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Economia do Pantanal: por que a região queima?

Yolanda Fordelone

24/09/2020 16h59

Estamos caminhando para o fim de setembro com a triste notícia de que o Pantanal já registra 6.048 focos de incêndio na região, um recorde para o mês segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A Polícia Federal ainda investiga as causas dos incêndios, mas estimativas já dão conta de uma destruição de cerca de 15% do bioma local.

Eu sou Yolanda Fordelone, economista do Econoweek, e nesta coluna explico seis pontos que envolvem a economia da região. A live do vídeo acima se aprofunda em temas da economia e acontece de segunda a quinta-feira, às 18h20.

1. Números da produção de gado e Pantanal

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possuía 213,5 milhões de cabeças de gado em 2018, sendo as regiões com maior rebanho: Mato Grosso (30 milhões), Goiás (22,6 milhões), Minas Gerais (21,8 milhões), Mato Grosso do Sul (20,9 milhões) e Pará (20,6 milhões).

O Pantanal é a maior região de planície alagada contínua do mundo, com cerca de 250 mil quilômetros quadrados de extensão, sendo 150 mil quilômetros quadros no Brasil. No território brasileiro, 65% do Pantanal está no Mato Grosso do Sul e 35% no Mato Grosso.

2. Por que produzir na região do Pantanal é mais barato

A região do Pantanal reúne três características que diminuem o custo de criação de gado no local. A primeira é a abundância de água. Como já dito é a maior planície alagada do mundo. Assim, o custo para alimentar os bois e cultivo das pastagens já diminui.

Além disso, a região possui duas fases: a de cheia, que começa em outubro e vai até abril, e a de seca, entre maio e setembro, sendo mais forte em agosto em setembro. Na cheia, o principal rio, o Paraguai, inunda as diversas terras e com isso faz uma espécie de limpeza do pasto. A água, levemente salgada, ajuda o pasto a se renovar para o período de seca.

Nessa época, os pantaneiros da região historicamente fazem o deslocamento do gado através dos rios para áreas não alagadas. Quando vem a seca, o gado retorna ao pasto. Apesar do custo do transporte, os pecuaristas da região gastam menos por exemplo com o cultivo de pasto e adubo. O local cria pastos naturais em seu ciclo.

A terceira característica é o solo fértil. O pH do solo do Pantanal é elevado e faz com que se use menos adubo e favorece a pastagem nativa, que pode durar cerca de 40 anos. Produzir gado no Pantanal reduz os custos em até 20%.

3. Por que provocar queimadas?

A Polícia Federal investiga se os focos de incêndio na região foram intencionalmente provocados. O pasto nativo do Pantanal não tem dado conta do aumento da atividade de criação de bois. Com isso, para expandir a área de criação, os donos de fazendas podem ter ateado fogo nos entornos, atingindo assim parte da mata nativa do Pantanal.

O isolamento da região, que possui poucas estradas, colabora para a baixa fiscalização. Muitas fazendas só são acessíveis por rios ou helicópteros. Sem fiscalização, os produtores podem ter expandido a área de cultivo.

4. Desmatamento na Amazônia e o aumento da seca

Os pecuaristas dizem que o aumento dos incêndios se deve à seca e de fato ela tem sido mais intensa e duradoura. Segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), a seca é a mais intensa nos últimos 60 anos.

O aumento do desmatamento na Amazônia também impacta. O primeiro semestre registrou 3.069,57 quilômetros quadrados de áreas sob alerta de desmatamento na Amazônia. Para o período, foi o maior número já registrado.

O desmatamento provoca mais secas em outros locais porque diminui o fenômeno de "rios voadores", a corrente de umidade que transporta água para outras regiões mais ao sul e sudeste.

Vale lembrar os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): em 18 anos, a Amazônia perdeu em florestas o equivalente a seis vezes a área estado do Rio de Janeiro ou mais do que a área do Reino Unido. Metade das mudanças (50,2%) foi para transformar áreas em pastagem, segundo ainda o IBGE.

5. O impacto das exportações

O Brasil tem exportado mais alimentos no geral, incluindo carne bovina. Em agosto, o volume embarcado alcançou 191,1 mil toneladas de carne in natura e processada, sendo a China a maior compradora (108 mil toneladas). Os chineses aumentaram as compras em quase 66%. Os dados são da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo).

O real desvalorizado frente ao dólar é um dos motivos e a diminuição da produção, devido a parada de algumas fábricas, deixou o produto ainda mais escasso no mercado, elevando seu preço. O faturamento cresceu 23% (um total de 5,4 bilhões de dólares).

O aumento da demanda ano após ano pode ser um incentivo para que os pecuaristas produzam mais gados.

6. Como as empresas driblam acordos de rastreamento do gado

Até existem acordos que tentam rastrear e diminuir a compra de gado criado em pastos ilegais, caso da "TAC da Carne" assinada em 2009 onde frigoríficos se comprometeram a não negociar com fazendas que provocaram desmatamento ou atuadas por trabalho escravo na região da Amazônia. Empresas, porém, acharam pelo menos três jeitos de burlar este rastreamento.

O primeiro é que as irregularidades podem ocorrer em fornecedores indiretos. O pecuarista que desmata e queima para criar gado revende a cabeça para uma fazenda responsável por outros processos, como o de engorda. É esta a fazenda já regularizada a fornecer o gado ao frigorífico.

O segundo jeito é que o dono da terra modifique os limites da propriedade deixando de fora a área ilegal desmatada. É possível ainda falsificar a documentação do gado de maneira a alterar o local de criação deste, indicando que ele veio de um pasto regular.

O desvio do gado é tamanho que chegou o Ministério Público Federal a afirmar no fim do ano passado que "Nenhuma empresa hoje que compra da Amazônia pode dizer que não tem gado vindo de desmatamento em sua atividade produtiva. Nenhuma empresa frigorífica e nenhum supermercado também".

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