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Autonomia em xeque à medida que Trump nomeia novo Fed

Craig Torres

03/04/2017 14h18

(Bloomberg) -- Para quem deseja compreender o maior risco para o futuro do banco central dos EUA, uma boa ilustração é uma fotografia exibida no escritório de Jeffrey Lacker, que tem vista para um trecho turbulento do Rio James.

Na foto, o comandante do escritório regional do Federal Reserve Bank em Richmond, no Estado de Virgínia, e seus antecessores Robert Black e J. Alfred Broaddus Jr. se reúnem em frente a uma imagem em alto relevo de Carter Glass, parlamentar e coautor da Lei do Federal Reserve, de 1913. Junto com suas equipes de pesquisa, eles criaram uma cultura ao longo de 44 anos, na qual a estabilidade de preços predomina no objetivo duplo da autoridade monetária - sendo o outro o máximo nível de emprego.

A liderança em Richmond e profissionais de mentalidade semelhante nos outros 11 escritórios regionais do Fed fazem contraponto ao conselho de diretores em Washington, que sobem ao cargo por indicação política. Eles frequentemente expressam opiniões contrárias nas reuniões da instituição. Black chegou a defender uma política monetária ainda mais rígida quando o então presidente do Fed era Paul Volcker, que subiu tanto os juros para conter a inflação galopante que atirou a economia dos EUA na profunda recessão da década de 1980.

Mais recentemente, observadores do Fed têm acusado Lacker de não perceber o desafio do momento. Contudo, essa cultura distinta agora parece valiosa porque corre risco.

O presidente Donald Trump vai indicar pelo menos três diretores e talvez um novo presidente e vice-presidente para o Fed nos próximos 15 meses. Assim, a independência do escritório de Richmond é considerada demonstração de força da estrutura do banco central que Glass e o Congresso desenharam nos idos de 1913.

Guardiões da independência

Os escritórios regionais "são os guardiões da independência", disse Laurence Meyer, ex-diretor do Fed que hoje comanda a empresa de análise de políticas públicas que leva seu nome. Meyer conta que nem sempre concordou com a abordagem rígida de Lacker, mas que "essa visão precisa ser representada e ele fazia isso bem".

Lacker tem Ph.D. em economia e os investidores compreendem a opinião dele dentro do arcabouço de decisão sobre juros no Comitê de Mercado Aberto (FOMC). O medo agora é que os novos indicados não tenham qualquer arcabouço, o que pode desfazer anos de esforços do Fed para criar um sistema pelo qual os investidores compreendem o que o Fed está fazendo.

Diante da enorme transição que acontecerá no banco central, "é difícil ter muita certeza sobre a configuração ou sobre como o Fed agirá no ano que vem", disse Michael Gapen, economista-chefe para os EUA do Barclays, em Nova York.

Os novos líderes do Fed vão enfrentar diversas tendências negativas que ajudaram a alimentar o sentimento populista que colocou Trump na Casa Branca. Um índice de desigualdade social subiu em cada um dos últimos três anos. A taxa de desemprego está baixa, mas os salários não crescem muito porque a produtividade é fraca. As minorias estão enfrentando dificuldades maiores e a promessa americana de que o trabalho duro resulta em ascensão social parece cada vez mais longínqua.

Por vezes o Fed foi obrigado a escolher "entre proteger a estabilidade de preços e fazer algo que melhore a vida das pessoas comuns", disse Lacker em entrevista no escritório dele em 24 de março. "Esta é uma época realmente traiçoeira para um banco central."

Lacker, 61 anos, vai se aposentar em outubro, após 13 anos no comando do escritório do Fed em Richmond. Seu sucessor será escolhido por diretores do próprio escritório e depois precisará passar pelo crivo do conselho do Fed.