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Opinião: Alerta da Apple deve preocupar setor de luxo

Sarah Halzack e Andrea Felsted

04/01/2019 11h05

(Bloomberg) -- Os investidores estão em alerta máximo para qualquer indicativo de que uma mudança no cenário macroeconômico possa afetar as empresas de consumo. E agora a Apple acaba de disparar um sinalizador.

A gigante da tecnologia reduziu sua projeção de receita para o primeiro trimestre na quarta-feira, afirmando que as vendas recentes na China vinham sendo muito inferiores às expectativas. Em carta aos investidores, o CEO Tim Cook disse que, segundo sua avaliação, a fraqueza pode ser atribuída a uma desaceleração da economia chinesa e a um efeito inibidor gerado pela disputa comercial entre os EUA e a China.

A projeção revisada da Apple é, de fato, um sinal importante e revelador do que pode vir pela frente para marcas globais nas quais os consumidores chineses respondem por uma parcela significativa das vendas ou do crescimento total. Ainda assim, este não é o único sinal. O panorama mais amplo sugere que os efeitos desse momento econômico na China -- e a latente tensão comercial do país com os EUA -- serão irregulares.

A Nike, por exemplo, oferece um contraexemplo dos problemas descritos pela Apple nesta semana. O último balanço trimestral de resultados da empresa de roupas esportivas, divulgado no fim do mês passado, mostrou um aumento de 31 por cento das vendas em sua divisão da Grande China em relação ao ano anterior em uma base ajustada pela moeda, graças ao forte interesse em produtos como o tênis Jordan Max Aura. Em uma teleconferência com investidores, em 20 de dezembro, o diretor-financeiro Andrew Campion disse que "apesar das incertezas nos últimos tempos quanto às relações EUA-China, não vimos nenhum impacto em nossos negócios". De todos modos, os investidores provocaram uma queda de até 3,85 por cento nas ações da Nike na quinta-feira.

As gigantes da beleza também continuam sendo impulsionadas pelos consumidores chineses. Executivos da Estée Lauder reconheceram que existe um risco no esfriamento do crescimento na China e que calcularam isso na orientação da empresa para o ano cheio. Mas até o momento seus negócios na China continuam se expandindo e as vendas de sua divisão Ásia-Pacífico subiram 26 por cento em relação ao ano anterior no último trimestre segundo uma base ajustada pelo câmbio. A L'Oreal também se beneficiou com a demanda dos jovens consumidores chineses por beleza e fragrância de alto padrão.

Assim como a Nike, a Estée Lauder foi punida na quinta-feira, caindo mais de 3 por cento até meio-dia, embora possa não ser a empresa sob maior risco. São as grandes grifes que mais deveriam se alarmar após o anúncio pessimista da Apple. A Apple vem se posicionando cada vez mais como marca de luxo, fixando preços cada vez mais altos para seu principal produto, o iPhone. E com isso está presa nas contracorrentes que ameaçam acabar com a farra do luxo liderada pela China, que vem impulsionando as empresas de varejo de alto padrão nos últimos dois anos.

Os consumidores chineses, que respondem por cerca de um terço das vendas globais de artigos de luxo, estão gastando fortemente após a repressão à extravagância, há alguns anos. Era improvável que o ritmo continuasse o mesmo, portanto, alguma desaceleração era inevitável. O risco de que haja um pouso forçado, em vez de uma desaceleração gradual, parece estar aumentando.

A Cie Financière Richemont indicou que o crescimento acima da média na China -- uma recuperação dos tempos difíceis, em 2016 -- estava agora diminuindo e atingindo um nível mais normal. É verdade que alguns dos fatores que impediram o crescimento das vendas da Richemont na Ásia-Pacífico em setembro foram pontuais, como os tufões que desencorajaram o turismo. Em outras partes, apesar de a LVMH ter dito em outubro que as autoridades chinesas estavam intensificando os controles de fronteira, nem ela, nem a Kering, proprietária da Gucci, viram uma desaceleração na demanda dos consumidores lá. Mas o sentimento pode mudar rapidamente e isso já pode ter ocorrido agora. As atualizações das grandes empresas de luxo da Europa, dentro de um mês ou mais, serão observadas atentamente.

É tentador pensar na poderosa Apple como referência para o que acontecerá com todas as empresas de consumo que registram grandes vendas na China. Pode não ser o caso. O impacto pode não ser sentido da mesma forma pelas empresas que vendem itens mais baratos, como a Nike e o Starbucks, cuja ambiciosa estratégia de crescimento na China parece mais ameaçada agora pelas ferozes concorrentes locais do que pela relutância em pagar um café. Os investidores estão certos, no entanto, em se preocupar se os consumidores do país continuarão comprando tênis Balenciaga e pulseiras Cartier.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.

Repórteres da matéria original: Sarah Halzack em N York, shalzack@bloomberg.net;Andrea Felsted em Londres, afelsted@bloomberg.net