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Engenheiro começou estagiário e terminou como pária no Google

Ellen Huet

09/08/2017 11h15

(Bloomberg) -- No decorrer de apenas alguns dias, o engenheiro do Google demitido na segunda-feira por seu memorando de 3.300 palavras sobre as diferenças de gênero e a indústria da tecnologia virou ponto de convergência para quase todos: um pária para alguns, um mártir para outros.

James Damore trabalhou como engenheiro de software na sede da gigante das buscas em Mountain View até segunda-feira à tarde, quando disse ter sido demitido por "perpetuar estereótipos de gênero" em seu manifesto. O documento foi publicado internamente para os funcionários do Google no fim da semana passada e argumentava que as visões conservadoras são suprimidas no Google e que as diferenças biológicas explicam, em parte, por que há mais homens do que mulheres trabalhando em engenharia de software.

Muitas pessoas no Vale do Silício denunciaram os argumentos de Damore, inclusive o CEO do Google, Sundar Pichai, que afirmou na segunda-feira em memorando aos funcionários que o manifesto do engenheiro violou o Código de Conduta do Google e que sugerir que "um grupo de nossos colegas tem características que os tornam menos adequados biologicamente para esse trabalho é ofensivo e não está bem".

Mas outras pessoas -- principalmente de grupos de direita -- concordaram com a descrição de uma "monocultura politicamente correta" e, em particular, viram a decisão do Google de demiti-lo por expressar uma opinião impopular exatamente como algo que prova o ponto de vista dele. Julian Assange tuitou que o WikiLeaks contrataria Damore, acrescentando que "censura é para os perdedores". A Gab.ai, uma rede social de extrema direita, também ofereceu emprego a Damore, chamando seu texto de "uma bela obra de arte". Outros apoiadores levantaram mais de US$ 5.000 em uma campanha de crowdfunding para ajudar Damore a se defender de sua demissão.

Damore disse que atualmente está analisando todos os recursos legais. Ele apresentou uma queixa contra a subsidiária da Alphabet no Conselho Nacional de Relações de Trabalho dos EUA na segunda-feira alegando que foi alvo de "afirmações coercivas".

Damore explicou em um vídeo na internet que escreveu o memorando por achar que a cultura do Google precisa de uma revisão.

"Muito disso saiu de mim ao ver alguns problemas com a nossa cultura no Google, empresa em que muitas pessoas que não faziam parte desse pensamento de grupo se sentiam totalmente isoladas e marginalizadas", disse ele, em entrevista ao youtuber Stefan Molyneux. "Muitas pessoas vieram até mim e disseram: estou pensando em deixar o Google porque isso está ficando muito ruim."

No vídeo, o engenheiro de software revelou que a inspiração para criar o documento -- parcialmente redigido durante um voo de 12 horas para a China a trabalho -- veio após participação em um treinamento secreto sobre diversidade que o irritou.

"Havia muita tentativa de gerar vergonha: 'não, você não pode dizer isso. Isso é sexista.' Há muita hipocrisia em muitas coisas que diziam", disse ele, no vídeo. "Eu resolvi fazer o documento para esclarecer os meus pontos de vista."

Após terminar um mestrado em 2013, Damore entrou no Google como estagiário de verão, segundo seu perfil no LinkedIn. Ele foi contratado após o estágio e trabalhou na empresa durante cerca de quatro anos como engenheiro de software. Quando foi demitido, Damore era um funcionário nível cinco no sistema interno de classificação do Google, de 10 níveis, segundo duas pessoas com conhecimento do assunto, que pediram anonimato porque o assunto é privado.

Para entrar em contato com o repórter: Ellen Huet em São Francisco, ehuet4@bloomberg.net.

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