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Este conteúdo é uma produção do UOL Content_Lab para Sebrae-SP e não faz parte do conteúdo jornalístico do UOL. Publicado em outubro de 2021

Quando ciência vira negócio

Estimulados pelos polos tecnológicos de SP, cientistas veem nas startups opção para tirar boas ideias do papel

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No Brasil, cerca de 2 milhões de pessoas convivem com insuficiência cardíaca, e todos os anos surgem outras 240 mil com novos diagnósticos. A síndrome, que impede que o coração bombeie o sangue adequadamente para o corpo, ainda é um quadro irreversível, que reduz a expectativa de vida do paciente. Mas, se depender de dois cientistas brasileiros, isso pode mudar em um futuro breve.

Em São Paulo, uma startup científica trabalha para que células artificiais produzidas a partir de células humanas possam regenerar o tecido cardíaco nesses pacientes e transformar o status "incurável" da doença.

Criada em 2013, a LizarBio Therapeutics está na fase de testes. A ideia da empresa nasceu em um laboratório da Universidade de São Paulo (USP), durante o doutorado de um dos sócios. "Nosso objetivo é produzir essas células em grande escala. Nunca antes na história a humanidade foi capaz de produzir isso", diz o biólogo Marcos Valadares, CEO e cofundador da startup.

A LizarBio é um exemplo de como descobertas acadêmicas com alto potencial disruptivo estão dando origem às deep techs, startups científicas baseadas em alta tecnologia.

As deep techs são empresas muito interessantes para o Brasil. Não só porque são um bom negócio em si, mas porque boa parte delas vai ajudar a melhorar a produtividade das grandes empresas do país"

Carlos Américo Pacheco, diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fapesp

Pacheco diz que esse modelo de empresa é fruto de uma mudança cultural recente: com o avanço das startups, o pesquisador passou a ver o empreendedorismo científico como uma opção de carreira. "É uma mudança de pensamento, e tem sido muito promissora. Há um grande movimento na academia nos últimos dez anos no sentido de empreender", conta.

Uma parte significativa dessa transição acontece dentro de programas de mestrado ou doutorado, onde uma ideia é gestada. "Mas não é só. Tem gente inovando a partir de vários tipos de formação. Muita gente tem saído da graduação já pensando em criar empresas. O que eles têm em comum é que, em geral, são jovens", explica Pacheco.

Mas como se forma um cientista-empreendedor? Uma incursão pelo estado de São Paulo aponta respostas para essa pergunta.

Berços de boas ideias

São Carlos, a 231 km de São Paulo, é um dos principais polos de inovação científica do Estado. A cidade de 250 mil habitantes conta com a USP, a UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), duas unidades da Embrapa, duas escolas técnicas e outros equipamentos científicos que a tornam um grande laboratório de ideias.

"A cidade é um arcabouço de capacitação. Há um pesquisador a cada 100 habitantes e uma startup a cada 1.000 pessoas; são índices semelhantes aos de Israel", explica o professor Sylvio Rosa, diretor presidente do Parque Tecnológico de São Carlos, o ParqTec, primeira incubadora tecnológica do país.

Inova Unicamp/Divulgação

A cerca de 140 km dali, Campinas é outro importante polo de inovação no Estado. E um pouco mais distantes, é possível encontrar São José dos Campos, onde ficam o ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) e o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais); de Ribeirão Preto, com um campus da USP; e da própria capital paulista, onde a presença sobretudo da USP, que tem o Cietec (Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia), e da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) alavancam os índices de produção científica.

São Paulo, aliás, é a única cidade latino-americana a figurar no ranking dos locais que mais contribuem para a ciência de alto impacto mundial, segundo o Nature Index Science Cities - um suplemento do grupo Nature. A lista, liderada por Pequim, é baseada na afiliação acadêmica de autores de artigos científicos de alto impacto.

Aliás, artigos publicados nos principais periódicos do mundo são sinais de cientistas trabalhando. Essa pesquisa de ponta, que é desenvolvida em diversas áreas do conhecimento, está frequentemente associada aos centros de excelência acadêmica, que criam um ecossistema de incentivo à inovação.

