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José Paulo Kupfer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Em ata, BC insinua que críticas de Lula são tiro no pé

08/02/2023 04h00

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São dois os pontos de destaque na ata da reunião de fevereiro do Copom (Comitê de Política Monetária), divulgada nesta terça-feira (7).

Num deles, o Banco Central detalha as razões para sua "especial preocupação" com "a deterioração das expectativas de inflação a prazos mais longos". No outro, acena com uma bandeira branca em meio ao duelo com Lula e as críticas do presidente aos juros altos.

Que mensagem o BC quis passar?

Só faltou dizer explicitamente que essa deterioração das expectativas inflacionários decorre das críticas de Lula à atuação do BC e de seu presidente, Roberto Campos Neto. Parece clara a mensagem de que, com suas críticas aos juros altos e à independência do BC, Lula estaria colaborando para a piora das expectativas de inflação e, portanto, dando um tiro no pé.

São três os pontos destacados na ata para a deterioração das expectativas inflacionárias:

  • Uma possível leniência do Banco Central com as metas estipuladas pelo CMN (Conselho Monetário Nacional);
  • Uma política fiscal expansionista, que pressione a demanda agregada ao longo do horizonte de projeções;
  • A possibilidade de alteração das metas de inflação ora definidas.

Essas explicações, pesadas e misturadas, permitem concluir que o BC está afirmando que Lula esbravejar contra as decisões do Copom, insinuar que a instituição não deveria ser independente e reclamar de metas de inflação muito baixas levam a elevações nas projeções de inflação, dificultando cortes nas taxas de juros.

A ata também reserva espaço para dar uma aula de como o BC atua, na missão de trazer a inflação para a meta, valendo-se da ferramenta de gestão da taxa básica de juros. Não parece ser uma tentativa de justificar por que mantém os juros altos, mas de ensinar (a Lula?) como é o seu funcionamento.

No documento, o BC reafirma que seu objetivo é conduzir a política monetária para atingir as metas estabelecidas, devendo ser ainda mais firme nesse objetivo quando percebe "desancoragem" dos agentes de mercado em relação às metas. Ao ser mais firme na perseguição da meta, mantendo juros elevados, o BC acredita que reduz a desancorarem e o "custo da desinflação".

Além disso, para o BC, a política monetária (que promove restrições ou não do volume de dinheiro em circulação) é "a variável de ajuste macroeconômica utilizada para mitigar efeitos porventura inflacionários da política fiscal". Traduzindo: no combate à inflação, se a política fiscal for frouxa, provocando desequilíbrios nas contas públicas, a política monetária tem de ser apertada.

Uma segunda mensagem da ata é de paz

Já o outro ponto de destaque na ata pode ser lido como uma declaração de trégua ou um esforço de pacificação do BC com Lula e o governo. Foi essa, por sinal, uma segunda mensagem que o BC procurou transmitir, de acordo com o entendimento de muitos analistas.

O entendimento de que o BC acenou com uma bandeira branca decorre da menção, na ata, de que "alguns membros" do Copom notaram recentes revisões para baixo nas projeções do mercado a respeito dos déficits nas contas públicas em 2023, "possivelmente incorporando o pacote fiscal anunciado pelo ministério da Fazenda."

A frase que fecha este parágrafo não poderia ser mais clara nessa direção:

"O Comitê manteve sua governança usual de incorporar as políticas já aprovadas em lei, mas reconhece que a execução de tal pacote atenuaria os estímulos fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação."