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De US$ 126 mi em bônus para a cadeia: a saga de um trader

Suzi Ring, Gavin Finch e Franz Wild

19/03/2018 14h22

(Bloomberg) -- Christian Bittar já foi um dos traders mais bem pagos do Deutsche Bank. O gênio da matemática recebeu um bônus de quase 90 milhões de libras esterlinas (US$ 126 milhões) somente em 2008. Hoje, aos 46 anos, ele está preso no Reino Unido.

Ele se declarou culpado a um tribunal de Londres, em 2 de março, por conspirar para manipular a taxa de juros de referência conhecida como Euribor. A sentença de Bittar será decidida após o término de um julgamento relacionado, no terceiro trimestre.

É um desdobramento importante na investigação de seis anos. Bittar é um dos negociadores de ativos financeiros mais famosos condenados no caso. "Não seria correto comentar neste momento", disse David Savell, advogado que representa Bittar pelo escritório londrino Locke Lord.

Quando o escândalo ganhou as manchetes após a crise financeira global, uma década atrás, o foco inicial estava nos bancos, que pagaram aproximadamente US$ 9 bilhões em multas por manipular a taxa de referência de empréstimos interbancários em Londres (Libor) e sua contraparte em euros. Em seguida, os procuradores foram atrás dos traders que conduziam a fraude, como Bittar e Tom Hayes, do UBS Group, que foi o primeiro a ser condenado no inquérito das autoridades britânicas.

O Deutsche Bank foi multado em US$ 2,5 bilhões em 2015 por não impedir a manipulação de taxas de juros e Bittar figurava notavelmente nos documentos das autoridades. Identificado como "Gestor B" pela Autoridade de Conduta Financeira do Reino Unido e como "Trader Três" pelo Departamento de Justiça dos EUA, ele foi acusado de participar de conspiração nos lances para definição da Euribor.

Bittar já era famoso no meio financeiro de Londres muito antes de o escândalo vir à tona.

Ele fez uma fortuna para o Deutsche Bank no mercado de juros de curto prazo durante o caos de 2008. Uma estratégia dele foi apostar que as taxas dos empréstimos em euros por três e seis meses subiriam mais rápido do que as taxas para operações de um mês. Deu certo quando o Lehman Brothers Holdings quebrou, em setembro, e os bancos se recusaram a conceder empréstimos a seus concorrentes a não ser por períodos curtíssimos.

Somente naquele ano, Bittar recebeu um bônus de 90 milhões de libras esterlinas. Mas não nasceu em berço de ouro. Ele cresceu no Senegal e depois cursou uma universidade de primeira linha na França, segundo duas pessoas que pediram anonimato.

Após a formatura, Bittar foi trabalhar como analista quantitativo do Société Générale em Paris, foi promovido a trader e depois contratado pelo Deutsche Bank em Londres. Mais tarde, foi transferido para Cingapura pelo banco alemão.

Mr. Basis Point

Colegas no banco o apelidaram de Mr. Basis Point (Senhor Ponto-Base) por causa das apostas em variações ínfimas nos juros de curto prazo.

Mesmo depois de enriquecer, ele continuou morando com a esposa e os filhos em uma casa em Londres modesta para os padrões do meio dele. Seu carro era discreto, assim como suas roupas. Ele chegava ao trabalho todo dia às 6:30 da manhã.

Apesar dos bônus gigantescos, ele diversas vezes insistiu com seus superiores para ganhar mais. Ele ameaçava pedir as contas e trabalhar para um fundo de hedge se suas exigências não fossem atendidas, de acordo com um ex-colega.

Mas o fim foi rápido para Bittar quando começaram as investigações sobre manipulação de taxas nos EUA e Reino Unido. Ele foi demitido em dezembro de 2011.

Seu cargo dava direito a um percentual dos lucros que ele gerava para o banco. Quando foi demitido, ele perdeu cerca de 40 milhões de euros (US$ 49,2 milhões) em ações que não podia vender. Logo após a demissão, ele foi trabalhar para o fundo de hedge BlueCrest Capital Management, mas ficou lá por pouco tempo.

No acordo de 2015, o Departamento de Justiça dos EUA afirmou que o "Trader Três" (Bittar) foi o negociador de derivativos que mais deu lucro para o banco entre 2003 e 2010.