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Análise: Homem do Marlboro quer que deixemos de fumar

Elaine He e Andrea Felsted

20/09/2017 14h33

(Bloomberg) -- Quando a fabricante de cigarros Marlboro promete investir US$ 1 bilhão para que o mundo deixe de fumar, é natural encarar essa mostra de altruísmo com um certo ceticismo.

Na verdade, alguém poderia se perguntar por que a Philip Morris International quer pagar seu próprio funeral à vista ao apoiar a Foundation for a Smoke-Free World (Fundação para um Mundo Livre de Tabagismo)? Será um desejo de morte?

A resposta, claro, é não. As grandes fabricantes de cigarros estão simplesmente lendo os sinais de fumaça a respeito do futuro do setor e querem ter certeza de que continuarão de pé.

A China é uma preocupação particular, embora menor, para as gigantes internacionais minimamente presentes lá (mesmo sonhando com uma expansão futura no país). Os chineses fumam 43 por cento dos cigarros do mundo, mas o mercado do país diminuiu, desacelerando o crescimento global do cigarro em valor em 2016, segundo dados da Euromonitor International.

Mais urgente para as grandes fabricantes é o anúncio bombástico da Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA, na sigla em inglês), em julho, sobre a redução da nicotina nos cigarros. Os investidores não receberam a decisão muito bem.

Não é de admirar que as empresas estejam desesperadas atrás de alternativas, assim como a indústria automotiva europeia está apostando nos carros elétricos após ser castigada pelos escândalos de emissão do diesel. O problema é que ainda não há nenhum Elon Musk para apontar o caminho para um futuro de pulmões limpos.

O cigarro eletrônico e seus asseclas se espalharão a uma velocidade incrível até 2021, segundo a Euromonitor, mas ainda assim seu uso será muito inferior ao dos produtos tradicionais de tabaco.

O mais preocupante para o setor é saber quão rentáveis serão os novos produtos em comparação com os cigarros tradicionais. As informações sobre margens são escassas, mas a British American Tobacco oferece dados que parecem mostrar as vantagens financeiras de seus produtos de tabaco aquecido e de vapor, vendidos no Japão, na Alemanha e na Polônia.

Os dados mostram que os sistemas eletrônicos parecem muito mais rentáveis quando os cálculos de margem se baseiam nos preços de varejo. Suas margens brutas, quando analisadas dessa forma, variam de 27 por cento a 36 por cento, contra 6 por cento a 14 por cento no caso dos produtos tradicionais de tabaco.

Mas este não é um indicador muito útil das margens reais de lucro. A maior parte do preço final de venda de um maço de cigarros é constituída de impostos, mas no caso dos novos produtos essa fatia é bastante insignificante.

Desconsiderando impostos (o que deve ser feito, porque eles são pagos essencialmente pelo fumante), chega-se ao que algumas pessoas chamam de preço de venda líquido, que inclui a parte recolhida pelo varejista e o custo dos produtos vendidos. O que resta é uma medida mais útil da margem das empresas de cigarros.

A BAT não revela todos os números, portanto não podemos ser explícitos em relação ao que são essas margens com base no preço de venda líquido. Mas vemos um quadro muito mais controverso para os novos produtos do que os slides sugerem. Enquanto o glo, o produto japonês de tabaco aquecido, tem uma margem maior do que os cigarros segundo essa base, o produto polonês vaping tem uma vantagem muito menor. A margem sobre o produto vaping alemão parece significativamente menor do que a dos cigarros.

Por enquanto, as empresas de cigarros têm conseguido compensar os aumentos de impostos e o declínio nos volumes de cigarros com aumentos de preços -- que são quase invisíveis por estarem mascarados por impostos. Contudo, os impostos menores sobre produtos eletrônicos tornam mais difícil a tarefa das empresas de aumentar os preços sem que os consumidores notem.

Um dos motivos de esperança do setor é o fato de o mercado de vaping ainda estar fragmentado e muito menos regulado do que o de cigarros. As grandes fabricantes de cigarros esperam conquistar mais participação de mercado e a Philip Morris, a BAT e o restante colocarão pressão sobre a fatia que fica com os varejistas, assim como fazem com os cigarros.

Ainda assim, o futuro parece um pouco nebuloso para o Homem do Marlboro e seus amigos.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião da Bloomberg LP e de seus proprietários.