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Investidores mapeiam estratégias após Reino Unido decidir sair da UE

Phil Kuntz

27/06/2016 16h04

(Bloomberg) -- A decisão do eleitorado britânico de sair da União Europeia quase um quarto de século após sua criação pelo Tratado de Maastricht deixou os mercados globais atordoados na sexta-feira (24). Nesta segunda (27), os investidores começaram a pensar no caminho que precisam seguir adiante.

"No fim das contas, não temos experiência sobre o que acontecerá", escreveu em relatório a clientes o diretor-gerente da Mischler Financial Group, Glen Capelo, que por anos atuou em mesas de negociação de outras instituições. "Talvez seja preciso desmontar posições de 23 anos", ele acrescentou por e-mail.

Os investidores foram pegos desprevenidos pelo resultado da votação. Mas a atividade frenética de negócios e a enxurrada de análises trouxeram à tona diversos temas. O mapa a seguir para os mercados talvez não leve a um tesouro, mas quase certamente levará aos títulos do Tesouro americano:

Ações

As Bolsas europeias provavelmente serão as mais prejudicadas.

O Credit Suisse Group AG reduziu os alvos para os índices de referência das Bolsas do Reino Unido, Europa e EUA no fim do ano em 6,5%, 14% e 7,5%, respectivamente.

O Morgan Stanley projeta quedas de até 19% para o índice FTSE 100 da Bolsa da Inglaterra e de até 14% para o índice Euro Stoxx 50, com as maiores perdas para ações do setor financeiro e de consumo discricionário e desempenho superior para as ações do setor de saúde.

Jeff Kleintop, diretor global de estratégia de investimentos da Charles Schwab & Co., prevê uma cadeia de acontecimentos pós-Brexit: a busca por aplicações seguras deve valorizar o dólar, empurrar para baixo os preços das commodities, reduzir os lucros das empresas e levar à depreciação do yuan, uma vez que o recuo das exportações para a Europa (maior cliente dos exportadores chineses) possivelmente "renovará preocupações com um pouso forçado da economia da China."

Em um relatório de tom mais esperançoso, Kleintop comparou o movimento recente àqueles que sucederam o terremoto no Japão em março de 2011, o impasse político nos EUA envolvendo o teto da dívida em agosto daquele ano e a recessão na zona do euro em 2012 desencadeada pela crise de dívida.

Nas três ocasiões, as bolsas caíram pelo menos 11%. "É importante para investidores de longo prazo lembrarem que, em cada uma dessas situações, as bolsas se recuperaram para os níveis anteriores ao choque em três ou quatro meses", escreveu Kleintop.

Câmbio

Os maiores riscos nos mercados de câmbio envolvem produtores de commodities e economias que dependem do Reino Unido. Os maiores beneficiários provavelmente serão os tradicionais portos seguros dólar e iene.

Para Lee Ferridge, responsável por estratégia macroeconômica para América do Norte da State Street Global Markets, em Boston, a moeda japonesa pode se valorizar para 95 ienes por dólar, vindo de 102 na sexta-feira. A libra esterlina tende a recuperar parte das perdas e voltar à casa de US$ 1,40, ele estima.

O Deutsche Bank AG mantém a projeção pessimista para o euro no fim do ano, de US$ 1,05, de acordo com relatório de George Saravelos, co-responsável por pesquisa global de câmbio do banco em Londres. O euro desabou 2,4% na sexta-feira para US$ 1,1109.

O rand sul-africano está entre as moedas emergentes mais vulneráveis por causa dos laços financeiros com o Reino Unido. Já o rublo pode se beneficiar do isolamento causado pelas sanções à Rússia, afirmaram analistas do UniCredit SpA antes da votação. Já o Morgan Stanley recomendou a venda de dólares australianos em cruzamento com ienes.

Investidores que apostaram na queda das moedas de países do Leste Europeu antes da votação agora esperam desvalorização adicional. Peter Schottmueller, responsável por renda fixa internacional e de mercados emergentes da Deka Investment GmbH, em Frankfurt, vendeu a descoberto o zloty polonês e a moeda brasileira antes do referendo.

Ele fechou a posição em reais na abertura do pregão na sexta-feira e mantém a aposta pessimista na Polônia, que tem no Reino Unido seu terceiro maior mercado de exportação.

Títulos de dívida

O Credit Suisse afirmou em relatório que vê o rendimento dos títulos do Tesouro americano (Treasuries) com prazo de 10 anos "ameaçando as mínimas históricas, enquanto os rendimentos dos títulos de Alemanha e Japão vão avançar em território negativo jamais navegado."

O rendimento das Treasuries de 10 anos caiu 19 pontos-base na sexta-feira para 1,56%, após encostar no menor patamar em registro de 1,38%, alcançado em 2012.

"As carteiras de renda fixa devem limitar a realização de lucros neste mês", escreveu Jim Vogel, estrategista-chefe de juros da FTN Financial, em Memphis, nos EUA.

"É alta a probabilidade de uma contraparte precisar e estar disposta a pagar mais por itens atuais da carteira nas próximas semanas." Ele recomenda a compra de títulos municipais para escapar da volatilidade porque os fundamentos evoluem mais lentamente para governos locais.

"Esperamos que as Treasuries superem os Bunds (títulos do governo alemão) durante o próximo mês", afirmaram em relatório Michael Schumacher e Boris Rjavinski, analistas sêniores da Wells Fargo Securities.

"Os Bunds praticamente acompanharam as Treasuries desde o fechamento das urnas no Reino Unido, mas temores de fragmentação da União Europeia devem proporcionar às Treasuries maior força relativa."

Por ora, o rendimento das Treasuries e dos Gilts (títulos do governo britânico) estão caindo, como ocorreu após o rebaixamento da classificação de risco dos EUA em 2011, com os Gilts puxando o movimento. "Os Gilts devem ficar à frente das Treasuries? Duvidamos. Ainda esperamos saída de capitais do Reino Unido, provavelmente na direção dos EUA", eles escreveram.

Mercados emergentes

O impacto sobre os países em desenvolvimento será modesto, segundo Geoffrey Dennis, estrategista-chefe global para mercados emergentes da UBS Securities. Ele pode reavaliar o peso ligeiramente maior que o proporcional em ações da Europa, do Oriente Médio e da África por causa da parcela importante de exportações ao Reino Unido por países como Turquia, Grécia e África do Sul.

"As pessoas no Reino Unido terão menos dinheiro para gastar fora do país", ele disse por telefone de Boston. Países asiáticos, que neste ano têm registrado desempenho inferior ao de seus pares nos mercados emergentes, podem experimentar entradas de capital, ao passo que investidores fogem da turbulência na Europa, ele acrescentou.

Viktor Szabo, um dos responsáveis por cerca de US$ 10 bilhões em dívidas de mercados emergentes na Aberdeen Asset Management Plc, em Londres, entende que os mercados emergentes logo voltarão ao ritmo costumeiro.

A dívida de alto rendimento de países emergentes pode até se beneficiar de um ambiente de juros mais baixos por mais tempo na Europa. "Podemos ver mais influxos para dívidas emergentes", ele prevê.

Schottmueller, da Deka, afirma buscar ativos com menor correlação possível com Brexit. "Aumentamos nossa posição em Gazprom porque há pouca ligação entre uma estatal da Rússia e Brexit, compramos dívidas da Argentina e da Indonésia e fechamos nossa recomendação de venda a descoberto do real", ele contou.