejuízos são extremos.

Além de seu papel institucional, a Antaq assumiu também o protagonismo na intermediação entres os envolvidos para buscar soluções possíveis e imediatas a esse recorrente problema. Já temos o diagnóstico -que impacta o bolso de quem, com sua carga deixada para trás, tem que assumir os prejuízos causados pelo navio cargueiro.

E estamos atuando na moderação entre as partes. Como ente fiscalizador, a Antaq também tem o compromisso de identificar a responsabilidade originária na geração de custos adicionais de armazenagens nos portos brasileiros em decorrência das omissões de escala, para punir seus causadores. Até o momento, apenas os produtores brasileiros vêm arcando com o ônus de serem deixados para trás.

Já iniciamos o debate com todos os envolvidos. Mitigar as perdas diretas e indiretas dos atrasos e omissões de escala é o resultado que queremos alcançar.

Uma das propostas é incentivar os transportadores de carga a reajustar suas programações com mais antecedência, agregando maior previsibilidade para os terminais portuários e importadores e exportadores de carga.

Ainda que não tenhamos alcance global, iremos viabilizar alternativas para reduzir o impacto e os custos das exportações brasileiras.