Mesmo com inflação acima da meta, BC indica cortar juros em ano eleitoral
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A política monetária, que tem na administração dos juros básicos da economia seu principal elemento, não é "política" à toa. Se requisitos técnicos devem estar presentes nas avaliações do Copom (Comitê de Política Monetária), outros fatores, inclusive de caráter "político", no sentido que lhe é dado pelo senso comum, entram nas decisões.
Essa variável "política" parece ter ganhado pontos adicionais de relevância na reunião de junho do colegiado que reúne presidente e diretores do Banco Central. O aumento de 0,25 ponto percentual na taxa já elevada 14,75% para 15% nominais ao ano, que estava longe de ser consenso entre os analistas do mercado financeiro, serviu para fortalecer a estratégia de encerrar o ciclo de altas já a partir do Copom de fins de julho e encaminhar um futuro relaxamento dos juros básicos.
Juros básicos e eleições
Não é difícil relacionar o calendário da futura trajetória dos juros, indicado na ata da reunião, divulgada nesta terça-feira (24), com as eleições presidenciais em outubro de 2026. Ao longo do ano eleitoral, de acordo com as indicações desta última ata, e à luz da experiência histórica, a taxa Selic poderá recuar, de janeiro — ou no máximo, março — do ano eleitoral, a pelo menos 12% ou 12,5%, em fins de 2026, descendo para menos de 13% antes da eleição.
Trata-se, se confirmado, de movimento mais ou menos típico de períodos eleitorais. Nos últimos 20 anos, o padrão da atuação do Copom mostra encerramento de ciclos de alta dos juros básicos, ou pelo menos estancamento de trajetórias de alta, em anos eleitorais ou às vésperas de eleições.
Decisões do tipo ocorreram em 2002, 2010, 2014 e 2022. Mesmo em 2006, primeira reeleição de Lula, num ambiente econômico favorável, o Copom aproveitou para derrubar forte a Selic, que saiu de 19,75% em setembro de 2005, para 13,25% no fim do ano.
Semelhanças entre 2022 e 2026
Caso interessante foi o de 2022, ano em que Jair Bolsonaro disputou a reeleição com Lula. Depois de levar a taxa básica à posição histórica mais baixa, fixando a Selic em 2% ao ano, em março de 2021, em reação ao colapso econômico causado pela pandemia de Covid, o Copom iniciou um forte ciclo de altas ao longo do ano eleitoral.
A retomada das altas levou a Selic a escalar até 13,75%, mas estancou em agosto de 2022, às vésperas do pleito. A freada na Selic se deu com a inflação ainda acima do centro da meta e mesmo do teto do intervalo de tolerância. Em 2022, a inflação bateu 5,8%, para um centro de meta de 3% e teto de 4,5%.
Há semelhanças entre o comportamento do Copom em 2022 e o que ele indica seguir em 2026. Uma delas é a de que as decisões do colegiado estão blindadas pela autonomia formal do BC, obtida em 2021. Eleito, Lula teve de lidar com um presidente do BC — e maioria de membros do Copom — escolhidos no governo anterior e detentores de mandatos fixos. Viveu às turras com o presidente Roberto Campos Neto, que manteve os juros Selic até fim de 2022 e depois, sob pressão de Lula, fez cortes até os juros descerem a 10,5%, em maio de 2024, ao longo de sete reuniões do Copom
Mas a principal semelhança é a indicação de que um ciclo de cortes nos juros será iniciado mesmo com desequilíbrios fiscais prejudicando o controle da inflação, segundo o próprio Copom, e as projeções apontando alta de preços ainda acima do centro da meta, no ano eleitoral.
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