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José Paulo Kupfer

Big Bang de Guedes propõe que economia engorde fazendo dieta para emagrecer

25/08/2020 19h12

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No princípio era o nada e aí veio o Big Bang. Não, não se está falando da teoria da criação do universo. O Big Bang em questão é o pacote de medidas econômicas que o ministro da Economia, Paulo Guedes, segundo descrições que pipocam pelos jornais e sites de notícias, estaria terminando de preparar.

O Big Bang Day, como foi apelidado o dia do anúncio solene, seria nesta terça-feira (25). Guedes anunciaria a recriação da economia brasileira, agora numa geleia de suas concepções ultraliberais com a descoberta pelo presidente Bolsonaro das delícias políticas e eleitorais proporcionadas por gastos públicos.

No pacotão que Guedes costura, há promessas de gastar mais, nas áreas sociais e em obras públicas, alinhadas com também promessas de cortar despesas, rever isenções tributárias e desonerações. Tudo sem pressionar o teto de gastos públicos e não esquecendo a obsessão pela redução dos encargos trabalhistas. Se errar na mão, Guedes pode aviar um tratamento de engorda da economia, com prescrição de dieta para emagrecer.

Seguindo, no entanto, uma espécie de padrão Guedes de comunicação, o anúncio foi adiado. A razão divulgada para o adiamento teria sido a de que Bolsonaro achou pouco os R$ 270 mensais, previstos por Guedes para o Renda Brasil, o programa com mais beneficiários e benefício mais alto, que pretende substituir o Bolsa Família.

É mais provável que ainda estejam sobrando muitas pontas soltas a serem devidamente amarradas nessa recriação do mundo econômico ambicionada por Guedes. Mas o Renda Brasil, agora uma prioridade política de Bolsonaro, não parece correr risco de ficar na geladeira.

Se adicionar seis milhões de famílias às 14 milhões do atual Bolsa Família, completando 21 milhões de famílias, e mais do que dobrando o valor do benefício de R$ 190 para R$ 400, seu custo ficaria perto de R$ 85 bilhões (o equivalente a 1,2% do PIB), por ano. Representa um acréscimo próximo a R$ 52 bilhões nos gastos atuais, de R$ 33 bilhões por ano, com o Bolsa Família.

Nada que não possa ser compensado com algum corte em outras despesas mal desenhadas ou menos focadas nas populações mais necessitadas. Mas fica longe da cobertura assegurada pelo auxílio emergencial. O auxílio emergencial está transferindo, em média, R$ 687 para 66 milhões de pessoas, e seu custo mensal chega a R$ 45 bilhões. Equivale em um mês ao que o Bolsa Família gasta em um ano. Mantido como está, o auxílio exigiria transferências anuais de R$ 540 bilhões, quase 8% do PIB. Uma inviabilidade.

Enquanto Guedes tenta resolver a equação que deve compatibilizar mais gastos públicos de um lado com cortes, de outro, Bolsonaro, para não perder a viagem dos lançamentos, chamou ao Planalto o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, um dos colegas incluídos por Guedes no grupo dos "fura-teto", para anunciar o programa "Casa Verde e Amarela".

Trata-se de uma recauchutagem do "Minha Casa, Minha Vida", criado em 2009, no governo Lula. O programa prevê a construção de 350 mil unidades adicionais, com a criação, segundo estimativas do próprio governo, de dois milhões de empregos diretos e indiretos, com pequena redução de juros nos financiamentos e maiores incentivos para as regiões Norte e Nordeste. O público-alvo são famílias com renda até R$ 7 mil mensais.

Se deslanchar, o "Casa Verde e Amarela" terá condições de contribuir para animar o setor da construção civil, impulsionando uma importante cadeia de produção, caracterizada pela utilização intensiva de mão de obra menos qualificada. Com o programa dando certo, Bolsonaro terá a oportunidade de imprimir uma marca social a seu governo, ao mesmo tempo em que ajudaria a recuperar a economia.