Verão na Argentina é marcado por recessão, enchentes e crimes
(Bloomberg) -- Passageiros aguardavam o metrô na plataforma lotada em outro dia de calor intenso em Buenos Aires. Micaela Gonçalves se irritou com o movimento, maior do que o normal.
"Tem mais gente porque a economia está muito ruim, a inflação está alta e as pessoas não conseguem sair de férias", disse a assistente administrativa de 24 anos, antes de tentar entrar no vagão sem ar condicionado.
A capital argentina geralmente sofre um êxodo no começo do verão. Mas com a recessão, a moeda local que perdeu quase metade do valor desde maio e salários que não acompanham a inflação, muitos portenhos desistiram de viajar. Os que ficaram enfrentam aumento da criminalidade, enchentes com as chuvas mais fortes do que o normal e uma piora generalizada na qualidade de vida.
As ruas não estão cheias de manifestantes, mas se percebe maior desencanto com as medidas favoráveis ao mercado do presidente Mauricio Macri, que tentará a reeleição em outubro, provavelmente contra sua antecessora Cristina Fernandez de Kirchner. Para investidores, Macri representa a antítese das medidas populistas que levaram o país à recessão. No entanto, as reformas que ele implementou não melhoraram o padrão de vida da maioria da população.
"A verdade é que o período de Macri no cargo tem sido horrível", lamenta Gonçalves. "Olhe para o transporte público -- os preços sobem toda hora e é sempre a mesma coisa."O número de passageiros e o número de reclamações no metrô de Buenos Aires bateram recordes no ano passado.
Para diminuir o déficit orçamentário que desencadeou uma crise cambial em maio, Macri acelerou cortes de gastos. As medidas de austeridade incluem a remoção de subsídios que seguravam reajustes nas tarifas de transporte público e eletricidade.
A passagem de metrô custará 21 pesos em abril, sendo que estava 7,50 há um ano. Os salários não aumentaram a ponto de compensar a inflação e a retirada de subsídios. O índice de preços ao consumidor acumulou alta de 49 por cento nos 12 meses até novembro, enquanto os salários subiram apenas 28 por cento. E com a taxa básica de juros do banco central em 55 por cento, empresas e famílias praticamente não têm acesso a crédito.
Não se vende nada
Empresários também sofrem com a recessão. Sebastian Rossin calcula que as vendas na loja de ferramentas dele no centro de Buenos Aires caíram 30 por cento no ano passado, mas ele está pagando mais por eletricidade, aluguel e a escola da filha. Ele tinha dois funcionários e foi forçado a demitir um. A família do comerciante de 42 anos está reduzindo despesas e deixou de frequentar restaurantes.
"Esta é a pior recessão -- não se vende nada e a inflação está elevada", reclama Rossin. "As despesas são muito maiores, a eletricidade ficou mais cara -- os salários não sobem como essas coisas, este é o problema."
Com a queda do poder de compra, a pobreza voltou a aumentar no país -- assim como os assaltos e roubos em Buenos Aires, segundo um relatório anual de criminalidade.
Cerca de 12 milhões dos 45 milhões de habitantes estão vivendo abaixo da linha de pobreza, ou seja, com menos de US$ 358 por mês. O clima não tem ajudado. Após uma seca histórica prejudicar boa parte das fazendas no ano passado, temporais em quatro províncias causaram a evacuação de 6.000 pessoas e o governo declarou estado de emergência.
Pouca gente escapa da crise. O número de turistas argentinos no Uruguai entre 24 de dezembro e 22 de janeiro diminuiu 36 por cento em relação a um ano antes, de acordo com dados do governo argentino.
Gonçalves, que além do emprego, estuda Arquitetura, não teve essa sorte. Ela recebe 22.000 pesos mensais (US$ 587). É 38 por cento a mais do que o salário que tinha quando começou, em 2015, mas o peso se depreciou 77 por cento desde então.
"Não vou tirar férias por enquanto", disse ela.
.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.