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Ao dinamitar instituições, Bolsonaro contrata mais inflação e baixo PIB
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Os discursos do presidente Jair Bolsonaro, em Brasília e em São Paulo, por ocasião do 7 de setembro, traduzidos para o "economês", tiveram um caráter pró-cíclico. Significa que ajudarão a contrair ainda mais uma atividade econômica que já revelava claras tendências de recuo.
Num ambiente já contaminado, com perspectivas de racionamento de energia e incertezas em relação à pandemia, o cenário de baixo crescimento com inflação em alta pode ser o dominante no ano eleitoral de 2022. Um período de estagflação, com desemprego, subutilização de mão de obra e informalidade em níveis elevados, passou a ser o mais provável.
Bolsonaro avançou na ponte constitucional que vem ameaçando dinamitar com crescente intensidade e frequência. Muitos acreditam que, nesta terça-feira (7), o presidente atravessou o rio das instituições democráticas e implodiu o caminho de volta. Se for isso mesmo, não há crescimento econômico - e tudo o que ele representa - que resista a esse tipo de choque, em regimes democráticos.
Em um ambiente institucional já bastante inflamável, o presidente jogou gasolina nas relações com o Poder Judiciário, mas as fagulhas produzidas certamente promoverão turbulências também no Congresso. É óbvia a possibilidade de que as pautas econômicas derrapem no terreno minado criado pela manifestação agressiva e autoritária de Bolsonaro.
Diante desse quadro, a tendência é de que sobrevenham grandes dificuldades na tramitação e mesmo que se dê uma paralisia nos temas econômicos. É quase inevitável, nessas circunstâncias, a instalação de um ciclo desfavorável na economia.
Aumento na percepção dos riscos fiscais, sem perspectivas de investimentos, leva a altas nas cotações do dólar e daí para a inflação. Mais inflação corrói o poder de compra da população, já abalado pelo desemprego, constrangendo o consumo. A demanda restrita seria ainda mais afetada pela ação do Banco Central, subindo os juros básicos para conter a alta de preços
O caso dos precatórios é suficiente para que se entenda o problema criado por Bolsonaro. Sem uma solução legal para o pagamento dos R$ 90 bilhões de precatórios - dívidas definitivas com vencimento em 2022 - acumulados pelo governo, não haverá espaço fiscal para o Auxílio Brasil, o novo Bolsa Família que Bolsonaro gostaria de implantar no ano eleitoral. Nem haveria também como bancar um mínimo de investimentos públicos e até mesmo uma parte dos gastos correntes dos ministérios.
A proposta orçamentária enviada pelo governo ao Congresso, em fins de agosto, expõe esses constrangimentos e restrições. O envio foi protocolar, cumprindo o calendário legal, mas ninguém acreditou que fosse possível cumprir aquele Orçamento fictício. Se antes deste 7 de Setembro a expectativa já era de negociações difíceis no Legislativo, imagine-se o que deverá vir agora pela frente.
Os mercados de ativos brasileiros refletem essa situação de estresse político, nesta quarta-feira (8). O Ibovespa, principal índice da Bolsa brasileira, recuava perto de 4%, no fim da tarde, enquanto a cotação do dólar avançava quase 3%, acima de R$ 5,30.
Parte desses resultados se deve a influências negativas vindas do mercado internacional. Bolsas caem mundo afora e o dólar se recupera nos pregões globais. Mas o movimento da curva de juros futuros não deixava dúvida de onde vinha a pressão contrária principal: subia em todos os ramos - no ramo curto e no ramo longo -, apontando alta acima de 1 ponto percentual para a taxa básica (taxa Selic), na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária).
As novas pressões baixistas para a economia, diretamente promovidas por Bolsonaro, com suas reiteradas ameaças de rompimento institucional, encontram as expectativas para os principais indicadores da economia já em retração. No mais recente Boletim Focus, divulgado nesta segunda-feira (6), com informações até a sexta-feira (3), esses números só mostram recuos.
Para 2021, as previsões dos analistas do mercado financeiro, economistas de bancos e consultores, apontam alta para a inflação (de 7,27%, na semana anterior, para 7,58%, nesta semana. O PIB (Produto Interno Bruto), que cresceria 5,22%, na pesquisa anterior, terá expansão de 5,15%, na rodada desta semana. A taxa de câmbio e a taxa básica de juros também aparecem com tendência de alta.
Não há maiores riscos de que a retração da atividade econômica ainda neste ano atropele as previsões atuais. A herança estatística dos trimestres anteriores, a partir do fim de 2020, indica que o PIB crescerá no mínimo 4,9% em 2021 mesmo sem nenhuma expansão nos dois trimestres restantes do ano. A projeção de momento, no Focus, mostra que algum pequeno crescimento deve ocorrer, neste segundo semestre.
Muito mais preocupante é o cenário para 2022. No Focus, que é um filme em câmera lenta, as projeções para a atividade econômica estão em queda contínua e regular há semanas. No relatório desta semana, a variação do PIB caiu, pela primeira, abaixo de 2%. Pelas projeções antecipadas por analistas de conjuntura confiáveis, as perspectivas de crescimento, no ano que vem, já estão abaixo de 1,5%.
Ao mesmo tempo, as previsões para a alta da inflação, em 2022, estão em alta. Depois de algum tempo estacionadas na altura de 3,5%, o centro definido no sistema de metas de inflação, as previsões começaram a descolar para cima, já estando agora em 3,98%.
Esses números, anteriores ao dos pronunciamentos de 7 de Setembro, tendem a se deteriorar com rapidez daqui para a frente. Colaborará para isso a desconfiança que o discurso disruptivo de Bolsonaro inoculou no mercado financeiro.
Com o aumento do tom nos ataques às instituições, Bolsonaro acelerou o desembarque de novas levas de apoiadores de primeira hora no setor financeiro. Parte desses apoiadores já tinha pulado fora do barco - ver o caso dos bancos representados pela Febraban (Federação Brasileira de Bancos) -, mas outros grupos ainda resistiam ao lado do governo, na ilusão de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, conseguiria entregar reformas econômicas de cunho mais liberal. O encolhimento da base de apoio na sociedade é mais um elemento de constrangimento para a economia.
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