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João Branco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por que achamos errado desistir?

Colunista do UOL

11/08/2021 04h00

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"Desistir é para os fracos" - quem nunca ouviu essa pérola? Os motivadores de plantão pegam no pé de quem decide abandonar uma rota - isso é frequentemente visto como um sinal de fraqueza.

"Os vencedores nunca desistiram", "você tem que aguentar, senão será um perdedor". "Se estiver esgotado, descanse, mas nunca desista". Frases como essas invadem as correntes das redes sociais colocando uma forte pressão para aumentarmos a nossa resiliência. Mas será mesmo que esse incentivo faz bem para a gente?

Essas frases pegam forte na meritocracia, no espírito de competição e no ego.

Mas, aí, vemos uma das maiores ginastas da história desistir de disputar a prova mais decisiva da sua categoria nos Jogos Olímpicos. A favorita ao ouro, que treinou exaustivamente para chegar a esse momento, decidiu abandonar o percurso bem na retinha final. Tudo para proteger a sua saúde mental. E agora, ela é uma perdedora?

Os fiscais da vida alheia que me perdoem, mas eu não concordo com a "ditadura do jamais desista". É verdade que os vencedores nunca desistiram. Mas também precisamos lembrar que as pessoas que tiveram um "burnout" por estresse também nunca desistiram.

Existe um limite tênue entre persistência e teimosia. Há momentos em que não desistir significa insistir no erro. Não parar e revisar o curso implica em martelar numa pedra dura que nunca será furada.

Cada um sabe até onde aguenta ir. Os seus limites. E o que vale a pena. Você trocaria a sua paz de espírito por uma medalha? Ou aceitaria perder todos os momentos felizes da infância dos seus filhos em troca de uma possível promoção que nem está garantida?

Nas últimas vezes que fui ao hospital escutei médicos perguntando aos pacientes: "de zero a dez, qual é a intensidade da sua dor?" Essa pergunta mostra que cada pessoa é diferente. Talvez eu classifique como nove uma dor que para você está apenas no nível dois. Cada um tem uma força, uma resistência. A medicina não usa a mesma régua para medir a dor de todos. A régua é nossa. É o indivíduo que define a escala.

Somos nós que definimos o nosso próprio limite.

Sim, vamos colocá-lo no máximo em que conseguimos chegar. Mas, por favor, não passe desse ponto. Para o seu bem, quando isso acontecer, desista, mude, recomece, repense. Você não será um fracassado, perdedor ou desiludido. E sim, uma pessoa que percebeu os sinais de que aquela não era a melhor escolha para você.

Isso inclui saber a hora de parar, de se aposentar, de se retirar. De cancelar a jogada, de rever as suas ideias ou até de jogar a toalha.

No fundo, estou te incentivando fortemente a redefinir o que significar "vencer". E talvez isso também trará um novo significado para a palavra desistir. Quando damos o nosso melhor e, ainda assim isso não é suficiente, a desistência tem mais a ver com autoconhecimento do que com fraqueza.

O problema não é desistir. O problema é nunca tentar. É "largar os betes" fácil demais. É não fazer todos o possível pelas coisas importantes.

Quando você desiste de um projeto, não está desistindo da vida, dos seus valores da sua família, do amor da sua vida ou da sua fé. Quando você abandona um plano, não está abrindo mão de ser feliz, de ter significado na vida ou de se realizar como pessoa. Você apenas vai mudar a forma como vai tentar fazer isso. Você simplesmente abandonou uma das milhões de possibilidades que a vida lhe deu, para começar outra.

Que tal desistir de algum projeto problemático hoje mesmo?

chuteira - Felipe Tomazelli - Felipe Tomazelli
Imagem: Felipe Tomazelli