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Análise: Missão do Fed está cumprida. Por que não mudar?

Conor Sen

19/07/2016 12h39

(Bloomberg) -- A missão do Fed está cumprida -- a menos que exista algum motivo oculto. Na quinta-feira, vimos os pedidos de seguro-desemprego próximos do menor patamar em 40 anos. Ou seja, o mercado de trabalho está prosperando. Os dados de sexta-feira mostraram que a inflação dos preços ao consumidor continuou se firmando e que as vendas do varejo estavam fortes.

Tudo isso mostra que a missão foi cumprida. O nível forte e crescente de expansão dos salários e os declínios contínuos da mão de obra inativa sugerem que o pleno emprego, em sua essência, foi alcançado. Até mesmo o U6, o indicador de desemprego e subemprego de base mais ampla, atualmente está nos mesmos níveis do verão e do outono de 2004, quando o Fed iniciou um agressivo ciclo de aperto dos juros.

A maior parte dos indicadores do núcleo de inflação -- núcleo do CPI, Cleveland Median CPI, média aparada de inflação de Cleveland -- estão em 2 por cento ou acima disso. A única exceção, é claro, é o indicador de inflação preferido do Fed, o núcleo do PCE. Se o Fed adota políticas monetárias para alcançar o duplo objetivo de pleno emprego e inflação a 2 por cento, que é sua função e o que o banco central comunica ao público, então o caminho está claro.

Contudo, é questionável que este tenha sido realmente o objetivo do Fed nos últimos meses. A impressão, cada vez mais, é que o Fed está cedendo às taxas de mercado no mercado de títulos do Tesouro e aos sempre nebulosos temores globais. Mas que mal há se o Fed está "atrás da curva"? Vimos isto também na semana passada: os relatórios de lucros de JPMorgan, Wells Fargo e Citigroup mostraram que o crescimento dos empréstimos dos bancos foi arrastado pelas taxas de juros continuamente baixas.

Essa política monetária dovish é um padrão previsível dos bancos centrais cujos anos de formação incluíram as crises de 1997-98 e de 2007-9. Trata-se de uma mentalidade orientada a evitar as crises pelas quais passamos e entender as mais que desconhecidas crises do futuro. Mas a política de taxa de juros artificialmente baixa tem custos claros.

Primeiro, embora ninguém chore pelos bancos, os juros ultrabaixos continuam pressionando os lucros bancários, enquanto as margens de juros líquidas continuam sendo comprimidas. É difícil argumentar que suprimir os lucros dos bancos é a forma de estimular a expansão do crédito. Segundo, os juros baixos prejudicam os fundos de pensões e as empresas de seguros, que estão entre os principais compradores de produtos de renda fixa. Talvez as taxas de juros baixas reduzam o risco de uma crise financeira, mas aumentam o risco de uma crise de solvência dos fundos de pensões. Como nós passamos pela primeira, mas não pela segunda, é dado mais peso à primeira. E se as empresas de seguros não tiverem um retorno adequado sobre seus investimentos, elas serão forçadas a aumentar os custos e a reduzir a oferta de produtos aos clientes, incluindo famílias.

E são as famílias, talvez surpreendentemente, que poderiam estar sofrendo o impacto da política monetária do Fed neste ponto do ciclo. Logo no início da recuperação, as taxas de juros baixas permitiram que as famílias refinanciassem as dívidas de alto custo e respaldassem o mercado imobiliário. Agora, contudo, a dívida de alto custo foi refinanciada e os maiores problemas do mercado imobiliário são a oferta insuficiente e o déficit de mão de obra para a construção. As taxas de juros baixas significam, simplesmente, que as famílias precisam economizar mais para a aposentadoria do que se as taxas de juros fossem mais elevadas, o que diminui o consumo.

Talvez o mais perturbador seja o impacto da atual política monetária sobre o dólar e, portanto, a troca que está sendo feita entre famílias e corporações. Como explica meu colega Matt Busigin, ao manter as taxas de juros nos EUA mais baixas, o Fed está mantendo o dólar mais fraco do que seria sem essa política. Isto torna os produtos importados mais caros para os consumidores dos EUA. E a quem o dólar fraco ajuda? Às corporações americanas que vendem no exterior, que também tiram proveito das taxas de juros baixas ao tomarem empréstimos para o financiamento de recompras de ações. A atual política monetária, efetivamente, transfere riqueza das famílias americanas para as corporações multinacionais. É isso, realmente, o que o Fed deseja?

Essa coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.