Destilarias querem mercado único para malte único, não 'Brexit'
(Bloomberg) -- Poucas coisas correm nas veias históricas do mercado comum da Europa tão facilmente quanto o álcool, especialmente quando se trata da Grã-Bretanha.
Depois que a empresa familiar de conhaques o levou dos vinhedos do sudoeste da França para o agito de Londres, o futuro diplomata Jean Monnet desenvolveu sua visão para o comércio livre e se tornou um dos principais arquitetos da integração europeia.
Agora, os produtores de uísque temem que o trabalho dele seja desfeito se o Reino Unido decidir, em votação, deixar a União Europeia.
As destilarias escocesas estão se juntando para manter a Grã-Bretanha unida, argumentando que uma "Brexit" ameaçaria o duramente conquistado acesso ao mercado e tornaria as doses de uísque mais caras para os consumidores do exterior justamente em um momento de queda nas exportações.
Assim como o vinho e o conhaque franceses, o uísque pode ser vendido livremente dentro dos 28 estados-membros e o peso da UE como bloco econômico mais rico do mundo lhe permite fechar acordos com os mercados emergentes com tarifas lucrativas.
"Somos muito claros, somos a favor de o Reino Unido fazer parte da UE", disse Ivan Menezes, CEO da Diageo, cujas marcas vão do Johnnie Walker a maltes individuais como Dalwhinnie e Lagavulin. "Você está em melhor posição em termos de acordos de livre comércio se você tem mais influência e a UE traz mais influência à mesa".
Além do tartan
Apesar de sua imagem associada ao tweed e ao tartan, o uísque é tudo, menos uma indústria artesanal.
O uísque é, de longe, o maior produto do ramo de alimentos e bebidas exportado pela Grã-Bretanha, com um total de mais de 4 bilhões de libras (US$ 5,8 bilhões) por ano, e emprega diretamente 10 mil pessoas em 115 destilarias na Escócia, segundo a Associação Escocesa do Uísque, com sede em Edimburgo.
A associação expressou sua preocupação em relação à saída da Escócia do Reino Unido durante a campanha do referendo da independência, em 2014, também por causa da crença de que quanto maior, melhor.
O primeiro-ministro David Cameron planeja realizar um referendo para decidir pela permanência já em junho após negociar um pacote de reformas propostas à UE, principalmente em torno do acesso a pagamentos de bem-estar social.
Com um acordo final esperado para este mês e as pesquisas mostrando que a votação poderia ser apertada, a Pernod Ricard, concorrente da Diageo, também apoia o mercado comum.
"A Pernod Ricard é uma empresa pró-Europa e está a favor da liberalização do comércio ao redor do mundo", disse Alexandre Ricard, CEO da fabricante dos uísques The Glenlivet e Chivas Regal, com sede em Paris, na quinta-feira.
Influência da Europa
Embora seja difícil calcular o custo de uma decisão pela saída, o maior medo entre as destilarias é a potencial destruição das relações comerciais do Reino Unido.
Dois terços das exportações de uísque da Diageo, por exemplo, vão para países em desenvolvimento como a Índia.
Os impostos de importação aplicados a vinhos e destilados estrangeiros na Índia estão entre os mais elevados do mundo, em 150%.
O imposto contribuiu para um declínio nas exportações globais do setor no primeiro semestre do ano passado: o volume global e a receita caíram cerca de 3% em relação a um ano antes.
A Associação Escocesa do Uísque tem trabalhado com os governos da UE e da Índia nas negociações para reduzir o imposto do país, mas teme que o progresso dessa iniciativa possa ser prejudicado pela saída do Reino Unido, disse David Frost, CEO da associação e ex-representante de políticas da UE.
De forma mais ampla, se deixasse a UE a Grã-Bretanha teria que fechar um novo acordo comercial com o restante da Europa, um processo que poderia levar anos.
Também poderia ter que renegociar do zero os pactos internacionais existentes porque a UE trabalha como uma entidade única para fins de comércio e mantém acordos com países como Coreia do Sul, México e Canadá, além de ter outro em progresso com os EUA.
"A regra básica é que é difícil colocar um valor monetário nisso, mas vai adicionar um custo a uma indústria que compete na margem", disse Brad MacKay, professor de administração da Universidade de Edimburgo, sobre a saída da Grã-Bretanha da UE. O setor "será menos lucrativo", disse ele.
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