Graciliano Rocha

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Reportagem

Em 62 minutos, Eletrobras perdeu R$ 146 mi com decisões judiciais a jato

Uma série de decisões judiciais a toque de caixa em Manaus e em uma comarca do interior do Amazonas permitiu transferências suspeitas de R$ 146 milhões das contas da Eletrobras. O dinheiro, distribuído para ao menos nove pessoas e empresas que não integravam o processo original, foi transferido fora do horário de expediente bancário.

A disputa tem origem em títulos emitidos pela Eletrobras nos anos 1980 referentes ao empréstimo compulsório sobre o consumo de energia elétrica. O caso envolve uma ação de execução extrajudicial movida por Bruno Eduardo Thome de Souza, em 2021, para cobrar um título referente ao montante pago durante a vigência do regime de empréstimo compulsório.

A Eletrobras afirma que o entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça) é de que tais títulos foram alcançados pela decadência; isto é, perda do direito de cobrá-los por seus portadores em razão da passagem do tempo.

Mesmo assim, a ação movida por Souza avançou no Judiciário do Amazonas. Na argumentação da ex-estatal, a ação estava repleta de vícios, incluindo a incompetência do juízo e a nulidade de citação da empresa.

Em 27 de janeiro de 2025, o juiz da vara única de Presidente Figueiredo (126 km de Manaus), Jean Carlos Pimentel dos Santos, determinou a indisponibilidade de R$ 148,8 milhões das contas da Eletrobras. A companhia recorreu e obteve, em 31 de janeiro, uma decisão do Tribunal de Justiça do Amazonas suspendendo o levantamento dos valores.

No entanto, no dia 10 de fevereiro, uma reviravolta ocorreu.

Cronômetro

Às 15h03 da segunda-feira (10), o desembargador relator do caso no TJ-AM revogou a decisão anterior que favorecia a Eletrobras, permitindo o levantamento do montante penhorado.

Foi o início de uma série de movimentações muito rápidas.

Treze minutos depois, às 15h16, o Bruno Souza apresentou uma petição na vara de Presidente Figueiredo informando que cedeu gratuitamente a maior parte do valor a nove outras pessoas físicas e jurídicas, que não integravam o processo originalmente, solicitando a liberação imediata do dinheiro.

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Menos de 40 minutos depois, às 15h54, o juiz Jean Carlos Pimentel dos Santos homologou a cessão e deferiu o levantamento, sem exigir qualquer caução ou oitiva da Eletrobras.

Onze minutos depois, às 16h05, dez alvarás foram expedidos, distribuindo os valores entre os novos beneficiários.

Entre a decisão do desembargador em Manaus e a expedição dos alvarás, que têm efeito jurídico de ordem judicial para os bancos processarem as transferências, passaram-se 62 minutos.

Uma agência bancária local processou os pagamentos e efetivou as transferências, entre 17h58 e 22h03 da própria segunda-feira.

Eletrobras conseguiu maior parte do dinheiro de volta

No dia seguinte, terça (11), nova reviravolta: a Eletrobras obteve uma decisão do STJ suspendendo os efeitos da determinação de primeiro grau e determinando a devolução dos valores levantados. A empresa foi representada pelo escritório de advogados Simonetti e Paiva.

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O ministro Benedito Gonçalves ordenou, em liminar, que os bancos estornassem as quantias já transferidas, bloqueassem ativos e impedissem novos levantamentos. A ação original foi sobrestada; isto é

A Caixa Econômica Federal informou que, dos R$ 146,5 milhões levantados, conseguiu recuperar R$ 142,5 milhões. Outros R$ 2 milhões estão em fase de recuperação interna e R$ 2 milhões que foram enviados ao Bradesco estão sendo rastreados.

Paralelamente, o ministro Mauro Campbell Marques, corregedor nacional de Justiça, acionou a Corregedoria-Geral de Justiça do Amazonas para investigação.

O UOL telefonou e enviou mensagens para a Vara de Presidente Figueiredo para encaminhar perguntas ao juiz sobre a liberação do dinheiro e sobre a decisão do corregedor-geral de Justiça, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem.

A corregedoria do Tribunal de Justiça do Amazonas também foi procurada e não se pronunciou. O UOL não conseguiu contato com Bruno Eduardo Thome de Souza.

Reportagem

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