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Negociação por voz está ameaçada pelas novas regras de MiFID

Stefania Spezzati e Mark Burton

12/09/2017 13h53

(Bloomberg) -- Regulamentações abrangentes elaboradas para tornar os mercados mais transparentes ameaçam abalar os últimos bastiões da negociação de instrumentos financeiros por voz na Europa, atingindo de títulos de dívida a commodities.

Sob a Diretiva de Mercados em Instrumentos Financeiros (conhecida pela sigla MiFID II), que entra em vigor em janeiro, traders da União Europeia precisarão relatar uma série de informações para demonstrar que estão executando as negociações para seus clientes nos melhores preços e plataformas. O acompanhamento desses detalhes é mais fácil quando as transações são executadas pelo computador e não por telefone.

"A negociação por voz será reduzida a cenários nos quais permanece a maneira verdadeiramente mais eficiente de encontrar e fazer a correspondência do interesse da contraparte, a um custo", disse Svante Hedin, co-responsável por negociações de instrumentos financeiros na SEB Markets, em Estocolmo.

O impacto será sentido em mercados nos quais a negociação por voz ainda tem peso. Quase 90 por cento dos traders europeus acreditam que a negociação de dívidas corporativas vai migrar para plataformas eletrônicas, de acordo com pesquisa recente da Liquidnet Holdings. Segundo eles, a negociação por voz ou pessoalmente não desaparecerá, mas ficará bem menos frequente.

MiFID II é o cerne da legislação europeia para os mercados de valores mobiliários. As regras foram desenvolvidas logo após a crise de crédito global, visando impor transparência e remover conflitos de interesse nos mercados financeiros, afetando desde pesquisas de analistas até dark pools (volumes de ordens institucionais indisponíveis ao público).

Para as instituições financeiras, um dos maiores desafios será estabelecer sistemas para passar de um ambiente de voz para outro cada vez mais digitalizado, a fim de cumprir as exigências de reporte de MiFID II. Diversas empresas de tecnologia financeira surgiram para ajudar bancos, corretoras e gestoras de recursos a entrar em conformidade com os novos padrões.

Goldman Sachs Group e BNP Paribas estão entre os cinco bancos que, em julho, anunciaram a escolha da Droit Financial Technologies para ajudá-los a cumprir MiFID II. O Goldman, sediado em Nova York, também é investidor da Droit, que foi fundada há cinco anos e opera um software que coleta dados em tempo real e automatiza a documentação de negociações com derivativos e outros instrumentos financeiros.

'Outro empurrão'

"MiFID II dará outro empurrão em um processo que já havia começado após a crise do Lehman Brothers", disse Kevin Houstoun, presidente do conselho da prestadora de soluções eletrônicas de negociação de ativos Rapid Addition. Houstoun, que já foi um dos responsáveis pela equipe de negociação eletrônica de ações europeias do Salomon Brothers, em Londres, afirma que as regras podem comprimir as margens dos bancos, à medida que oferecem produtos mais padronizados aos clientes.

A Bloomberg LP, controladora da  Bloomberg News, oferece serviços de execução a instituições regulamentadas por MiFID II.

A Bolsa de Metais de Londres (LME), uma das últimas na Europa com operadores gritando no pregão, se prepara para as novas regras de execução, que ameaçam práticas de longa data.

Os profissionais da LME que ainda se movimentam pelo pregão e registram as transações em papel provavelmente receberão aparelhos eletrônicos para relatarem as negociações mais rapidamente. Esse procedimento talvez seja suficiente para os órgãos reguladores, mas o avanço da digitalização é preocupante, segundo Malcolm Freeman, presidente da corretora Kingdom Futures.

"Um risco da melhor execução é que leva a LME para o caminho de se tornar totalmente eletrônica, com as corretoras apenas oferecendo acesso direto à bolsa", explicou Freeman, que começou a carreira como operador no pregão em 1974. "Se isso acontecer, poderemos fechar o pregão e partir para a aposentadoria."

--Com a colaboração de Viren Vaghela