Nesta semana, o presidente Donald Trump determinou que os Estados Unidos passem a taxar em no mínimo 10% os produtos importados do Brasil. A medida começou a valer neste sábado (5) como parte do decreto sobre tarifas recíprocas aos parceiros comerciais dos EUA. O agronegócio brasileiro ainda está avaliando os possíveis impactos da medida. Em entrevista ao UOL, o presidente da Aprosoja (Associação Brasileira dos Produtores de Soja), Maurício Buffon, diz que não há deverá haver reflexo no curto prazo, mas, sim, um rearranjo na comercialização global de produtos agropecuários no médio e longo prazo. O mercado mundial terá que se reorganizar para voltar a comprar soja. Barreiras mais caras impostas para China e União e Europeia farão com que esses mercados saiam em busca de novos fornecedores. Aí entra o Brasil, com a soja e os derivados. Maurício Buffon, presidente da Aprosoja A taxa imposta pelo governo norte-americano passará a ser de 54% para a China. Em resposta, o país asiático anunciou tarifas adicionais de 34% sobre os produtos estadunidenses. Diante da guerra comercial, Buffon ressalta que é o momento propício para o Brasil negociar muito bem, "inclusive as barreiras comerciais que estavam sendo impostas pela EUDR [lei antidesmatamento da União Europeia]". "Quando eles [europeus] precisarem da soja brasileira, teremos que impor nossas condições para respeitarem a nossa sustentabilidade", afirma o presidente da Aprosoja. Lygia Pimentel, sócia-fundadora da consultoria Agrifatto, também fala que a pecuária não sente efeitos imediatos da taxação, mas vislumbra uma "dança das cadeiras em nível global". Nesse contexto, também se acrescenta o fato de que, em março, a China não renovou as habilitações de parte dos frigoríficos de carne bovina dos EUA. Logo, a chegada das taxações para a pecuária de corte entre os dois países não influencia tanto. Embora haja essa margem para atender o mercado chinês, substituir a carne dos EUA pela do Brasil não é tão simples assim. Isso tem a ver com a qualidade. A China pagava 122% a mais pela tonelada comprada dos EUA em relação ao preço pago pela carne brasileira. Isso porque o gado Angus do país de Trump fornece uma carne premium, enquanto a aptidão brasileira é produzir uma carne commodity das raças Zebu e Nelore. "Os EUA aumentaram o embarque para Japão e Coreia, que também são consumidores de carne premium, e a China aumentou os embarques a partir da Austrália, e não do Brasil, pela qualidade do produto", ela explica. O Brasil, diz Lygia, sabe muito bem produzir carnes premium, que inclusive tem alta demanda no mercado interno pela classe AAA. No curto prazo, esse tipo de produto não deve ser alto de exportação, mas no futuro, é possível assistir ao Brasil ampliando este mercado, embora as condições climáticas não sejam tão favoráveis à raça Angus. Estamos entrando numa nova era, com eixo de geopolítica diferente. Se China e EUA, gigantes do comércio internacional, estão fora um do outro, certamente cabe aos outros países atender esses mercados. Lygia Pimentel, sócia-fundadora da consultoria Agrifatto A CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) chama a atenção para o impacto da taxação ao café verde e do suco de laranja. Foram 1 bilhão de litros da bebida exportados do Brasil para os EUA em 2023, e, a partir da nova tarifa, a alíquota efetiva sobre o suco passa de 5,9% para 15,9%, pelos cálculos da confederação. Diante disso, a CNA estima que possa haver uma queda de mais de 70% nas vendas externas. "No caso do suco de laranja, os EUA contam com alguma produção no mercado doméstico, que seria muito favorecida em relação à alternativa brasileira", aponta. |