Mariana Grilli

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Opinião

Produtores criam 'COP do Agro', mas podem prejudicar imagem

Recentemente, escrevi uma coluna aqui no UOL sobre as movimentações do agronegócio para participar da COP30, a Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas, que é realizada pela ONU (Organização das Nações Unidas) anualmente e em novembro acontecerá em Belém (PA). Sobre isso, na semana passada, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, teve uma reunião com o embaixador André Corrêa do Lago, escolhido como presidente da COP30.

De acordo com a pasta, entre os temas debatidos, destacaram-se o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas e o Plano Nacional de Identificação Individual de Bovinos e Búfalos. Elencar essas iniciativas como as principais bandeiras do país corrobora o que a ciência aponta: a emissão de gases poluentes no Brasil está centrada em mudança de uso da terra, ou seja, na conversão de florestas para uso agropecuário.

Tratar esses temas como prioritários é a ponta do iceberg de uma série de discussões que deve ocorrer ao longo de 2025. Será preciso falar da NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada), que define as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa do Brasil. Também será preciso chegar a um acordo sobre metodologias para mensuração e criação de um mercado global de carbono. Além disso, a capital paraense será palco de um ponto-chave das COPs: o financiamento climático e a respectiva governança.

Mesmo diante de um momento em que o planeta Terra precisa chegar a consensos, uma parcela do agro brasileiro tem optado por se isolar e falar somente com seus pares em um evento chamado de COP do Agro, a ser realizado em Marabá (PA), em outubro. Nas redes sociais, o convite se estendeu ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

O evento é organizado pela Apria (Associação dos Produtores Rurais Independentes da Amazônia). Em vídeo publicado em dezembro, a Apria fala em "falsos indígenas" e se coloca à disposição "se precisar brigar com aquela gente". Na ocasião, o criador da Apria, Vinícius Borba, estava ao lado de Pedro Lupion, presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), que mostra apoio à COP do Agro.

No mesmo vídeo, Lupion diz que o evento é uma "reunião paralela" à COP30. Quem acompanha as conferências da ONU sabe que eventos paralelos — chamados na agenda oficial de side events -- acontecem simultaneamente ao calendário principal e são listados no site da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima. Esse não é o caso.

Se, nas redes sociais, a tentativa é levantar dúvidas sobre a seriedade da COP30, na frente dos compradores a FPA assume uma postura diplomática. No final de janeiro, Lupion e a senadora e ex-ministra Tereza Cristina lideraram uma comitiva na Europa para discutir temas como a Lei Antidesmatamento (EUDR), o acordo Mercosul-União Europeia, a relação bilateral entre o Brasil e o bloco europeu e os preparativos da COP30 incluindo o papel da agricultura tropical.

Querer distorcer um evento da ONU mostra a imaturidade de uma parcela do agronegócio em encarar os novos tempos moldados pela emergência climática. A própria sigla COP significa Conferência das Partes, sendo Partes os países, e, no caso da COP do Agro, só se quer falar para os mesmos. Assim, mais uma vez, também fica escancarado o racha dentro do setor que, mesmo nos corredores de Brasília, é rotulado entre o "ogronegócio" e o "agroambiental".

Especialistas em COPs oficiais acreditam que o evento em Marabá não vá fazer cócegas nas discussões multilaterais da ONU. Já a imprensa internacional está de olho na Amazônia. O que pode acontecer, portanto, é essa COP do Agro generalizar a imagem do setor e virar chacota diante do mundo todo.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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