Petrobras e investidores: quando a relação esfria, mas ninguém vai embora
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E, mais uma vez, a Petrobras entregou um balanço equilibrado: bons fundamentos, mas também alertas. Quando penso na Petrobras, lembro daquele relacionamento morno que virou costume. Foi intenso e bom no passado, mas hoje não está ruim o suficiente para terminar. Ainda resta um pouco de amor.
É assim a relação dos investidores com a petroleira. Os tempos de dividend yield (retorno em dividendos) acima de 20% ou 30% ficaram para trás. Agora, são as turbulências de sempre: risco político, troca de comando, preço dos combustíveis e o petróleo brent em queda. Um combo que ameaça a relação com os investidores, colocando a Petrobras na DR.
A gestão sabe que, se os dividendos despencarem, o relacionamento acaba, e se esforça para equilibrar os pratinhos. Como disse a CEO Magda Chambriard: "quando o preço do petróleo desce, é hora de apertar os cintos. Fiquem tranquilos." Junto a isso, vieram promessas de dividendos regulares e uma leve esperança de extraordinários.
Mas a realidade é que, mesmo com um dividend yield de até 15% e incertezas no horizonte, ainda não dá para largar as ações da Petrobras. Alguns analistas, no entanto, já adotam uma postura mais cautelosa.
O petróleo brent, negociando perto de US$ 66, já indica que o curto prazo será puxado. No longo prazo, o mercado ainda nutre esperanças: manter Petrobras na carteira para viver de renda e, quem sabe, até se aposentar com ela.
O amor não acabou. Mas será que a Petrobras vai reacender a paixão? Ou perderá espaço para petroleiras menores, como a Petroreconcavo? Nesta coluna, te conto o que esperar de verdade dos dividendos da Petrobras.
Com petróleo em queda, dividendos vão minguar?
Segundo a Elos Ayta Consultoria, o lucro de R$ 35,2 bilhões foi o maior da Petrobras nos últimos dois anos, desde o 1º trimestre de 2023, quando a petroleira lucrou R$ 38,16 bilhões. O estudo considera todos os trimestres.
Mas há um alerta: todo esse desempenho veio com o petróleo ainda negociado a US$ 74 em março. O cenário agora é outro, com o brent por volta dos US$ 66, o que acende a dúvida no mercado: os dividendos serão pressionados? Além disso, apesar do custo de produção competitivo e da forte geração de caixa, o aumento dos investimentos pode reduzir o fluxo disponível para proventos.
Alguns analistas acreditam que, com o brent entre US$ 50 e US$ 60, ainda há geração de caixa e espaço para dividendos. É o caso de Regis Chinchila, head de research da Terra Investimentos, que alerta que preços baixos por muito tempo tiram atratividade do dividendo e exigem ajustes nas projeções.
Lucas Lima, analista-chefe da VG Research, reforça que o equilíbrio ideal está em torno de US$ 45, incluindo investimentos. E lembra que com barril acima de US$ 40, a Petrobras ainda garante um dividendo mínimo de US$ 4 bilhões, o que renderia um yield de 5,5% no pior cenário.
Há quem enxerga outros fatores além do petróleo. Mônica Araújo, estrategista da InvestSmart XP, também projeta impacto negativo no 2TRI25, destacando que câmbio, produção e investimentos influenciam os proventos.
A dívida da Petrobras (US$ 64,5 bi) precisa ser monitorada. O teto para manter dividendos regulares é de US$ 75 bilhões. Por isso, Lima vê o aumento dos investimentos como risco: "Se o endividamento se aproximar do teto, os dividendos podem cair de 14% para entre 8% a 10%", estima. Por outro lado, Araújo, considera a estrutura da dívida equilibrada, coerente com o perfil de risco da petroleira e o setor, e sem preocupação no curto prazo.
A gestão da Petrobras já indicou que vai revisar o plano de negócios 2026-2030, priorizando caixa, redução de custos e disciplina de capital, mas mantém os investimentos de US$ 18,5 bilhões para 2025. O plano costuma ser divulgado em novembro.
Extraordinários? Só com milagre ou petróleo a US$ 70
A Petrobras ainda não descarta os dividendos extraordinários, mas tudo depende do caixa e do preço do petróleo. Fernando Malgarejo, diretor financeiro da companhia, afirmou que isso só seria possível em 2025 com geração de caixa robusta e evolução do preço do petróleo. Em 2026, a decisão passa a depender dos ajustes do novo plano de negócios.
Há divergências. Alguns analistas acham que o petróleo a US$ 70 já permite o extraordinário, outros só esperam isso com o brent em US$ 100. Para Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, "se houver caixa acima do mínimo e visibilidade, é possível distribuir um extraordinário", diz. Mas ele vê essa possibilidade apenas após novembro, quando sai o plano.
Já Filipe Ferreira, sócio da ComDinheiro/ Nelógica, acredita que, embora não no nível de antes, há espaço para um dividendo extraordinário em 2025, possivelmente impulsionado por uma motivação política e necessidade de recursos do governo.
Tem os que duvidam mais, como Julio Vieira, contribuidor do TC. Para ele, o pagamento extra exige três fatores: alta do brent, controle da alavancagem (hoje em 1,45x ebitda) e geração de caixa após investimentos e despesas.
"Com os investimentos subindo e o brent pressionado, a tendência no curto prazo é de menor propensão a dividendos extraordinários, a não ser que ocorra uma reversão no cenário internacional", afirma.
Talvez seja melhor, por ora, se contentar com os dividendos regulares.
Hora de comprar Petrobras?
Apesar de um cenário desafiador, as recomendações para compra de PETR4 seguem predominando. O retorno esperado em dividendos vai de 10,5% a 15%, embora o risco-retorno da ação não seja tão atrativo para todos os analistas.
E as rivais?
Enquanto a Petrobras tenta reacender a chama de um relacionamento morno com seus investidores, concorrentes como Petroreconcavo (RECV3) estão avançando no quesito dividendos.
Sem uma política estabelecida, a Petroreconcavo já entregou um dividend yield de 12,63% nos últimos 12 meses e tem um retorno em dividendos projetado de 18,35% para os próximos 12 meses, desde que mantenha o lucro e a política de remuneração, segundo estudo da Elos Ayta. Ou seja, pode pagar mais que a Petrobras.
Já as nanicas, Brava (BRAV3) e Prio (PRIO3), não pagaram nada nos últimos 12 meses e seguem sem sinal de dividendos.
Amor antigo, com contrato novo
Fica nítido que a relação com Petrobras não acabou, mas não é mais aquele romance. Hoje virou conveniência. Enquanto o caixa continuar forte e o dividend yield acima de 10%, ainda há motivos para ficar.
Para quem quer mais previsibilidade e menos DR, talvez seja a hora de flertar com novas alternativas, como a Petroreconcavo ou outras ações perenes. A Petrobras ainda tem muito a oferecer, mas não é a mesma do passado. Não adianta idealizar paixões antigas, é o caminho mais curto para a frustração.
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