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País com maior igualdade de gênero tem seu próprio #MeToo

Jonas Bergman e Ragnhildur Sigurdardottir

29/01/2018 12h15

(Bloomberg) -- A primeira-ministra recém-eleita da Islândia, de 41 anos, antes escritora e professora, tem três filhos e gosta de citar o filósofo John Stuart Mill.

No fim do ano passado, Katrín Jakobsdóttir se tornou a segunda mulher da história da Islândia a liderar o governo de seu país. Como presidente do Movimento de Esquerda Verde, ela prometeu acabar com os desastres financeiros que foram manchete na última década, como o espantoso colapso bancário de 2008 e o mais recente escândalo de evasão fiscal revelado no Panama Papers, que derrubou um primeiro-ministro.

Mas os delitos bancários e fiscais não são as únicas áreas que Jakobsdóttir quer corrigir. Como líder de um país acostumado a liderar os rankings das sociedades mais igualitárias do mundo em questão de gênero, ela afirma que a situação atual não é suficientemente boa.

"A igualdade de gênero é um projeto em andamento e provavelmente nunca chegaremos lá", disse em entrevista em seu escritório, em Reykjavik, na sexta-feira. "É como disse John Stuart Mill: é a desigualdade que tem as raízes mais profundas em todos nós."

#Metoo

Até na Islândia a campanha #Metoo ajudou a abrir os olhos das pessoas, disse Jakobsdóttir. Na verdade, foi uma "revolução", revelando não apenas assédio sexual, mas um mundo em que as desigualdades e os jogos de poder arraigados deixaram de ser contestados.

Jakobsdóttir diz que a decisão da Islândia, neste ano, de forçar por meio de uma lei clara que os empregadores paguem o mesmo salário a homens e mulheres que desenvolvem o mesmo trabalho foi apenas o primeiro passo.

"Se realmente quisermos alcançar a igualdade de gênero precisaremos fazer coisas radicais", disse. "Precisamos usar a lei onde não vimos avanços."

O movimento #Metoo, iniciado com revelações de abusos sexuais em Hollywood, varreu o mundo, derrubando homens que estavam no topo de suas hierarquias na política e na mídia.

Marco europeu

Jakobsdóttir, a mais jovem líder feminina da Europa, diz que os políticos precisam aproveitar o impulso e garantir que não se perca a oportunidade de realizar mudanças reais.

Como líder de uma coalizão que abarca socialistas, ambientalistas e conservadores, Jakobsdóttir preside a primeira grande coalizão da Islândia. Ela prometeu reconstruir a "estrutura pública" da ilha após anos de austeridade. Ao mesmo tempo, ela sabe que um apoio excessivo do governo poderia gerar uma nova onda de superaquecimento, considerando que a economia da Islândia cresce muito mais rapidamente do que a da União Europeia.

Populismo

O risco, como no restante da Europa e nos EUA, é de que haja uma reação populista e Jakobsdóttir diz que seu trabalho consistirá em reduzir a divisão política.

"Esse é um verdadeiro desafio da política, porque não só vemos depois da crise econômica essa preocupação crescente das pessoas com as medidas de austeridade, mas também estamos vendo uma sociedade que é mais fragmentada do que antes", disse.

"Foi por isso também que eu pensei que seria interessante criar uma grande coalizão", disse. "Temos que ficar sabendo das opiniões das outras pessoas em vez de ficar apenas na nossa própria bolha do Facebook ouvindo as pessoas que concordam conosco."