IPCA
0,83 Mar.2024
Topo

Israelenses deixam empregos tecnológicos para levar uma vida 'offline'

29/08/2017 14h06

Jerusalém, 29 Ago 2017 (AFP) - O ex-executivo do ramo da tecnologia Dotan Goshen cuidadosamente arruma alguns melões no fundo de uma caixa, depois faz com mesmo com abobrinhas, tomates e alfaces.

Com um sorriso de satisfação, contempla a sua cesta orgânica pronta para ser enviada a um cliente.

Goshen, graduado no famoso Instituto israelense de Tecnologia Technion, fez uma mudança brusca em sua vida após seu chefe ligar para sua casa à noite e repreendê-lo por não ser suficientemente dedicado ao trabalho, embora dedicasse ao menos 50 horas por semana à sua profissão.

No dia seguinte, este homem de 37 anos, pai de três filhos, pediu demissão e seguiu o seu sonho de produzir frutas e vegetais orgânicos.

Ele é mais um no crescente número de israelenses que entrou na fascinante indústria da alta tecnologia quando jovem, antes de abandonar empregos com boa perspectiva e bons salários para ter um estilo de vida mais adequado aos seus ideais.

E este fenômeno não é unicamente israelense.

Em muitos países tecnologicamente avançados, executivos são tentados pela aventura, pela chance de abraçar um estilo de vida mais simples e saudável, e pela "procura de si mesmo".

Mas em Israel, onde a mobilidade profissional é o padrão e o recrutamento tende a ser mais informal do que em outros lugares, o desejo por mudança é crescente, afirma Daniel Barkat, ex-executivo de tecnologia que trocou de emprego para produzir chocolate vegano.

- Estufa do Exército -"Em Israel, onde você sai da unidade 8200 (do Exército) sem uma graduação, você pode se encontrar em uma posição de responsabilidade em empresas de alta tecnologia. Mas depois de alguns anos acaba querendo algo diferente", explica.

Os israelenses são recrutados para o Exército aos 18 anos e, geralmente, entram em uma universidade após a conclusão do serviço militar.

Em um país onde a maioria dos jovens realiza o serviço militar obrigatório - 32 meses para homens e dois anos para mulheres - a 8200 é considerada a "via rápida" para um emprego no lucrativo campo tecnológico.

Muitos de seus veteranos saíram para trabalhar em startups de tecnologia da Internet.

Recrutado para um trabalho de gerenciamento em uma empresa de informação financeira diretamente após seu serviço militar, Barkat, agora com 29 anos, abandonou esse mundo para criar o seu negócio de chocolate.

"Aos 24 anos consegui o que adultos passam a vida inteira tentando encontrar: um trabalho bem remunerado, de prestígio e com estabilidade", afirma.

"Mas o meu trabalho era muito técnico, entediante, insignificante. E me perguntei: 'para onde vou agora?'".

Veganos, como muitos israelenses, ele e sua namorada criaram uma linha de chocolate substituindo o leite por coco e soja.

- Transição difícil -Sua companhia agora emprega 12 pessoas e seus produtos são distribuídos em cerca de 100 pontos de venda em todo o país.

A alta proporção de israelenses trabalhando de maneira forçada em empresas de tecnologia - cerca de 10% - aumenta a chance de migração precoce para outros setores, diz o consultor Daniel Haber.

A transição pode ser complicada, declara Eli Cohen, que deixou seu emprego em uma das maiores operadoras telefônicas do país para ensinar um método holístico de bem-estar combinando tai chi e qi gong em exercícios e técnicas de meditação.

"Não foi fácil no início, não funcionou", declara. "Tive que continuar trabalhando um pouco no meu campo e ao mesmo tempo aprender os segredos da minha nova vocação".

Goshen conta ter mudado suas prioridades desde que trocou de emprego.

"Antes eu tinha o carro da empresa e um ótimo salário, e hoje não sei exatamente quanto ganho, mas passo mais tempo com a minha família... e ter esse contato com o solo não tem preço".

Em Israel o desejo de retomar a espiritualidade e o contato com a terra tem uma conotação adicional de nostalgia do início do Estado judeu, diz Haber.

"Neste país sob pressão - pressão exacerbada, no caso da alta tecnologia - há a nostalgia pelos velhos tempos do kibutz, do compartilhamento, mitos fundamentais e espirituais do Estado".