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Agenda política de Arthur Lira é contrária aos interesses dos brasileiros

12/11/2021 04h00

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Nos últimos meses, a Câmara dos Deputados tem levado à frente uma agenda política que em nada ajuda a solucionar os graves problemas pelos quais o país tem passado. Com raras e honrosas exceções, uma boa parte dos nossos congressistas está mais preocupada com as eleições do próximo ano.

Neste ambiente, seria fundamental que tivéssemos lideranças nas presidências das duas casas legislativas que fossem capazes de "baixar a bola" e mostrar a real gravidade das crises econômica, social e até moral pelas quais estamos passando. Mais do que isso, que propusessem e conduzissem uma agenda política que ajudasse a recuperar a credibilidade do país perante investidores.

Mas infelizmente não é isso que temos presenciado, principalmente na Câmara dos Deputados. A agenda do presidente Arthur Lira tem sido diametralmente oposta aos interesses da grande maioria da população brasileira.

E isso começa por constantes tentativas de enfraquecer os instrumentos de combate à corrupção e improbidade administrativa, quando o esperado seria reforçá-los. Nesse sentido, caberia questionar o presidente Lira, por exemplo, o porquê de a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê prisão após condenação em 2ª instância estar até hoje parada na Câmara dos Deputados.

Há que se destacar que existem vários estudos que mostram como a corrupção afeta negativamente o nível de investimento e o crescimento econômico dos países (ver, por exemplo, Why Worry About Corruption?). E no caso dos brasileiros, a situação é ainda mais grave e nos deixa distantes do seleto grupo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e de todos os benefícios que poderíamos colher com isso.

Mas esta é só uma parte do problema. Com uma característica pouco democrática, Lira tem se mostrado, segundo seus próprios pares, como alguém que não respeita regras e que atropela o regimento interno da Câmara dos Deputados. E essa atitude pode acabar levando a questionamentos no Judiciário sobre questões relevantes aprovadas nessa casa legislativa, ou seja, amplia a insegurança jurídica no país.

Mesmo pautas que supostamente seriam de interesse de toda a sociedade são conduzidas de maneira a atender interesses de grupos específicos ou são construídas de maneiras a gerar mais problemas ao invés de verdadeiras soluções.

No primeiro grupo encaixa-se a pseudodesestatização da Eletrobras, que foi construída para atender interesses localizados, inclusive na região de origem do presidente da Câmara e, da maneira aprovada, criará mais distorções no mercado.

Já no segundo grupo, pode-se citar a proposta de reforma do imposto de renda, construída com forte característica corporativista dentro da Receita Federal, e cujo trâmite na Câmara dos Deputados manteve todas as distorções que inibem investimentos no país.

E, nesse caso, o mais absurdo é que Lira tem criticado o Senado por não levar à frente um texto ruim e usado isso como argumento para aprovar a famigerada Proposta de Emenda Constitucional (PEC) dos Precatórios. Aliás, essa talvez seja a pior de todas as propostas conduzidas por Lira, exatamente por atropelar qualquer resquício de compromisso com a responsabilidade fiscal.

Ao acabar com o teto dos gastos e dar um verdadeiro calote sobre algo que já é um calote por sua própria natureza, a Câmara reforça a percepção de que o país não é confiável para receber investimentos, que não existem regras estáveis e que a qualquer momento o Estado poderá dar um novo calote, inclusive na dívida pública, caso a irresponsabilidade fiscal continue.

E por trás disso não está nenhum interesse público legítimo, como afirma Lira sobre a necessidade de obter recursos para o tal do "Auxilio Brasil"; mesmo porque os recursos para tanto poderiam ser obtidos de outra maneira, conforme já expus em texto recente.

Na realidade, o que esse episódio tem mostrado é um populismo irresponsável do Congresso e um apetite incontrolável por mais recursos públicos, visando claramente as próximas eleições. E isso da maneira menos republicana possível, por meio do que se denominou de "orçamento secreto" e liberação de "emendas do relator".

Não por outra razão, a decisão recente da Ministra Rosa Weber, que foi seguida por vários de seus pares, aponta nitidamente que a forma como essas emendas têm sido utilizadas fere os princípios da impessoalidade e transparência que devem reger a atuação na administração pública, além de distorcer a própria democracia.

Fato é que o "conjunto da obra" que está sendo construído pela Câmara dos Deputados na gestão de Lira criará fortes problemas econômicos e sociais no futuro, além de afetar ainda mais a já combalida credibilidade do nosso Congresso; o que é péssimo para a nossa democracia e, consequentemente, para o país.