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Eleições municipais são primeiro retrato após impeachment

Anna Edgerton e Samy Adghirni

30/09/2016 15h02

(Bloomberg) -- Elói Pietá, candidato a prefeito de Guarulhos (SP) pelo PT, não faz segredo de sua decisão de se distanciar do próprio partido nas eleições municipais deste domingo. Enquanto tenta conquistar eleitores após a queda da presidente Dilma Rousseff, Pietá retirou de seu material de campanha todos os símbolos tradicionais da sigla.

A estrela vermelha que antigamente era emblema orgulhoso de suas políticas populistas de esquerda hoje é associada por muitos brasileiros às acusações de má gestão econômica e corrupção que levaram ao impeachment de Dilma e ao indiciamento do ex-presidente Lula.

"Candidatos que não tinham nada a ver com isso acabam sofrendo as consequências", disse Pietá, que concorre a um terceiro mandato como prefeito de Guarulhos, a segunda maior cidade do estado de São Paulo. "Eu não sou um candidato do partido. Meu partido é a população."

As eleições de domingo em mais de 5.500 municípios delinearão o primeiro retrato da política brasileira após o impeachment. O pleito também indicará quais partidos saem na frente na corrida presidencial de 2018, segundo Cristiano Noronha, vice-presidente da consultoria Arko Advice.

"O PT havia conquistado parte da classe média, mas com o desgaste que o partido sofreu, há espaço para o PMDB ou PSDB reconquistar esses votos", disse Noronha a respeito dos dois principais partidos de centro-direita do país. "São as duas legendas que têm chance de vitória no maior número de capitais. Isso faz com que possam chegar com muita força em 2018."

Em comparação com 2012, o PT coloca em campo neste ano pouco mais da metade do número de candidatos a cargos municipais, segundo dados do TSE. Enquanto o PT ganhou eleições para prefeito em quatro das 27 capitais nas últimas eleições, a expectativa é que desta vez conquiste apenas uma prefeitura, em Rio Branco (Acre), disse Noronha.

O PT não é o único partido a perder popularidade por causa da Lava Jato, que investiga políticos de todas as tendências e deixou muitos brasileiros desiludidos com o sistema partidário. Os efeitos da Lava Jato podem preparar o caminho para algum personagem de fora do sistema ou algum líder ligado às igrejas evangélicas em ascensão no país, de acordo com Carlos Pio, cientista político da Universidade de Brasília.

"A Lava Jato ainda pode fazer estrago em todos os partidos, e eu não vejo clara renovação de líderes até 2018", disse Pio. "O quadro político até lá continuará pulverizado, com nenhum partido capaz de formar uma bancada grande e nenhum líder com grande capacidade de mobilização."

Troféus eleitorais

O controle das capitais tornou-se um elemento ainda mais importante depois da decisão do STF do ano passado que proibiu doações de empresas. A medida fez minguar orçamentos de campanha, segundo Noronha. Os partidos que prevalecerem neste mês de outubro terão acesso a uma máquina política importante antes da campanha presidencial em 2018.

O troféu eleitoral mais cobiçado é São Paulo, maior cidade do Brasil. O atual prefeito do PT, Fernando Haddad, está em quarto lugar nas pesquisas. Sondagem do Ibope publicada esta semana no jornal O Estado de S. Paulo mostra que quase metade dos eleitores em São Paulo dizem que não votariam nele de jeito nenhum.

Candidatos

O favorito nas pesquisas é João Doria, um famoso empresário que concorre pelo PSDB. Apesar de a escolha de Doria ter irritado alguns membros do partido, ele é um aliado próximo do governador Geraldo Alckmin, candidato potencial em 2018.

Aécio Neves, líder nacional do PSDB, que perdeu para Dilma por uma margem apertada em 2014, previu que seu partido conseguirá o maior crescimento nesta eleição já que tem 30 por cento de candidatos a mais em cidades de médio porte do que nas eleições anteriores, em 2012.

Com várias correntes ideológicas e capacidade de costurar alianças locais, o PMDB do presidente Michel Temer tradicionalmente domina as eleições municipais. O partido espera ter bom resultado novamente, apesar do fato de muitos de seus caciques estarem sob investigação da Lava Jato.

Mas, diante do desencanto generalizado com os partidos estabelecidos, outros grupos buscam faturar em cima desse cenário de desordem. Entre eles está o PRB, fortemente ligado a igrejas evangélicas. Pesquisas mostram o senador Marcelo Crivella liderando com folga a corrida pela prefeitura do Rio de Janeiro. Seu colega de partido Celso Russomanno está na disputa por São Paulo.

Muitos eleitores e até mesmo alguns políticos defendem uma reforma generalizada do processo eleitoral. Pietá, candidato do PT em Guarulhos, disse que as investigações de corrupção e o trauma do impeachment de Dilma criaram um alto grau de incerteza.

"Hoje para se eleger prefeito você precisa levar em conta uma realidade em que todo o sistema partidário do país está em crise", disse Pietá. "A verdade é que os partidos hoje se descolaram da população."