José Paulo Kupfer

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Opinião

Lula fala em novas surpresas na economia, mas agora isso não é tão provável

Em busca da popularidade perdida, o presidente Lula tem falado sem parar. Os veículos preferidos dos seus discursos têm sido, nesta temporada, emissoras de rádio. O tom é sempre o mesmo de sempre, podendo ser resumido em uma conclamação ao "pau na máquina" na economia.

Nesta sexta-feira (14), o recado de Lula veio numa entrevista a uma rádio paraense. Lula disse que não adianta ficar de olho na macroeconomia, já que "o que vale é a quantidade de dinheiro circulando". Disse também que a economia brasileira surpreenderá novamente os analistas em 2025, como em 2023 e 2024, e continuará crescendo acima do previsto.

Projeções estão mais afinadas

É possível, contudo, que, desta vez, a surpresa prevista por Lula, nas projeções dos economistas, se houver, não seja tão grande quanto foi nos dois anos anteriores. A previsão mais recente do governo aponta expansão do PIB de 2,3%, enquanto no mercado, trabalha-se com crescimento de 2%.

Em 2023 e 2024, de fato, o erro foi feio. No começo de 2023, as previsões eram de que a atividade econômica evoluiria 0,8%, mas a alta foi de 3,2%. No ano passado, quando o crescimento deve ter chegado a 3,5% (Lula está esperando 3,7%), as estimativas iniciais não passaram de 1,5%.

Ao fim de 2025, o crescimento acumulado em três anos do terceiro mandato de Lula deve chegar perto de 10%, com média anual superior a 3%. O bom desempenho teve como um de seus impulsos principais justamente a quantidade excepcional de dinheiro que Lula jogou na praça.

Custos do crescimento

Mas o impulso fiscal, turbinado pela ampliação de programas sociais, numa economia já com acúmulo de dívida pública, que empurrou para cima a atividade, reduziu o desemprego e elevou a massa de salários, tem cobrado um preço à estratégia de crescimento de Lula.

Em combinação com fenômenos climáticos adversos — caso da seca que atingiu grande parte do país e se prolongou no tempo, em 2024 —, e uma forte valorização do dólar ante o real, um outro lado da moeda apareceu sob a forma de pressões inflacionárias.

Inflação em alta levou à adoção de uma política de juros bastante restritiva, a partir do último trimestre do ano, que deve prosseguir ao longo de 2025, em meio ao constrangimento, inclusive político, no que diz respeito a novas ondas de ampliação do gasto público. O resultado negativo para a atividade começou a aparecer no último trimestre de 2024, quando a economia deve ter crescido em torno de 0,3%, em ritmo equivalente a um terço da expansão de 0,9% no trimestre anterior.

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Freada em 2025

Com a freada no fim do ano, o carregamento estatístico do bom crescimento de 2024 chegará menos potente a 2025. Economistas calculam que ficará abaixo de 1,5% — ou seja, se a economia não crescer nada no ano inteiro, o PIB ainda avançaria pelo transbordamento da expansão do ano anterior, mas na metade do ritmo da marcha dos dois anos anteriores.

Além de um carregamento mais modesto, a expectativa é de recuo nas concessões de crédito, sob efeito cumulativo das altas de juros, afetando principalmente o investimento na economia. Em relatório recente, economistas do Bradesco projetam alta de apenas 0,4% para o investimento em 2025, numa freada forte em relação à expansão de mais de 7% em 2024.

De acordo com as projeções do Bradesco, a economia ainda avançará mais rápido no primeiro semestre, puxada pela boa safra agrícola que já está sendo colhida e ainda pelo impulso da renda no consumo. Mas, puxará o freio na segunda metade do ano.

A marcha da atividade, trimestre a trimestre, está com cara de repetir o ocorrido em 2023, quando a agropecuária e a indústria extrativa, no primeiro semestre, garantiram o crescimento do ano. Agora, em 2025, porém, a repetição deve ocorrer com resultados mais modestos.

Menos impulsos

Fernando Honorato Barbosa, diretor de pesquisas e estudos econômicos do Bradesco, projeta alta de 1,3% para o PIB do primeiro trimestre de 2025, com redução de ritmo pelo metade, no segundo, e recuos em cada um dos dois trimestres do segundo semestre — de 0,3%, entre julho e setembro, e de 0,2%, no último trimestre.

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Além do desempenho da agropecuária, que pode voltar a crescer 6%, em 2025, Barbosa vê a economia puxada pela perspectiva de isenção do Imposto de Renda até R$ 5.000 e o esforço para expandir o crédito consignado, ao lado da ação de bancos públicos e dos investimentos dos estados. "Mas o segundo semestre não tem impulso fiscal nem externo, e ainda terá juros altos", diz Barbosa.

Não por coincidência, as ações mencionadas para impulsionar a economia se inserem na linha lulista de aumentar a quantidade de dinheiro em circulação. O problema é se trata de uma política que, no momento, se choca com a política de juros restritiva do dinheiro em circulação, praticada pelo Banco Central, para conter a inflação. Forçar esse cabo de guerra tende a tirar eficiência de ambos os movimentos.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.