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Opinião

99 'confunde' táxi com app para tentar liberar transporte por moto em SP

Desde o início do ano, a 99 vem travando uma queda de braço com o prefeito Ricardo Nunes (MDB) para emplacar o transporte de passageiros por moto na capital paulista.

Em posicionamentos distribuídos à imprensa, a companhia tem argumentado que, apesar de proibido na maior cidade do país, o serviço é permitido por legislação federal e por uma série de decisões da Justiça, inclusive do STF (Supremo Tribunal Federal). Por essa razão, continua oferecendo corridas a clientes na periferia do município.

Em resposta, a Prefeitura vem apreendendo motos a serviço da 99, justificando a medida com dados que mostram mais de uma morte por dia em acidentes de trânsito com veículos de duas rodas, ao longo de 2024.

A solução para a guerra entre a empresa e a Prefeitura de São Paulo depende da resposta a uma pergunta nada trivial: afinal, o 99Moto é táxi ou aplicativo?

À primeira vista, a questão pode parecer irrelevante para os usuários. No entanto, ela importa não só para uma eventual regulamentação, mas para a própria existência do serviço. Além disso, diz muito sobre as estratégias usadas por plataformas digitais para desafiar o poder público e impor na marra seus interesses.

Táxi ou aplicativo: por que isso importa?

A empresa diz que o 99Moto está amparado pela lei federal 12.587/2012, que criou a Política Nacional de Mobilidade Urbana.

Entretanto, um olhar cuidadoso sobre o texto revela uma mistura do conceito de "transporte público individual" (nome oficial dos táxis) com o de "transporte remunerado privado individual de passageiros" (denominação dos aplicativos).

Por sinal, a segunda nomenclatura foi incorporada à lei somente em 2018, por um motivo óbvio: quando a Política Nacional de Mobilidade Urbana foi sancionada, seis anos antes, não havia aplicativos em operação no Brasil.

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Mas voltemos ao texto da lei. O artigo 11-B diz claramente que o serviço de transporte de passageiros por aplicativos só pode ser realizado por condutores com carteira de habilitação da categoria B, restrita a carros. A categoria A, das motos, não é mencionada.

Já o artigo 12 afirma que "os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros" — ou seja, os táxis — "deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal", e que as prefeituras têm como uma de suas missões a "fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas".

Resumo da ópera: tal como está redigida, a Política Nacional de Mobilidade Urbana autoriza apenas aplicativos de transporte de passageiros por meio de carros. No caso dos serviços de táxi, não faz distinção entre motos e automóveis. Porém, manda que as Prefeituras regulamentem e determinem, inclusive, o preço das corridas.

A diferença entre táxi e aplicativo é bem fácil de entender. Quando um paulistano pede um carro pela 99 ou pela Uber, por exemplo, ele sabe de antemão quanto vai pagar — o valor da viagem é estipulado pela plataforma. Porém, quando pega um táxi na rua, o preço da viagem é calculado pelo taxímetro, com tarifas reguladas pela Prefeitura.

Além disso, quem deseja trabalhar como taxista depende de permissão concedida pelas autoridades municipais e precisa cumprir uma série de requisitos que não são exigidos dos motoristas de aplicativo.

STF diz que leis municipais não podem contrariar legislação federal

A 99 também afirma que o STF já considerou inconstitucionais as leis municipais que não autorizam o transporte de passageiros por aplicativo.

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De fato, em maio de 2019, o plenário do Supremo chegou a um entendimento de "repercussão geral" sobre o assunto, afirmando que eventuais proibições violariam os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência.

Entretanto, a tese aprovada pelos ministros também diz que "os municípios e o Distrito Federal não podem contrariar os parâmetros fixados pelo legislador federal". Como dito anteriormente, a lei federal que criou a Política Nacional de Mobilidade Urbana só faz menção em seu artigo 11-B a aplicativos de transporte de passageiros por carros. Ou seja, não há previsão na lei federal para aplicativos de moto.

A 99 também afirma que o STF já se manifestou contra leis municipais que restringem o mototáxi. Em outubro de 2020, o Supremo realmente decidiu que as prefeituras não podem criar limitações ao exercício profissional para quem preenche os requisitos da legislação federal.

Em tese, portanto, os ministros liberaram mototáxi em todo o país. Mas é importante deixar claro, mais uma vez, que a própria legislação federal aponta as diferenças entre os serviços de táxi e de aplicativo.

Aplicativos sempre se definiram como 'meros intermediadores'

Voltamos, então, ao xis da questão: o 99Moto é táxi ou aplicativo?

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Desde sempre, 99, Uber e companhia limitada se vendem como meras plataformas digitais de intermediação entre clientes e prestadores de serviço. Essa narrativa tem por objetivo evitar regulamentações do poder público, como as exigidas dos taxistas de carro.

Só que agora, em plena batalha para convencer a opinião pública, a 99 parece estar usando a legislação do mototáxi como cavalo de troia para tentar espalhar o seu serviço de transporte de passageiros por moto em São Paulo.

Das duas, uma: se sair do armário e se assumir como mototáxi, a empresa precisará se sujeitar às regras típicas desse tipo de serviço, que garantem à Prefeitura a definição do preço das corridas. Se insistir na figura de aplicativo, vai precisar mudar a legislação federal para seguir em frente. Os próximos capítulos serão interessantes.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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