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Comunista gera frenesi de medicamentos baratos no Chile

Laura Millan Lombrana

13/07/2016 16h19

(Bloomberg) -- No Chile, país onde a livre iniciativa é quase sagrada, um político comunista está sacudindo o sistema ao inspirar governos locais a entrar no setor farmacêutico e oferecer preços com descontos para uma população cada vez mais cansada das grandes redes de farmácias.

Cinquenta e oito governos municipais abriram as chamadas farmácias "populares" nos últimos 12 meses e outras dezenas seguirão o exemplo nos próximos meses, segundo o administrador local Daniel Jadue. Recoleta, bairro de classe média de Santiago administrada por Jadue, foi a primeira a abrir uma unidade. Seus descontos -- que chegam a 78 por cento na comparação com os preços dos remédios vendidos nas farmácias controladas por empresas como Walgreens Boots Alliance e Fomento Económico Mexicano -- foram um sucesso imediato. Até mesmo conselhos locais de áreas ricas, que normalmente desaprovam qualquer intervenção estatal, agora estão adotando o modelo.

"As farmácias colocaram seus próprios benefícios econômicos à frente do bem-estar das pessoas", disse Jadue. "Nossas farmácias municipais estão começando a mudar o modelo das farmácias do Chile".

Abusos percebidos

A exemplo da indignação com a alta dos preços dos medicamentos observada nos EUA, no Reino Unido e na China, os chilenos vêm se queixando há anos dos abusos percebidos de um setor de farmácias comerciais dominado por apenas três empresas. Uma decisão judicial de 1995 e outra de 2012 definiram que as empresas Farmacias Ahumada, Farmacias Cruz Verde e Salcobrand formaram cartel para aumentar os preços farmacêuticos. Essa combinação de preços impôs uma carga pesada às famílias, que já enfrentam custos elevados com a saúde.

As farmácias municipais estão rompendo uma tradição no Chile, país onde a economia de livre mercado foi consagrada pelos chamados Chicago Boys durante a ditadura de Augusto Pinochet. As farmácias podem vender a um preço menor que o da concorrência comercial comprando tanto genéricos quanto medicamentos de marca mais baratos do sistema de saúde estatal e negociando diretamente com as empresas farmacêuticas. As vendas são restritas a pessoas portadoras de receitas que valem pelo menos seis meses.

Por enquanto, estas farmácias representam pouca ameaça às três maiores redes. A Farmacias Ahumada é de propriedade da Walgreens, que tem uma receita anual global de US$ 118 bilhões, enquanto a Femsa comprou a Cruz Verde no ano passado. A Salcobrand pertence à família Yarur, de magnatas do setor bancário. Havia um total de 2.955 farmácias no Chile até dezembro de 2014.

Ainda assim, as farmácias municipais poderiam ser transformar em problema para os grandes conglomerados porque um terço dos 346 conselhos locais do Chile planeja ter sua própria unidade em até um ano. A Ahumada e a Salcobrand preferiram não comentar a respeito do impacto sobre suas vendas.

A Cruz Verde deu boas-vindas à concorrência, mas defendeu, em resposta por escrito a perguntas, um campo de jogo nivelado para as farmácias no tocante à aquisição de medicamentos. A empresa disse também que as farmácias de bairro, menores e independentes, poderão sofrer com a nova concorrência porque tendem a estar nas mesmas áreas das farmácias municipais.