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Alguns jovens sauditas rejeitam reformas do príncipe

Vivian Nereim e Sarah Algethami

29/01/2018 16h18

(Bloomberg) -- Uma música dançante toca alto em um café de Riad. No vestíbulo, jovens mulheres com túnicas coloridas formam filas para colocar o nome na lista de espera. É o tipo de cena que torna fácil acreditar que a mudança está chegando à Arábia Saudita a uma velocidade vertiginosa.

A meia hora de carro ao sul há um mundo diferente. No centro histórico da capital, onde as orações ecoam de alto-falantes e crianças pedintes assombram os visitantes, Musid, de 23 anos, não tem nenhum elogio para a abertura social que está tomando conta do local de nascimento do Islã. "Sou contra", diz, dedilhando uma série de contas de oração na joalheria onde trabalha. "Do ponto de vista de nossos costumes, tradições e valores."

Muito mais que a metade da população saudita tem menos de 30 anos. O governante de fato do reino é apenas alguns anos mais velho que isso. E o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, que alienou centros de poder tradicionais no clero e na família real em sua tentativa de reformar o reino, coloca muitas esperanças em seus pares da geração Y, ou millennials.

São as aspirações deles que o príncipe invoca ao flexibilizar as regras religiosas. Os jovens sauditas querem apenas uma "vida normal", disse o príncipe Mohammed a investidores estrangeiros, no ano passado, declarando seu retorno à Arábia Saudita para "moderar o Islã". O governo patrocina shows que atraem multidões de ambos os gêneros; as mulheres em breve terão permissão para dirigir; e a infame polícia religiosa foi enfraquecida.

O que é 'normal'?

No entanto, muitos jovens como Musid não veem a nova cena social de Riad como normal -- e temem que, com a pressa para mudar a sociedade e a economia sauditas, eles sejam deixados para trás.

Algumas das críticas são direcionadas à agenda econômica de privatização e austeridade do príncipe Mohammed. A nova Arábia Saudita não policiará os estilos de vida como antigamente, mas também não oferecerá assistência social do berço à tumba.

"O dinheiro gasto pela autoridade de entretenimento com shows deveria ser gasto com os cidadãos", disse Rahaf, de 25 anos, que procura emprego. "Com aumentos de salário, oferta de habitação e empregos."

Manal, uma dona de casa de 32 anos, disse esperar que o príncipe abandone boa parte de seu plano. Ela está contente com o fato de que as mulheres sejam autorizadas a dirigir, mas se diz incomodada pelo gasto de dinheiro público em shows -- especialmente em um momento em que o reino trava uma guerra cada vez mais sangrenta e cara no vizinho Iêmen. "Vejo isso como provocação aos sentimentos de nossos soldados no sul, que estão morrendo todos os dias, e também como um desperdício de dinheiro."

Como outros sauditas que criticaram as políticas do governo em entrevistas, ela pediu para não ser identificada pelo nome completo para que pudesse falar abertamente.

Um estudo da empresa de pesquisas de mercado Ipsos apontou que 63 por cento dos sauditas receberam bem a decisão do governo, em setembro, de cancelar a proibição de dirigir aplicada às mulheres. E certamente há evidências de entusiasmo com as novas opções de entretenimento. Os shows, como o do compositor grego Yanni, em dezembro, estão esgotados. Os festivais de rua estão lotados.

Ainda assim, "é impossível conhecer a opinião dos sauditas, porque uma 'população' saudita é algo que na verdade não existe", disse Kristin Diwan, pesquisadora residente do Instituto dos Estados do Golfo em Washington. "A população ainda está bastante fragmentada, e o desenvolvimento é desigual."