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Como Isaac Newton perdeu milhões com ações apostando que faria fortuna na América do Sul

Wikimedia commons
Imagem: Wikimedia commons

10/12/2017 08h04

"Posso calcular o movimento das estrelas, mas não a loucura dos homens", disse Isaac Newton (1643-1727) após perder sua fortuna na bolha financeira criada pela especulação em torno da Companhia dos Mares do Sul- uma companhia público-privada britânica que detinha, na época, os direitos exclusivos de comercialização com a América do Sul.

A aposta no comércio com as colônias espanholas arruinou, em 1720, muitos investidores, como Newton, e deu origem ao termo "bolha".

A Companhia dos Mares do Sul (SSC, na sigla em inglês) foi fundada em 1711, supondo-se que a Guerra de Sucessão da Espanha (1701-1714) terminaria com um tratado que permitiria intercâmbios comerciais com as colônias espanholas no Novo Mundo. Até aquela época, a Espanha impedia trocas comerciais entre as colônias na América Latina e outros países.

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Do total de ações da SSC, 22,5% foram destinados à rainha britânica na época, Ana (1665-1714). Os papéis da empresa, com juros garantidos de 6%, venderam bem graças à promessa de imensas riquezas nos territórios sul-americanos.

Todo mundo havia escutado falar das minas de ouro do Peru e do México, consideradas inesgotáveis. Circulou, inclusive, um informe que assegurava que a Espanha estava disposta a conceder quatro portos nas costas chilenas e peruanas, o que aumentou a confiança no negócio.

Mas o rei espanhol Felipe 5º (1683-1746) nunca teve a intenção de admitir os ingleses em seus portos na América, e o Tratado de Utrecht, celebrado no fim da guerra, em 1713, foi menos favorável do que o esperado.

O documento dava ao Reino Unido o direito de ser o único provedor de escravos das colônias espanholas na América do Sul por 30 anos, impunha um imposto anual sobre os escravos importados e somente permitia à empresa enviar um barco por ano para comercializar com México, Peru e Chile. Mesmo assim, a popularidade das ações da empresa continuou em alta.

Quando a rainha morreu em 1714, George 1º (1660-1727) assumiu, herdou suas ações e comprou mais. Seu filho, o príncipe de Gales, não apenas foi investidor como também assumiu o comando da SSC em 1715. Com esse respaldo, além de aristocratas, políticos e comerciantes, os servos destas pessoas também puderam investir na companhia.

Primeira viagem

A primeira viagem comercial à América aconteceu em 1717 e teve êxito moderado, mas, após uma disputa familiar com o príncipe de Gales, o rei passou a comandar a SSC em 1718, gerando confiança na empresa.

Em 1720, o valor das ações da empresa disparou como resultado da proposta que apresentou ao Parlamento de se encarregar da dívida nacional, e com os rumores sobre as riquezas produzidas nas minas de Potosí, na Bolívia, e de que tratados entre Inglaterra e Espanha autorizariam o livre comércio em todas as colônias da Coroa espanhola.

Além disso, dizia-se que os moradores do México esvaziariam suas minas de ouro em troca de produtos feitos com algodão e lã, algo que os britânicos podiam prover com abundância. Em resumo, os mercadores da SSC se tornariam os mais ricos da história.

Na Câmara dos Comuns do Parlamento britânico, apenas um membro se manifestou contra essas ideias e, mesmo que na Câmara dos Lordes vários tenham também tenham se posicionado assim, eles foram comparados à figura mitológica de Cassandra, aquela que tinha o dom da predição, mas a maldição de não acreditarem nela.

O pesadelo de Newton

Newton era reconhecido como o principal cientista da época e admirado por haver definido as leis da gravidade, além de ser o chefe da Casa da Moeda britânica. Mas, pelo visto, ser um gênio não é uma garantia de sucesso na bolsa.

Ele saiu-se bem com seus investimentos inicialmente. Comprou ações da SSC em fevereiro de 1720, quando seu valor era de cerca de 175 libras (atualmente, 24.170 libras) e as vendeu em maio por quase o dobro. Se tivesse ficando com os lucros, estaria entre os que enriqueceram com a bolha.

Mas ele se deixou levar pela onda produzida por uma campanha de marketing extremamente efetiva impulsionada pelo fato de que o governo queria trocar a dívida soberana por ações da SSC. Os detentores de títulos do governo se converteram em acionistas da companhia, e esse nomes da elite conferiram à ela uma aparente legitimidade que atraiu muitos outros compradores.

A ambição cegou o público e ocultou a realidade. Em questão de meses, o preço da ação passou de 100 libras para mil libras, apesar de isso não se refletir nos ganhos da companhia: a única ação razão da alta era que alguém estava disposto a pagar mais pelos papéis.

Fim de festa

Em setembro daquele ano, o mercado entrou em colapsou, e as ações da SSC caíram, levando muitos investidores à ruína e provocando estragos na fortuna de Newton. A Câmara dos Comuns ordenou uma investigação que mostrou que ao menos três ministros haviam aceitado suborno para especular e inflar o preço dos papéis.

A SSC sobreviveu até 1853, depois de vender a maioria de seus direitos ao governo espanhol, em 1750. Entre 1715 e 1731, foi responsável pelo transporte de aproximadamente 64 mil escravos africanos, para se ter uma dimensão de suas atividades.

Mas claro que nem todos investidores saíram perdendo. O compositor anglo-alemão George Handel, que passou a maior parte da vida em Londres, está entre os que tiveram sucesso. Ele comprou ações em 1716, mas as vendeu a tempo.