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Burocracia e embargo: obstáculos a investimento estrangeiro em Cuba

04/11/2016 15h26

Havana, 4 Nov 2016 (AFP) - Dois anos após a histórica aproximação com os Estados Unidos, Cuba atrai investimentos estrangeiros, mas o embargo americano e a burocracia da ilha continuam dificultando a chegada de capitais, cada vez mais necessários para a economia cubana.

Em junho de 2014, o governo de Raúl Castro deu um dos passos mais decisivos no processo de "atualização" do obsoleto modelo centralizado, ao expedir uma lei que abriu as portas ao capital estrangeiro.

Segundo cálculos oficiais, Cuba precisa de mais de 2 bilhões de dólares anuais de investimento estrangeiro direto para impulsionar sua abertura econômica e garantir um crescimento sustentável.

Entretanto, nesses dois anos, a ilha fechou apenas 83 projetos por 1,5 bilhão de dólares, sendo que a maioria deles ainda não está em execução.

"Ainda não avançamos na concretização de negócios no ritmo que a nossa economia requer para seu desenvolvimento", reconheceu nesta terça-feira o ministro de Comércio Exterior, Rodrigo Malmierca, na Feira Internacional de Havana (Fihav), que neste ano bateu o recorde de 4.500 expositores de 75 países.

O embargo americano, por um lado, e uma burocracia pouco preparada para o trato com os investidores, por outro, criam obstáculos ao capital estrangeiro.

Para o governo, a principal causa é o embargo americano. Segundo o portal independente Cuba Standard, os potenciais investidores são dissuadidos fundamentalmente por conta do embargo, pelo excesso de regras e pela ineficiência das empresas estatais. Trata-se de uma mistura que pode tornar eterna qualquer negociação.

Malmierca admitiu que "os empresários cubanos, às vezes por falta de preparo, hesitam na hora de tomar decisões", e prometeu aumentar sua eficácia, autonomia, e melhorar "o ambiente para os investidores".

"Velha mentalidade"Após sua chegada ao poder há 10 anos, Raúl Castro abriu a economia aos pequenos negócios privados, mas ainda não libera a atividade de pequenas e médias empresas.

As cooperativas, contudo, têm recebido mais apoio, em sintonia com a velha guarda da revolução. O país aproveitou sua nova imagem para ter a maior parte de sua dívida perdoada e obter condições favoráveis de pagamento para o restante.

Ainda muito influentes, os líderes cubanos mais ideológicos questionam a decisão do governo de Barack Obama de fortalecer o setor privado, porque veem por trás disso a tentativa velada de gerar uma mudança política.

As autoridades lançaram na Fihav uma versão atualizada do "portfólio de negócios" para atrair investimento estrangeiro, que oferece 395 projetos em 14 setores por uma quantia total de 9,5 bilhões de dólares, mas nenhum deles com foco na iniciativa privada local.

"A lógica da segurança nacional faz que o crescimento econômico do país se veja limitado pela falta de coerência e complementariedade das mudanças econômicas adotadas", explica à AFP o cientista político cubano da Universidade do Texas, Arturo López-Levy.

Para o ex-diplomata e acadêmico cubano Carlos Alzugaray, Cuba deve romper com sua "velha mentalidade", tomar o caminho da descentralização e aceitar que "o setor privado tem que ter um papel mais relevante" e ser tratado como "um parceiro em igualdade de condições".

A ilha é um destino atraente para o investimento: mão de obra barata e qualificada, alta demanda, e um país onde "tudo está por fazer", disse à AFP o economista cubano Pavel Vidal, que coordenou o estudo publicado pelo Cuba Standard.

Favorecidas pelo degelo, empresas americanas como Netflix, Starwood, e várias companhias aéreas e de cruzeiros começaram suas atividade em Cuba.

Na zona especial do megaporto del Mariel (45 km a oeste de Havana), que oferece condições fiscais vantajosas, 19 projetos foram assinados com empresas cubanas e estrangeiras, 11 deles este ano.

O gigante francês Bouygues, construtor de vários hotéis na ilha, acaba de assinar com o operador Aeroportos de Paris um contrato para ampliar e administrar o aeroporto internacional de Havana.

Outros empresários estrangeiros dizem estar prontos para entrar no mercado cubano.

"Queremos ser os primeiros a estar aqui. Estamos apostando no futuro", explica Diego Aldunate, diretor para América Latina da empresa de pinturas Rust-Oleum, uma das 24 companhias dos Estados Unidos que participa na Fihav.