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Risco maior leva Powell a atuar como comandante de BC mundial

Richard Miller

12/07/2019 16h10

(Bloomberg) -- O comandante do Federal Reserve, Jerome Powell, começa a agir como o presidente de um banco central mundial.

Em depoimento ao Congresso americano nesta semana, ele repetidas vezes citou a desaceleração da economia global para justificar a flexibilização da política monetária nos EUA.

"Algo está acontecendo com o crescimento ao redor do mundo, especialmente com indústria, investimento e comércio", disse ele à Comissão de Serviços Financeiros da Câmara de Deputados na quarta-feira, quando praticamente prometeu cortar os juros no fim deste mês.

Não é puro altruísmo. Como o próprio Powell relata, a desaceleração global e a intensificação das tensões comerciais pesam sobre a perspectiva para a economia doméstica.

Como os bancos centrais de outras grandes economias estão ficando sem artilharia monetária, aumenta a responsabilidade do Fed de dar suporte à atividade mundial para impedir que atinja os EUA.

"As ferramentas disponíveis na comunidade global de bancos centrais são limitadas, colocando o Fed no centro das atenções para facilitar e sustentar o crescimento global e as condições financeiras", escreveram a economista Michelle Meyer e seus colegas do Bank of America em relatório publicado em 10 de julho.

Por um lado, Powell está apenas tentando desfazer o estrago que as medidas comerciais do presidente Donald Trump causaram na economia mundial. As tarifas de Trump -- as já implementadas e as que ainda estão colocadas como ameaça --levaram multinacionais a adiar planos de investimento, freando o crescimento global.

Não é a primeira vez que o Fed muda de postura em resposta a ocorrências fora dos EUA. Em 2016, a instituição recuou nos planos de subir juros quando um tombo repentino da moeda chinesa abalou o mercado financeiro internacional. Em 1998, o Fed cortou juros três vezes em pouquíssimo tempo por causa da moratória da Rússia.

Papel dominante

De fato, o Fed historicamente desempenha um papel dominante na política monetária mundial, como lembrou recentemente o vice-presidente da instituição, Richard Clarida. A diferença agora é a performance divergente das economias mais importantes do mundo.

"O que é um pouco incomum desta vez é que os EUA estão muito mais perto do que é desejável em termos de emprego e inflação do que outras economias grandes", disse Clarida em entrevista à Bloomberg Television em 21 de junho.

O resultado é que, com a taxa de juros perto de 2,5%, o Fed tem bem mais espaço para incentivar o crescimento dos que os bancos centrais do Japão e zona do euro, que praticam juros negativos.

Durante a entrevista, Clarida mencionou outro fator que mudou nos últimos anos: o mercado de capitais ficou "bem mais globalizado".

Isso significa que os EUA são mais afetados por acontecimentos no exterior do que a variação das exportações e importações sugere.

Essa exposição vem dos altos e baixos dos mercados financeiros internacionais à medida que investidores movimentam trilhões de dólares pelo planeta -- e das consequências que essas flutuações dos mercados podem ter sobre a economia doméstica.

"Cada vez mais, o Fed está pensando no que ocorre fora dos EUA e nas condições financeiras globais", disse Jim Caron, gestor de carteiras de renda fixa da Morgan Stanley Investment Management, que prevê um corte de 0,50 ponto percentual nos juros pelo Fed no final de julho.

Para Michael Feroli, economista-chefe para os EUA do JPMorgan Chase, o excesso de poupança externa pressiona os juros nos EUA para baixo. Pelos cálculos apresentados por ele em relatório divulgado em 9 de julho, as condições internacionais diminuíram o juro neutro (nível que não restringe nem estimula o crescimento econômico) em 1,5 ponto percentual.