Na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), as empresas criadas por alunos e ex-alunos contam com um ecossistema bem-sucedido e retroalimentado pelo grupo de empresas-filhas da universidade. A Agência de Inovação Inova Unicamp começou a cadastrar as empresas-filhas em 2006. Hoje, são mais de mil negócios cadastrados, que, juntos, somam mais de R$ 8 bilhões em faturamento por ano. As startups gestadas na Incamp (incubadora de empresas de base tecnológica da Unicamp) representam 7% do total.

Lá, quando um professor identifica no trabalho científico o potencial de produto ou serviço inovador, comunica à Inova, que é responsável pela avaliação e gestão da propriedade intelectual, o que inclui o depósito da patente ou o registro do software e a oferta de transferência de tecnologias para empresas. A partir daí, empresas podem sinalizar interesse em determinada descoberta, para uma futura parceria, ou o próprio pesquisador pode decidir desenvolver um modelo de negócio. Para isso, ele tem à disposição uma estrutura voltada para oferecer mentorias, laboratórios e troca de conhecimento.

"A Inova oferece aos cientistas que permeiam a universidade um ambiente em que eles consigam se engajar e amadurecer as qualidades empreendedoras. Não é para todos, o cientista não precisa ser empreendedor, mas há um caminho para os que querem ser", diz a professora Ana Frattini, diretora executiva da Agência de Inovação Inova Unicamp. Esse caminho oferece uma disciplina focada na construção de um modelo de negócios e pode evoluir para a oportunidade de passar até 3 anos incubado na Incamp.

Rubian Extratos/Divulgação
Miniemulsão à base de casca de maracujá

Foi esse o trajeto feito pela startup Rubian Extratos, criada por um ex-aluno. A empresa, que foi incubada pela Incamp e contou com financiamento da Fapesp, desenvolveu recentemente uma miniemulsão à base de casca de maracujá com compostos bioativos promissores para produtos antienvelhecimento da pele.

Além de Unicamp, UFSCar e USP, em São Paulo existem mais de 30 hubs focados em apoiar a inovação e o empreendedorismo científico. Entre esses espaços, estão parques tecnológicos, incubadoras, centros de inovação e núcleos de inovação tecnológica.

Para mencionar alguns dos mais representativos, há o Nexus, um ambiente para conexão de startups, pequenas, médias e grandes empresas, investidores e instituições de ensino, situado dentro do Parque Tecnológico de São José dos Campos. Há também o Supera Park, em Ribeirão Preto, e o Parque Tecnológico de Sorocaba, entre outros.

Há ainda as agências de inovação, tais como Auspin (a Agência de Inovação da USP) e a Auin (Agência Unesp de Inovação). Elas têm como missão identificar oportunidades e cuidar da política de inovação para promover a utilização do conhecimento científico, tecnológico e cultural produzido na universidade.

"Todo mundo percebe a importância de ter mecanismos para verter o conhecimento gerado pelas universidades para o tecido empresarial. A sociedade exige esse retorno", diz Sylvio Rosa, do ParqTec.

LizarBio/Divulgação
Marcos Valadares e Diogo Biagi, da LizarBio

Para atravessar o vale da morte

Diferentemente das demais startups, uma deep tech precisa respeitar o tempo necessário para o desenvolvimento de uma nova tecnologia. No caso de uma fintech, por exemplo, a tecnologia já existe e será desenvolvido um modelo inovador de negócio. O produto chega rápido ao mercado e, por isso, consegue atrair recursos logo que o modelo se mostra viável. Essa travessia entre a ideia e sua chegada ao mercado é conhecida como vale da morte.

"Apesar de terem um potencial de crescimento extraordinário, as deep techs têm ciclo mais longo. Essa é uma dificuldade, porque o mercado é mais avesso ao risco desse modelo. Então são necessárias políticas públicas e a atuação de instituições como Fapesp, Sebrae, Finep ou BNDES", diz Pacheco.

