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Esforço em tentar aprovar reformas gera 'bônus de confiança' para o Brasil em Davos

Marina Wentzel - De Davos (Suíça) para a BBC Brasil

De Davos (Suíça) para a BBC Brasil

24/01/2018 15h15

Em meio à resistência doméstica para conseguir aprovar reformas, o governo brasileiro foi elogiado por líderes no Fórum Econômico Mundial de Davos por medidas econômicas e sociais na tentativa de promover a retomada do crescimento.

O secretário-geral da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE, o chamado "clube dos países ricos"), Ángel Gurría, disse acreditar que o país está conquistando um "bônus" com o desempenho, enquanto o fundador do Fórum, Klaus Schwab, saudou Temer por o que chamou de "agilidade".

"Acredito que o processo de reformas internas está mudando as expectativas sobre o Brasil para o futuro, porque temos evidência de que existe uma espécie de 'bônus de confiança'", afirmou Guerría. "Essas reformas que já foram feitas e as que ainda estão por serem feitas mudaram o perfil do Brasil."

Temer conseguiu aprovar a reforma trabalhista e um teto para gastos do governo, mas, depois de usar capital político para sobreviver a duas denúncias do Ministério Público Federal (MPF) contra si, tem tido dificuldade em conseguir base de apoio para a principal reforma, a previdenciária.

Em Davos, o fundador Klaus Schwab se dirigiu a Temer após o presidente brasileiro discursar no plenário, afirmando que emplacar um pacote de reformas "tão amplo e tão extenso em tão pouco tempo" é uma "mensagem de otimismo".

"O que o Brasil conseguiu é excepcional e está gerando muito otimismo. Quando se vê o que se pode alcançar em pouco tempo, quando se tem a visão correta e também tem a força correta, ou a vontade, a agilidade, para alcançar as reformas como você conseguiu", afirmou Schwab.

Outra liderança que reforçou o discurso simpático a Brasília foi o português José Manuel Barroso, ex-presidente da Comissão Europeia e presidente do banco Goldman Sachs.

"Nós temos acompanhado com interesse as reformas e estamos confiantes no crescimento do Brasil neste ano, perto dos 3%. Conhecemos as dificuldades, mas confiamos na capacidade de ultrapassar essas dificuldades."

"Eu pessoalmente entendo que as reformas em curso fazem sentido para modernização do país, seja a reforma trabalhista, seja a reforma da Previdência, que está discussão".

Apesar dos elogios à política brasileira, o discurso de Temer não foi assistido por muitos participantes do Fórum. As últimas fileiras do teatro estavam vazias e biombos foram acomodados para dar a impressão de que o público era maior.

Schwab também, mesmo elogiando, não se esquivou de perguntar sobre os casos de corrupção no Brasil. Ele questionou se o presidente esperava ver o assunto influenciar as próximas eleições.

Temer respondeu que a corrupção é um assunto que será debatido naturalmente e que as instituições e os poderes operam com liberdade e distinção.

Investidores

José Manuel Barroso acrescentou que investidores estão de olho nas reformas em curso no Brasil para garantir a "sustentabilidade das finanças públicas, da Previdência", argumentando que a modernização da administração pública e da educação é bom para o investimento e o "aumento da confiança."

Tanto Gurría quanto Barroso tiveram encontros bilaterais com Temer na tarde desta quarta-feira e discutiram a reforma da Previdência. Ambos se referiram ao aumento de confiança gerado pelo empenho em cumprir as promessas.

O secretário-geral da OCDE disse que o país está em clara recuperação e confirmou que espera a aprovação da reforma da Previdência para 20 de fevereiro.

Barroso, por sua vez, comparou o Brasil a Portugal. "O ritmo, a extensão dessas reformas, isso compete ao sistema democrático brasileiro decidir, mas eu gostaria que acontecesse agora".

"Se é para fazer, mais óbvio fazer agora, porque é ano de eleições e sabemos que são anos em que há a tentação de se adiar as coisas, e quem perde é a economia", avaliou.

"Pessoalmente entendo que as reformas em curso são para a modernização do país. Nós em Portugal fizemos uma reforma que foi na época muito discutida, mas (em torno da qual) hoje há um consenso, porque é uma forma de garantir a sustentabilidade de médio prazo da Previdência e ajudar sobretudo os que mais necessitam."

O otimismo dos líderes contrasta com a real resistência interna enfrentada por Temer para angariar um número necessário de votos e aprovar dentro do prazo de fevereiro sugerido.

As reformas enfrentam resistência de diversas classes e também de parlamentares. O governo precisa de 308 votos favoráveis, mas o apoio ainda não está garantido.

Temer, por sua vez, levou a Davos o discurso de um "Novo Brasil". Em sua fala no Fórum, o presidente defendeu cinco pontos: "responsabilidade, diálogo, eficiência, racionalidade e abertura", e encerrou pedindo à plateia: "invistam no Brasil. Vocês não vão se arrepender".

Ao ser abordado pela imprensa na saída do discurso, Temer disse: "acho que o professor Schwab fez um elogio extraordinário ao Brasil. E eu senti muita atenção da plateia. Eu senti que o Brasil de volta agrada aos investidores".

Questionado sobre o julgamento em segunda instância do processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nesta quarta-feira, Temer afirmou apenas que é "vida normal" na situação brasileira.

Acesso à OECD

Gurría, da OCDE, afirmou ainda que a proposta de adesão do Brasil à OCDE - formalizada em maio passado - é promissora e falta apenas consenso para que o país entre para o "clube dos países ricos".

"Temos cinco países que chamamos parceiros-chave pela importância geográfica, econômica. O Brasil já é da família. O Brasil já é um primo-terceiro, primo-segundo, um irmão, porque já participa de 39 dos comitês, dos instrumentos, já participa no dia a dia".

Cerca de quatro anos é o tempo estimado por Gurría para que seja formalizado o ingresso do Brasil.