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O jogo de futebol sérvio baixado 170 milhões de vezes

Adam Satariano

14/08/2017 14h59

(Bloomberg) -- Durante a infância de Branko Milutinovic em Belgrado, sirenes de ataques aéreos interrompiam partidas de futebol entre amigos. "Quando tocava a sirene, tínhamos cinco a 10 minutos para chegar a um abrigo", diz Milutinovic, agora com 34 anos. "E então víamos pela janela os foguetes subindo e descendo e as coisas explodindo. Era como nos filmes."

Os bombardeios terminaram em 1999 e o ex-presidente sérvio Slobodan Milosevic caiu e foi acusado de crimes de guerra, mas o longo conflito deixou a economia do país em frangalhos. Milutinovic, que gostava de computadores, foi bem na faculdade e conseguiu um mestrado em Ciência da Computação. E então, como muitos jovens sérvios ambiciosos, ele foi embora na primeira chance que teve.

Milutinovic fugiu para Copenhague para trabalhar em um posto de baixo nível na Microsoft. O trabalho era bom, mas ele não gostava. Além disso, ele estava ansioso para voltar para Belgrado para acompanhar o pai, que estava doente.

Em 2009, juntamente com dois amigos da faculdade, Ivan Stojisavljevic e Milan Jovovic, que também tinham ido da Sérvia para a Microsoft, Milutinovic resolveu voltar. Depois de considerarem ideias diferentes, os três juntaram suas economias e criaram uma empresa de videogames e usaram um algoritmo para chegar ao nome Nordeus. Eles perceberam que o dinheiro duraria um ano ou mais nessa cidade relativamente barata e que eles sempre poderiam encontrar outro emprego no ramo de codificação se o dinheiro acabasse. "Nós não fazíamos isso para enriquecer", diz Milutinovic, que é loiro, tem uma estrutura muscular alta e nariz de boxeador. "Queríamos viver de fazer jogos."

Eles conseguiram isso e depois mais. O trio criou o "Top Eleven", um jogo de futebol que foi baixado mais de 170 milhões de vezes e que construiu uma base de seguidores entre os fãs do esporte em todo o mundo. Os usuários criam equipes recrutando e negociando jogadores -- de forma muito parecida à função de um diretor-geral de clube em uma liga importante. Um ano após o lançamento, "Top Eleven" era o jogo número 1 no Facebook, ultrapassando empresas como Electronic Arts e Zynga.

Diferentemente de muitas empresas de aplicativos que fazem sucesso e depois desaparecem, "Top Eleven" continua crescendo. Embora não seja conhecido nos EUA e em outros lugares onde a loucura pelo futebol é menor, "Top Eleven" foi um dos 10 aplicativos de jogos com melhor receita bruta em sete países, com um público particularmente forte na Europa, no Sudeste Asiático e na América Latina. No ano passado, a Nordeus gerou mais de US$ 75 milhões em receita.

"É um sucesso incrível vindo de um lugar inesperado", diz Christian Hernandez, ex-executivo do Google e do Facebook, atualmente sócio da empresa de capital de risco White Star, em Londres. "Eu o uso o tempo todo como um dos meus estudos de caso favoritos."

Se comparada a empresas como a Uber, a Nordeus é pequena. Milutinovic prefere assim. Ao contrário de muitas startups, a Nordeus tem sido consistentemente rentável desde três semanas após o lançamento de "Top Eleven". Como resultado, Milutinovic nunca recebeu dinheiro de investidores. Devido à falta de amarras financeiras, os fundadores fazem o que querem -- seja férias para todos em uma ilha grega, seja um ambicioso jogo fantasia elaborado há anos e previsto para este ano, seja a decisão de se tornarem alguns dos maiores filantropos da Sérvia. "Os capitalistas de risco te oferecem muito dinheiro e menos liberdade", diz Milutinovic. "Nós não nos preocupávamos muito com o dinheiro e continuamos não nos preocupando; e para nós a liberdade é a coisa mais preciosa."

Dirigindo para casa depois do jantar, Milutinovic parece saborear a pressão adicional de administrar a empresa mais promissora da Sérvia. Ele sabe que o sucesso pode ser fugaz, mas diz que os testes iniciais o deixam confiante de que o próximo lançamento da empresa, um jogo de batalhas fantasia chamado "Spellsouls", terá sucesso. Caso contrário, diz, a empresa economizou dinheiro suficiente para suportar alguns fracassos. "Nós nos orgulhamos de ter vindo de Belgrado, na Sérvia, do nada", diz ele. E então veio aquela palavra novamente. "Nós queríamos liberdade."

Para entrar em contato com o repórter: Adam Satariano em Londres, asatariano1@bloomberg.net.

Para entrar em contato com a editoria responsável: Daniela Milanese, dmilanese@bloomberg.net.

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