No caso da LizarBio Therapeutics, por exemplo, já são oito anos trabalhando em uma solução disruptiva. "Já levantamos US$ 1,5 milhão em investimento privado. Considerando todo investimento a fundo perdido, são mais de US$ 750 mil dólares. E ainda somos considerados em fase inicial. Por ser uma tecnologia de fronteira e da área de saúde, o custo é muito alto para darmos o próximo passo", conta Marcos Valadares, que estima que, até começarem os testes em humanos, ainda serão necessários de US$ 20 milhões a US$30 milhões em investimentos.

Quanto maior o tempo entre a pesquisa e o mercado, porém, menor o número de investidores dispostos a financiar o empreendedorismo científico. "Somos uma empresa de oito anos e nossa previsão de faturamento para 2021 é de precisamente zero. E para os próximos cinco anos, é muito próxima de zero. Nosso modelo de negócio envolve a utilização de recursos para pesquisa", diz Valadares.

As agências de fomento à pesquisa e instituições de apoio ao empreendedorismo científico são fundamentais para manter esse modelo de negócio e garantir que empresas em fase inicial consigam oferecer ao mercado mundial produtos de alto impacto.

O lado positivo é que, quando pronta, a solução pode revolucionar o setor em que atua e alcançar altas cifras. A Magnamed, por exemplo, já contou com aporte público da Fapesp e do BNDES para desenvolver ventiladores pulmonares. Com a pandemia, ela se tornou uma gigante do segmento e firmou acordo com o Ministério da Saúde no valor de R$ 320 milhões para fornecer 6.500 equipamentos para todo o país.

TissueLabs
TissueLabs e a bioimpressão 3D

Já a TissueLabs, startup brasileira da incubadora Ipen-Cietec, ligada à USP, planeja se tornar uma empresa que fabrica e comercializa órgãos para transplante a partir de bioimpressão 3D. Enquanto isso não acontece, a empresa, criada pelo médico Gabriel Liguori e pelo engenheiro da computação Emerson Moretto em 2019, financia seus estudos por meio da comercialização dos insumos que desenvolve. O modelo de negócios fez com que ela recebesse aporte recente de R$ 1,5 milhão.

Apesar de a pandemia ter dado destaque para as iniciativas em saúde e biotecnologia, as deep techs também estão em setores como robótica, computação quântica e inteligência artificial.

A ponte entre pesquisadores e o mercado

Enquanto órgãos de fomento à pesquisa buscam oferecer sustentação financeira para empresas científicas desenvolverem produtos disruptivos, o Sebrae-SP atua para que essas inovações consigam ser comercializadas. "O Sebrae ajuda muito porque pode fazer a ponte entre empreendedores e o mercado. É a parte mais difícil", diz Pacheco, da Fapesp.

O Sebrae e a Fapesp anunciaram recentemente um acordo no valor de R$ 150 milhões destinado a fomentar 150 deep techs nos próximos quatro anos dentro do Programa Pipe (Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas). "Estamos construindo diversos programas para empreendimentos de base tecnológica em que oferecemos o olhar de negócio", diz Marcus Leite, consultor de inovação do Sebrae-SP.

O primeiro edital, aberto em julho deste ano, vai apoiar a pesquisa para o desenvolvimento de inovação em todas as áreas do conhecimento. Cada uma das 20 startups selecionadas vai receber R$ 1,25 milhão no formato não reembolsável. O valor será utilizado para financiar as etapas de pesquisa e desenvolvimento e auxiliar na gestão empresarial, como o desenvolvimento comercial, participação em feiras, internacionalização e captação de investimentos.

Leite explica que esse programa é voltado para startups em fase intermediária e faz parte de um conjunto de iniciativas que somam R$ 200 milhões em programas para estimular startups e ambientes de inovação. "No Sebrae-SP, apresentamos um plano de inovação ao conselho e estamos construindo diversos programas para empreendimentos de base tecnológica nos próximos anos."

Além da Fapesp, o Sebrae conta com parcerias com Wylinka, IPT, Abstartups e a rede de parques e incubadoras do Estado de São Paulo. "Sebrae é um grande parceiro para impulsionar as empresas que participam do nosso sistema de incubação", diz a professora Ana Frattini, da Inova Unicamp.

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