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Dolarização formal na Venezuela, uma 'camisa de força' que Maduro rejeita

09/12/2020 15h35

Caracas, 9 dez 2020 (AFP) - Na Venezuela tudo, absolutamente tudo, pode ser pago em dólar: um chocolate, a gasolina, um táxi. Embora tenha sido proibido durante 15 anos, o dólar ganha cada vez mais força em um país arruinado por anos de recessão e hiperinflação.

Ninguém quer os bolívares, a desvalorizada moeda nacional.

Mas o presidente Nicolás Maduro afirmou na terça-feira que "na Venezuela não existe uma dolarização da economia porque a moeda oficial não é nem nunca será o dólar".

Ele acredita que este modelo de "dolarização das atividades comerciais foi uma válvula de escape" dentro de uma "economia de guerra e resistência" em meio a uma avalanche de sanções, que inclui um embargo de petróleo dos Estados Unidos, a quem responsabiliza pela crise.

Mais de 65% dos pagamentos em dinheiro feitos na Venezuela são em dólar, disse à AFP o economista Asdrúbal Oliveros, diretor da empresa Econoalítica.

"Na Venezuela, há uma dolarização transacional bastante avançada. Podemos chegar à dolarização financeira na qual os bancos entram", destacou.

Os bancos nacionais podem abrir contas poupança em dólar, que não rendem juros nem têm um fundo de garantia. Além disso, o Banco Central da Venezuela (BCV) proibiu instrumentos de pagamento eletrônico em moeda estrangeira.

As transações em dólar em espécie ou entre contas estrangeiras são mais frequentes.

- Dolarizar é a solução? -Mesmo que agora Maduro a descarte, seria a dolarização formal a solução para a crise?

A economia venezuelana, que enfrenta seu sétimo ano em recessão, caiu para a metade e a inflação em 12 meses fechou em novembro em mais de 4.000%, segundo o Parlamento opositor, que divulga seus próprios números devido à demora constante do BCV para publicar indicadores econômicos.

Oliveros considera que uma dolarização completa, como fez o Equador, seria uma "camisa de força" que Maduro não estaria disposto a vestir.

"É possível ter uma dolarização avançada sem renunciar a sua moeda", apontou. Maduro "nunca vai renunciar a emitir uma moeda, porque esse é um nível de liberdade muito importante para ele".

O governo perderia a capacidade de imprimir sua própria moeda, um mecanismo que hoje lhe permite pagar as despesas públicas, mesmo que ao custo de aumentar a inflação.

Oliveros explicou que o estado atual dos cofres venezuelanos, com a queda exorbitante das receitas de petróleo, impede também dolarizar os salários públicos e aposentadorias.

Portanto, a maioria da população não recebe sua renda em dólar e está excluída desta nova dinâmica, destacou.

O salário mínimo subiu para 1,2 milhão de bolívares junto a um vale alimentação por mais ou menos o mesmo valor, depois de um aumento que nunca foi formalizado no Diário Oficial. Equivale a cerca de 2 dólares, enquanto a cesta alimentícia é de quase 200 dólares, segundo a ONG Cenda.

Pablo Lucio Paredes, diretor do Instituto de Economia da Universidade São Francisco de Quito (USFQ), estimou que dolarizar "não pode resolver todos os problemas, mas que fornece uma base de estabilidade para conseguir enfrentá-los".

É um processo necessário para "países que lidam de forma indisciplinada no campo monetário e fiscal (...), onde a confiança na moeda local foi perdida".

jt/mr/aa/ic