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Carla Araújo

REPORTAGEM

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Milton Ribeiro pede exoneração do MEC

17.set.22 - Milton Ribeiro em evento do MEC - Catarina Chaves/MEC
17.set.22 - Milton Ribeiro em evento do MEC Imagem: Catarina Chaves/MEC

Ana Paula Bimbati e Eduardo Militão, Colunista do UOL e do UOL, em Brasília e em São Paulo

28/03/2022 16h03Atualizada em 28/03/2022 17h44

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Milton Ribeiro pediu exoneração do cargo de ministro da Educação hoje (28). A saída foi publicada em edição extraordinária do Diário Oficial da União por volta das 16h40.

Ribeiro esteve no Planalto no início da tarde e conversou pessoalmente com Jair Bolsonaro (PL). Em princípio, ele deve ser substituído por Victor Godoy, secretário-executivo do MEC, que até hoje era o número dois na pasta e atuava como braço-direito do ministro.

Auxiliares do presidente afirmaram que inicialmente foi estudada a possibilidade de Ribeiro se licenciar do cargo, mas foi decidido pela exoneração —no texto oficial, consta que a saída foi "a pedido". Apesar disso, nas palavras de um auxiliar direto do presidente, após a sua defesa, Ribeiro poderia retornar ao comando do MEC "com mais tranquilidade".

Uma carta chegou a circular entre parlamentares, atribuída a Ribeiro, em que dizia que ele não iria se despedir do ministério.

Pouco mais tarde, o pastor publicou um texto semelhante no Twitter, mas afirmou que decidiu solicitar a exoneração ao presidente, "a fim de que não paire nenhuma incerteza" sobre a conduta dele e a do governo federal.

Tomo esta iniciativa de coração partido. Prezo pela verdade e sei que a verdade requer tempo para ser alcançada. Sei de minha responsabilidade política, que muito se difere da jurídica. Minha decisão decorre exclusivamente de meu senso de responsabilidade política e patriotismo, maior que quaisquer sentimentos pessoais."
Carta divulgada por Ribeiro, sobre sua exoneração

A saída acontece uma semana após a divulgação de um áudio em que Ribeiro afirma que o governo federal prioriza a liberação de verbas a prefeituras ligadas a dois pastores. Sem cargos, os líderes religiosos atuam em um esquema informal de liberação de verbas do MEC, segundo reportagem da Folha de S.Paulo. "Foi um pedido especial que o Presidente da República [Jair Bolsonaro] fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar [Santos]", diz o ex-ministro na gravação.

Antes da divulgação da conversa, o jornal O Estado de S. Paulo havia revelado que a dupla de pastores lidera um gabinete paralelo no MEC.

Tenho plena convicção de que jamais realizei um único ato de gestão na minha pasta que não fosse pautado pela correção, pela probidade e pelo compromisso com o erário. As suspeitas de que uma pessoa, próxima a mim, poderia estar cometendo atos irregulares devem ser investigadas com profundidade."
Carta divulgada por Ribeiro, sobre sua exoneração

Ribeiro é o quarto ministro da Educação da gestão Jair Bolsonaro (PL). Ele assumiu em julho de 2020. Antes, foi vice-reitor da Universidade Mackenzie e vice-presidente do conselho deliberativo da mantenedora da instituição.

Antes dele, no ministério:

Sob investigação

A Polícia Federal abriu inquérito na semana passada para investigar a ação dos pastores junto ao MEC. A pedido da Procuradoria-Geral da República, o Supremo Tribunal Federal também autorizou a abertura de apuração.

Segundo acusações de prefeitos e pessoas ligadas à educação, os pastores evangélicos Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura Correia conquistaram acesso privilegiado ao MEC.

Nas redes sociais, o pastor Gilmar afirmou serem falsas as notícias sobre sua participação como intermediador na liberação de verbas do MEC para prefeituras. Arilton Moura não se manifestou.

Reportagem do UOL mostrou que na gestão de Ribeiro municípios sem alianças políticas tiveram dificuldade para conseguir verba no fundo.

De acordo com relatos feitos por gestores e assessores, os pastores negociavam a liberação de recursos às prefeituras em restaurantes e hoteis de Brasília, e depois entravam em contato com o ministro. O chefe do MEC, então, determinava ao FNDE a oficialização do empenho, reservando o recurso.

Após a repercussão, Ribeiro negou que Bolsonaro tenha pedido atendimento preferencial. "[Ele] solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem", afirmou, em nota. Em entrevistas, o ministro disse que já havia solicitado investigação sobre a ação dos líderes religiosos.

Polêmicas

Antes do áudio, a passagem de Ribeiro pela pasta da Educação já havia colecionado polêmicas, apesar de ele ter um perfil mais discreto do que seus antecessores.

O ex-ministro foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) ao STF pelo crime de homofobia. Em entrevista, o pastor havia dito que o "homossexualismo" acontece em "famílias desajustadas". Ele também disse que queria ter acesso prévio ao Enem para evitar questões de "cunho ideológico".

Ao longo de 2021, Ribeiro fez declarações polêmicas em relação à educação inclusiva. "Nós temos hoje 1,3 milhão de crianças com deficiência que estudam nas escolas públicas. Desse total, 12% têm um grau de deficiência que é impossível a convivência", disse.

A obediência a Bolsonaro já havia aparecido antes —em uma conversa obtida pelo UOL em abril do ano passado, o então ministro disse que a política do MEC "deve vir e tem que vir em consonância com a visão educacional, do projeto, do senhor presidente da República".