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Análise: Uber tenta trabalhar com e contra Trump

Timothy L O'Brien

31/01/2017 12h57

(Bloomberg) -- As grandes empresas dos EUA precisam se acostumar à vida na Trumplândia e se ajustar a uma nova realidade: os líderes empresariais terão de fazer mais do que apenas administrar à distância os comentários aleatórios no Twitter do presidente Donald Trump sobre onde devem estar os empregos e as fábricas.

Um exemplo notável é o do Uber, aplicativo de caronas e proeminente startup do Vale do Silício.

Como muitas companhias americanas, o Uber conta com milhares de imigrantes ambiciosos e trabalhadores para ganhar dinheiro. O fundador e presidente, Travis Kalanick, enviou uma mensagem tranquilizadora no sábado a seus funcionários, afirmando que sua equipe de "Operação de Pessoas" já havia identificado uma dúzia de empregados afetados pelas novas restrições da Casa Branca a viajantes e imigrantes de sete países predominantemente muçulmanos e que iria oferecer a eles assistência em questões de imigração.

Kalanick também comentou que a ordem executiva de Trump "tem implicações bem mais amplas porque também afeta milhares de motoristas que usam o Uber e vieram dos países listados, muitos dos quais se afastam por períodos longos para voltar para casa para visitar suas famílias."

O Uber afirmou que estava tentando identificar todos esses motoristas e que iria compensá-los nos próximos três meses "para ajudar a mitigar parte do estresse financeiro e das complicações para sustentar suas famílias e colocar comida na mesa."

Essa postura se assemelha às medidas que outras companhias -- incluindo Netflix, Google, Microsoft, Facebook, General Electric e minha empregadora, Bloomberg LP - tomaram para apoiar funcionários afetados pelo veto à imigração. Kalanick falou por todas as empresas quando comentou com funcionários do Uber "que permitir que gente do mundo inteiro venha para cá e faça da América seu lar tem sido de modo geral a política dos EUA desde sua fundação."

No entanto, Kalanick e Uber enfrentam questões adicionais. A companhia - startup inovadora, de rápido crescimento e notável em muitos aspectos - também se meteu em uma série de confusões de relações públicas ao longo dos anos (como Kalanick se gabar de atrair beldades, minimizar as preocupações de passageiras quanto à segurança, o quase indecifrável "preço dinâmico" e a atitude militante no combate a críticos).

O Uber também é acusado de tirar vantagem de seus motoristas, negando-lhes benefícios e tratando-os como recurso dispensável em sua marcha para dominar o setor de transporte individual. O Uber combateu tentativas de sindicalização dos motoristas e de maior regulamentação, argumentando que cria oportunidades de renda e que se esforça para melhorar as condições de trabalho.

Este era o pano de fundo no sábado à noite, quando taxistas no Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em Nova York, fizeram uma greve de uma hora para protestar o veto à imigração de Trump. Já o Uber decidiu continuar enviando motoristas ao JFK. Houve enorme reação negativa nas redes sociais e algumas pessoas sugeriram que a melhor forma de protesto era apagar o aplicativo do Uber de seus smartphones (dando origem à hashtag #DeleteUber no Twitter).

A carta atenciosa de Kalanick aos funcionários do Uber, reproduzida no Facebook no sábado e no Twitter no domingo, talvez tenha atenuado as preocupações dos partidários do #DeleteUber. Mas a mensagem destacou outro fato: Kalanick faz parte do conselho de assessores econômicos de Trump, um painel que inclui outros líderes corporativos e tem a missão de dar conselhos sobre economia ao presidente.

No Twitter, Kalanick garantiu aos funcionários e observadores do Uber que pretendia usar seu papel no conselho para "defender o que é certo".

O que é "certo" aos olhos de Kalanick e qual exatamente é o recado dele para a Casa Branca? Que qualquer veto à imigração é ruim para os negócios e ruim para os valores americanos? Que o cumprimento da lei e a estabilidade das expectativas também são bons para os negócios e que a abordagem caótica do governo a ambos é contraproducente e perturbadora para os líderes das empresas?

A postura que Kalanick decidir tomar vai muito além de sua posição ou da posição do Uber no panorama político e econômico. Essa decisão vai mostrar como a comunidade empresarial como um todo se comunicará com e responderá à Casa Branca em um momento em que outras instituições fundamentais -- Congresso, governos locais, agentes da lei e do judiciário, faculdades, veículos de mídia, organizações sem fins lucrativos e grupos de defesa de interesses - também definem sua relação com o governo Trump.

O fascínio de Trump com fábricas de automóveis no México e empregos no Estado de Indiana agora dá lugar a uma Casa Branca que mostra suas reais intenções.

As empresas americanas precisarão reconhecer isso e defender o que acreditam.

Esta coluna não necessariamente reflete a opinião do comitê editorial da Bloomberg LP e seus proprietários.