Após morte em atropelamento de ônibus, Aena proíbe marcha à ré em Congonhas
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Depois de um trabalhador morrer atropelado por um ônibus de transporte de passageiros na última quinta-feira em Congonhas, na capital paulista, a Aena — concessionária espanhola responsável pela gestão do aeroporto — proibiu os veículos que transitam pelas vias de serviço e pelas áreas de desembarque remoto de darem marcha à ré.
A vítima do acidente da semana passada atuava como "homem guia", auxiliando nas balizas dos ônibus, e foi atingido quando um motorista fazia justamente uma manobra para trás.
Divulgado no dia seguinte ao acidente, o "aviso operacional" da Aena é criticado por autoridades e pelo Sindicato Nacional dos Aeroportuários (Sina).
"A Aena não está preocupada com segurança", critica Antonio Macedo, membro do conselho do Sina. "Gasta-se R$ 1,5 milhão num ônibus e não se coloca um sistema de sensor de ré, com um monitor na tela na frente do motorista, para ele poder enxergar", acrescenta.
Na avaliação de Tatiana Campelo, procuradora do MPT (Ministério Público do Trabalho), a determinação da empresa está em desacordo com o marco legal do país, que prevê medidas de caráter coletivo para minimização dos riscos no terminal aéreo — o mais movimentado do país.
"Não se implementam medidas estruturais eficazes para garantir segurança e se atribui individualmente ao trabalhador a responsabilidade de evitar novos acidentes", analisa a procuradora. Segundo ela, o aviso operacional abre brecha para que os próprios trabalhadores sejam culpados por eventuais "atos inseguros" no pátio de aeronaves.
Aena não segue recomendação de usar fingers e vans para deslocamento de trabalhadores
O aeroporto de Congonhas está na mira das autoridades desde o ano passado. Em abril, faixas de pedestres pintadas no chão ao longo do pátio de aeronaves foram interditadas por auditores fiscais do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) devido a riscos de atropelamento por tratores, ônibus e caminhões. Não há calçadas ou guarda-corpo para isolar a área por onde caminham os trabalhadores.
No ano anterior, quando o aeroporto ainda era administrado pela estatal Infraero, uma faxineira terceirizada morreu após ser atingida por um caminhão de combustível, enquanto andava na faixa de pedestre. Os fiscais avaliaram que, mesmo após a Aena assumir a concessão, o perigo persistia. Por essa razão, determinaram a interdição das faixas.
Apesar de as áreas onde ocorreram os dois acidentes com vítimas fatais não serem exatamente as mesmas, os fatores de risco são bastante semelhantes, afirma Renato Bignami, auditor fiscal do MTE que participou da inspeção do ano passado.
"Existe uma quantidade enorme de veículos circulando permanentemente, e existe uma quantidade igualmente grande de trabalhadores circulando no mesmo ambiente", diz Bignami. "Não é proibindo a marcha à ré que isso se resolve. Tanto não é assim que, na morte da trabalhadora em 2023, o caminhão estava se deslocando para frente", complementa.
Ao interditar as faixas de pedestres no pátio de aeronaves, os fiscais do Ministério do Trabalho recomendaram à concessionária que os trabalhadores se deslocassem pelos fingers — as plataformas usadas no embarque de passageiros. Quando o uso dos fingers não fosse possível, o transporte deveria ser feito por vans, para evitar atropelamentos.
A concessionária, no entanto, não acatou as orientações e optou por tentar reverter na Justiça a interdição. Na primeira instância, o pedido da Aena foi negado. Em 30 de janeiro, no entanto, uma liminar de segundo grau do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2) liberou novamente o uso das faixas, a pedido da concessionária.
A AGU (Advocacia Geral da União), que representa o governo federal, já recorreu da decisão do TRT-2 com o objetivo de restabelecer a interdição das faixas, até que a Aena adote medidas capazes de garantir a segurança dos trabalhadores no pátio de aeronaves.
Após o acidente da semana passada, a AGU informou, por meio de nota à imprensa, que já "se manifestou nos autos do processo comunicando o fato e requerendo a urgência no julgamento do recurso".
O MPT também entrou com um pedido de reconsideração da liminar do TRT-2. "O que a gente busca é que a Aena faça o transporte desses trabalhadores por veículos. Em nenhum momento, nos autos, eles comprovaram que haveria qualquer prejuízo ou atraso [com a adoção dessa medida]", afirma a procuradora Tatiana Campelo.
O que diz a Aena
Em nota envidada à coluna, a assessoria de imprensa da concessionária afirma que "o aviso operacional emitido na última sexta-feira é uma medida protetiva adicional enquanto outras possíveis ações são analisadas". Segundo o texto, a Aena tem acompanhado as investigações e prestado a assistência necessária aos trabalhos das autoridades competentes.
A nota diz ainda que o acidente ocorrido na quinta-feira não guarda qualquer relação com as ações movidas pelo MTE: "O fato ocorreu na plataforma de estacionamento de ônibus próxima à área de embarque remoto, local distinto do pátio de aeronaves".