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Análise: Ronco da Ferrari não será tão sedutor na era elétrica

Chris Bryant

08/11/2016 10h50

(Bloomberg) -- Além da cor vermelha, o ronco ensurdecedor de uma Ferrari é o que deixa os fãs babando -- e dispostos a desembolsar até US$ 2 milhões para comprar uma. (Os candidatos podem até escutar um clipe de som do motor V12 no site da Ferrari).

Mas os investidores devem avaliar se os barulhentos motores de combustão da Ferrari não são uma possível desvantagem.

Por enquanto, a companhia avança em velocidade de cruzeiro. Superou as expectativas de lucro do terceiro trimestre e elevou a meta dos resultados para o ano cheio. Os resultados elevaram as ações em mais de 5%, o que significa que elas estão novamente acima do preço do IPO, de US$ 52 (47 euros).

Mas, assim como seus carros, as ações da Ferrari não são baratas. Elas são negociadas a 25 vezes os lucros estimados de 2016, aproximadamente o triplo do alcançado pela BMW e não muito distante de uma empresa de produtos de luxo como a Prada.

Como vende menos de 10 mil carros por ano, a Ferrari não precisa cumprir as mesmas regras rígidas para emissões que os fabricantes de veículos maiores como a BMW. Mas isso não significa que a eletrificação não seja uma ameaça.

O planeta está esquentando mais rapidamente do que se temia e os efeitos estão se tornando evidentes até mesmo para os céticos. Por isso, existe o risco de os motores de combustão começarem, de uma hora para outra, a ser encarados como ultrapassados. E o que é pior: o ronco de uma Ferrari nas ruas de Londres ou de Los Angeles pode algum dia gerar sentimentos de hostilidade, e não de boa vontade ou inveja. Lembra do cigarro nos restaurantes?

O CEO Sergio Marchionne diz que a maioria ou todos os carros da Ferrari serão "hibridizados" a partir de 2019, o que significa que terão motores de combustão e elétricos. Mas ele afirmou que a fabricação de uma Ferrari totalmente elétrica seria "quase obscena" porque os carros elétricos são silenciosos demais.

Marchionne não é bobo. Seus clientes -- muitos deles donos de mais de uma Ferrari -- sem dúvida pensam exatamente da mesma forma. O problema é que até mesmo os gostos dos indivíduos velhos e ricos mudam. O Blackberry era indispensável até deixar de sê-lo.

O motor de combustão já perdeu uma vantagem em relação aos carros elétricos: a velocidade. A nova versão do Tesla Model S vai de 0 a 96,5 km/h em apenas 2,5 segundos, o mesmo que o Bugatti Veyron e a LaFerrari, da Ferrari.

Como todos os veículos a bateria têm torque instantâneo, presume-se que muitos carros elétricos serão capazes de algo similar. Porsche, Mercedes-Benz e Audi estão lançando modelos elétricos de luxo. A velocidade pode vir a se commoditizar.

É claro que a Ferrari provavelmente é capaz de construir um carro elétrico, mas isso elevaria o gasto com pesquisa e desenvolvimento e prejudicaria o crescimento dos lucros. Em cerca de 20% das vendas, o gasto da Ferrari com pesquisa e desenvolvimento já é proporcionalmente mais elevado que o de suas rivais porque seus volumes de venda são muito menores.

Uma repentina mudança no setor também poderia prejudicar as vendas de novos carros da Ferrari porque os clientes teriam a preocupação de que seus veículos com motores de combustão não manteriam seus altos valores residuais. A Ferrari também ganha dinheiro vendendo motores de combustão para a Maserati, negócio que respondeu por cerca de 6 por cento de suas receitas no ano passado.

Se tudo isso soa pessimista demais, veja o que dizia o prospecto do IPO da Ferrari:

"As regras governamentais podem aumentar nossos custos para projetar, desenvolver e produzir nossos carros e afetar nosso portfólio de produtos. A regulação também poderá resultar em uma mudança de personalidade ou das características de desempenho dos nossos carros, o que pode torná-los menos atraentes para os nossos clientes.

Nós prevemos que a quantidade e a abrangência dessas regulações, e o efeito delas sobre a nossa estrutura de custo e a nossa linha de produtos, aumentarão significativamente no futuro."

As ações da Daimler e da BMW caíram porque os investidores temem que elas enfrentarão custos altos para passar dos veículos a gasolina para os elétricos. A marca do cavalo empinado pode ser mais uma a sofrer um revés.

Essa coluna não reflete necessariamente a opinião da Bloomberg LP e de seus proprietários.